Na minha coluna de ontem, “Da mentira
com torcida ao esplendor da verdade”, afirmei que certas formas desconsideradas
ou toleradas de corrupção destroem o caráter e preparam o indivíduo para
condutas mais graves. O sujeito começa mentindo e acaba na lista da Odebrecht,
com grana e apelido.
No aludido texto, arrolei
entre as manifestações toleradas de desonestidade e corrupção o ato de jogar as
próprias culpas sobre aqueles a quem se pretende derrotar nos debates e
confrontos políticos. Atingir indevida e deliberadamente a imagem de outrem
pode ser crime em certos casos; e, em todos os casos, é evidência de mau
caráter. O campo do discurso político não é um compartimento estanque onde não
penetrem as exigências comuns da vida moral. Bem ao contrário! Se atribuirmos à
política a integralidade de seu compromisso com o bem comum, mais incisivas se
tornam as exigências éticas sobre o discurso e a ação de seus protagonistas.
Vencer ou convencer a qualquer custo é regra velhaca para serviço dos patifes.
Situa-se a menos de um passo da porta do cofre.
Porto Alegre está no olho
do furacão político-eleitoral de 2018. O julgamento de Lula em segunda
instância no TRF4 contraria o monofônico projeto de poder petista. Tal tipo de
incômodo não costuma ficar sem resposta rápida, notadamente por parte da
esquerda de contracheque. Zero Hora de hoje traz uma entrevista com Alexandre
Padilha, “coordenador das mobilizações relacionadas ao julgamento de Lula pelo
TRF4”. A derradeira pergunta feita pela reportagem foi: “Há uma preocupação muito grande com a possibilidade de violência no dia
do julgamento. A declaração da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, não pode ter
acirrado mais os ânimos?”.
A
resposta do ex-ministro da Saúde e vice-presidente nacional do PT é exemplo
primoroso do tipo de conduta que acima descrevi: “Quem começou a implantar o clima de intolerância foi o prefeito de
Porto Alegre (Nelson Marchezan),
naquela iniciativa que ficou absolutamente desmoralizada. E depois a postura do
presidente do TRF4 (desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores), que não é adequada para quem é presidente
de um tribunal, que foi levantar possíveis ameaças, mas não mostrou apuração. A
Polícia Federal já deveria ter sido acionada para isso. A nossa orientação tem
sido muito básica, como sempre foi o nosso histórico, de manifestações pacíficas”.
Nem uma coisa, nem outra,
nem outra, nem outra. Salta aos olhos a inversão entre causa e efeito, entre
ação orquestrada e reação alguma. Desde que foi assinalada a data do julgamento,
a agenda política do lulismo convergiu para a concentração de suas forças em
Porto Alegre. Pode alguém esperar bons modos dos exércitos de Stédile, das
brigadas de resposta rápida de Boulos? Os dias de fogo e fúria prenunciados
para Porto Alegre mostram que o voluntarismo de Trump o torna muito parecido
com aqueles que, aqui na volta, mais dizem odiá-lo. Nesse cenário onde Gleisi
Hoffmann cobrou sangue, seu vice, Alexandre Padilha desconheceu as promessas de
ação violenta e acusou a prudente prevenção do prefeito e do presidente do
TRF4.
Convenhamos, é dureza a
gente ter que perder tempo desfazendo tais artimanhas. Mas neste país, quanto
mais óbvia a artimanha, mais espaço ela ganha.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
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