Levantamento indica que 622 mulheres presas no Brasil estão grávidas ou são lactantes. O Cadastro Nacional de Presas Grávidas e Lactantes, criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), constatou estas informações inéditas em presídios de todos os estados.
O cadastro vai permitir que o Judiciário
conheça e acompanhe, continuamente, a partir de agora, a situação das mulheres
submetidas ao sistema prisional brasileiro. Do total, 373 estão grávidas e 249
amamentam seu filho. No banco de dados não consta o número de mulheres em prisão
domiciliar.
As informações extraídas do
Cadastro, até o último dia de 2017, revelam que o maior número de mulheres
gestantes ou lactantes estão custodiadas no estado de São Paulo, onde, de 235
mulheres, 139 são gestantes e 96 lactantes. Em segundo lugar vem Minas Gerais,
com 22 gestantes e 34 lactantes. Rio de Janeiro está em 3º no ranking, com 28
gestantes e 10 lactantes.
O estado de Pernambuco vem em seguida, com 22
gestantes e 13 lactantes, seguido do Mato Grosso do Sul, com 15 gestantes e 16
lactantes. Veja no quadro abaixo a posição de todos os estados. O Amapá é a
única unidade da federação que, desde outubro de 2017, não tem mulheres presas
em nenhuma dessas situações.
“Não quero que nenhum brasileirinho nasça
dentro de uma penitenciária; isso não é condição precária, é de absoluta
indignidade”, tem afirmado repetidamente a presidente do CNJ e do Supremo
Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, idealizadora do cadastro. Na
avaliação da ministra, se o Judiciário não tiver condições de deferir a prisão
domiciliar, o Estado deve providenciar um local adequado para que a mãe possa
ficar custodiada até o término da gestação, assim como durante o período de
amamentação de seu filho.
No Centro de Referência à Gestante Privada de Liberdade, em Vespasiano (MG) há 57 mulheres, 23 gestantes e 34 lactantes.
Algumas unidades prisionais femininas possuem
espaços razoavelmente adaptados às gestantes, lactantes e seus filhos. É
o caso do Centro de Referência à Gestante Privada de Liberdade, em Vespasiano,
entorno de Belo Horizonte (MG). Lá, 57 mulheres, 23 gestantes e 34
lactantes, convivem com seus filhos até estes completarem um ano. A diretora
Miriam Moreira Alves diz que o sistema empregado no Centro propicia um
diferencial importante na vida das mulheres e seus filhos ao permitir a
reaproximação delas com a família.
“Quando chegam na unidade, iniciamos o
contato delas com sua família de origem. É muito comum as presas perderem esse
contato; a família abandonar essa moça. Mas tentamos resgatar isso, para que,
ao fim do período de conivência dela com a criança, ou seja, quando o bebê
completa um ano de vida, a família fique com esse bebê, garantindo a
permanência dele na família de origem”. Segundo a diretora, após um ano, 80%
dos filhos nascidos no Centro são encaminhados para a guarda na família de
origem, como avós ou tios. Os demais 20% vão para abrigos.
Solteira e parda
No ano passado, um censo carcerário revelou o
perfil das detentas que tiveram filho na prisão. Quase 70% delas tinham entre
20 e 29 anos; 70% são pardas ou negras e 56% solteiras, segundo levantamento da
Fundação Oswaldo Cruz e do Ministério da Saúde.
Em dezembro de 2017, havia 249 bebês ou
crianças morando com suas mães, nas penitenciárias de todo o País. Enquanto
estiver amamentando, a mulher tem direito a permanecer com o filho na
unidade prisional, de acordo com artigo 2º da Resolução 4 de 2009, do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária, se o juiz não lhe conceder
a prisão domiciliar.
Prisão domiciliar ou unidade adequada
A juíza auxiliar da presidência do CNJ
Andremara dos Santos considera o cadastro uma ferramenta importante para que o
Judiciário possa cobrar dos estados as providências necessárias para a custódia
dessas mulheres, garantindo a proteção das crianças que vão nascer ou que já
nasceram nas unidades prisionais. “As crianças não têm nada a ver com o crime
que suas mães cometeram. Temos de lembrar que a vida delas está em jogo, pois
nem todas as mulheres possuem condições processuais para estarem em prisão
domiciliar. As unidades devem garantir assistência médica mínima ao filho e à
mãe, acesso ao pré-natal, por exemplo”, diz Andremara.
A apenada gestante ou com filho de até 12
anos de idade incompletos tem direito a requerer a substituição da prisão
preventiva pela domiciliar. É o que estabelece a Lei n. 13.257, editada em 8 de
março de 2016, que alterou artigos do Código de Processo Penal. No
entanto, há situações específicas que inviabilizam a prisão domiciliar, entre
elas a própria violação da prisão domiciliar.
Para cumprir a lei, as penitenciárias
femininas devem contar com espaços adequados para as mulheres nessas situações,
normalmente, uma ala reservada para mulheres grávidas e para internas que
estejam amamentando. Além disso, a criança tem o direito a ser atendida por um
pediatra enquanto estiver na unidade. As visitas do CNJ aos presídios femininos
têm constatado que o acesso à assistência médica continua um problema ainda a
ser solucionado.
“Nosso problema aqui não são maus tratos ou
superlotação, mas a falta de cuidados médicos. Minha gestação se transformou em
arriscada porque tive muitas infecções que não foram curadas de maneira
correta. E não há pediatras para os bebês. Somente auxiliares de enfermagem”,
afirma uma interna, sem querer se identificar.
Guarda da Criança
Segundo a Cartilha da Mulher Presa, editada
pelo CNJ, em 2011, a mulher não perde a guarda dos filhos quando é presa, mas a
guarda fica suspensa até o julgamento definitivo do processo ou se ela for
condenada a pena superior a dois anos de prisão. Enquanto cumpre pena, a guarda
de filhos menores de idade fica com o marido, parentes ou amigos da família.
Depois de cumprida a pena, a mãe volta a ter a guarda do filho, se não houver
nenhuma decisão judicial em sentido contrário.
Direitos da Mulher presa
Apenas em 2017 foi sancionada a Lei 13.434,
que proíbe o uso de algemas em mulheres durante o trabalho de parto. Antes da
Lei, apesar de haver a resolução do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária (CNPCP), de 2012, e Súmula do Supremo Tribunal Federal, a
brutalidade era comum sob alegação de “risco de fuga”. Somente no Rio de
Janeiro, pesquisa de 2015 elaborada pela Fundação Oswaldo Cruz revelou que, de
um universo de 200 presas grávidas, 35% estavam algemadas durante o trabalho de
parto.
As presas têm direito também à assistência
material, devendo receber roupas, cobertas, material de higiene e limpeza e
produtos de higiene pessoal suficientes para que sua integridade física ou
moral não seja colocada em risco.
A presa tem direito ainda à assistência à
saúde, respeitadas as peculiaridades de sua condição feminina, inclusive
ginecologista e participação em programas de prevenção a doenças sexualmente
transmissíveis.
Regina Bandeira e Paula Andrade
Agência CNJ de Notícias
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