Os primeiros meses de 2024 foram agitados para quem
acompanha o mercado de ativos virtuais. Capitaneado pelas altas históricas do
Bitcoin, o tema tem levantado debate, chamado olhares e despertado muitos
questionamentos sobre qual o futuro para os ativos virtuais a partir dos
acontecimentos de 2024.
Para aqueles que ainda têm pouca intimidade com o
termo, ainda há tempo para entender e acompanhar as notícias. Utiliza-se “ativo
virtual” para se referir a ativos que podem ser negociados ou transferidos
eletronicamente, ou seja, um bem que existe no “mundo digital” e a qual se
atribui um valor monetário.
Nesse guarda-chuva de ativos encontram-se os ativos
tokenizados, que são aqueles que existem no mundo real e foram convertidos em
representações digitais (chamadas de “tokens”) por meio da tecnologia
blockchain. Há também os ativos chamados de “nativos”, que são criados na
tecnologia blockchain e não existem no mundo real. É bem provável que você
conheça o filho famoso dessa segunda categoria: o Bitcoin.
É nesse contexto de tecnologia descentralizada,
ativos virtuais e moedas digitais que orbitam os principais eventos do ano para
o mercado (já não tanto) alternativo:
- Halving
do Bitcoin
Previsto para as próximas semanas, o evento de
halving faz parte da dinâmica do Bitcoin e acontece aproximadamente a cada
quatro anos. Significa que a remuneração dos “mineradores” de Bitcoin será
cortada pela metade, ou seja, a cada bloco minerado serão emitidas menos
moedas, causando uma deflação na lógica monetária uma vez que menos moedas
entrarão em circulação.
Seguindo uma estrutura de oferta e demanda, uma
diminuição de oferta causa uma expectativa de maior demanda com valorização
desse ativo, que de certa forma já é vista com a alta pré-halving, onde um
público relevante tem buscado mais moeda com a visão de valorização futura. Mas
a lógica pode não ser tão simples, uma vez que muitos mineradores podem optar
por realizar seus lucros e vender moedas, aumentando novamente a oferta.
Também não se sabe ao certo o quanto a mobilização
desses mineradores pode sensibilizar a segurança da rede do Bitcoin. A única
certeza é que a exposição do Bitcoin às notícias traz à cena os recursos menos
conhecidos do grande público, como Ethereum e os ativos tokenizados,
movimentando a economia no mercado digital.
- Atualização
da rede Ethereum (Dencun)
Por falar em Ethereum, o irmão quase tão famoso do
Bitcoin também tem acontecimentos importantes previstos para 2024. Está
programada para o dia 13 de março a atualização da rede Ethereum, com foco em
aumento da escalabilidade, segurança e eficiência da rede. A atualização
promete melhorar a capacidade de processamento da rede, aumentando as
transações por segundo, diminuindo o congestionamento e melhorando os custos.
Como consequência, a rede se torna mais acessível para usuários e
desenvolvedores, ampliando as possibilidades de uso e o alcance.
A atualização também promete tornar a rede mais
resistente a ataques e fraudes, outro ponto crucial para expansão do alcance da
rede e aumento de seu uso. Com as melhorias previstas, é possível que o
Ethereum também experimente altas, uma vez que se tornará mais eficiente e
escalável.
- Regulamentação
da tokenização de ativos
Outro tema fervilhando no mercado de ativos
virtuais é uma maré de regulamentação voltada aos ativos tokenizados, não
apenas no Brasil, mas em países como os Estados Unidos. Em dezembro de 2023, a
CVM publicou o Parecer de Orientação 40, que trata da oferta pública de tokens
e traz mais clareza sobre as regras que as empresas devem seguir para realizar
ofertas públicas de tokens.
O assunto não parou por aí: segundo publicou o
portal Finsidersbrasil, a CVM pretende promover aprimoramentos nas regras para
enquadrar tokens de recebíveis e tokens de renda fixa nas operações de
crowdfunding (financiamento coletivo, em inglês), dando mais um passo para
construir uma regulamentação mais robusta e sofisticada que atenda a demanda
por ativos tokenizados.
A SEC, nos Estados Unidos, por sua vez, aprovou em
fevereiro de 2024 o primeiro ETF do Bitcoin, considerado um marco importante
para a regulamentação do tema no país. Um ETF de Bitcoin é um fundo negociado
em bolsa de valores tradicional, como a B3 no Brasil. Percebe-se claramente um
padrão dos reguladores mundiais em abraçar essa modalidade de ativos e
utilizá-los como ferramentas oficiais de democratização dos investimentos para
o mercado em geral.
- DREX
e outras CBDCs
Ainda na linha regulatória, o Banco Central do
Brasil anunciou oficialmente o projeto do DREX, a CBDC (sigla para Central
Banking Digital Currency, ou moeda digital do banco central em tradução livre)
brasileira. Uma CBDC, ao contrário do Bitcoin, é uma moeda que tem lastro no
mundo real; nesse caso, portanto, o DREX é lastreado no Real, mas existe no
mundo digital.
O DREX é a plataforma digital oficial para
negociação do Real Digital, a CBDC emitida pelo Banco Central do Brasil. A
plataforma, que está prevista para lançamento até o final de 2024, mas pode
contar com atrasos por conta dos desafios em sua construção, permitirá a
negociação e custódia do Real Digital, além de uma importante integração com
outros sistemas, como bancos e exchanges, facilitando as transações com a
moeda.
A promessa é que seja construído um ambiente
seguro, eficiente, acessível e transparente, possibilitado pela tecnologia
blockchain. A transparência, por sinal, pode ser um dos motivos de atraso, uma
vez que as últimas soluções de privacidade testadas para a plataforma se
mostraram ineficientes para o propósito das operações e para a boa gestão da
ferramenta pelo Banco Central.
Ao ter como mecanismo de funcionamento principal a
criação e execução de contratos inteligentes, a tecnologia promete eficiência e
segurança em operações de compra em venda, com transferência simultânea de
titularidade dos ativos e pagamentos, além de uma agilidade maior na execução
de garantias. A plataforma também permitira a comercialização de produtos de
crédito, como empréstimos, aplicações descentralizadas, transferências e
operações de câmbio, com potencial de revolução das operações financeiras maior
do que o PIX.
Essa janela de oportunidade existente durante a
construção da plataforma é essencial para desenvolvimento de novos negócios
voltados a explorar essa tecnologia. Com um uso acessível da blockchain, não
são apenas as instituições financeiras que ganham novos produtos e novos
públicos para desbravar. Setores como UX e desenvolvimento de software podem
obter vantagens relevantes ao criar soluções que tornem a navegabilidade pelos
produtos disponíveis no DREX muito mais acessíveis e democráticos ao grande
público.
Caso o mercado saiba aproveitar o empurrão
regulatório, a onda de destaque dos ativos virtuais, a procura por
investimentos mais acessíveis e encaixe em uma usabilidade amigável e prática
para os usuários, 2024 pode ser o ano decisivo para conquistas novos espaços em
um jogo virtual que tem suas regras elaboradas em tempo real.
Gabrielle Ribon - advogada e entusiasta de inovação.
Atua no mercado financeiro com foco em novos produtos e tecnologias. É
especialista em Creative Technologies pela Miami Ad School e titulada LL.M em Direito
Tributário pelo Insper.