É importante que os usuários compreendam algumas premissas de
ordem técnica relativas aos conceitos de moedas digitas e moedas virtuais.
Não é raro
nos depararmos com situações em que estes termos são equivocadamente
equiparados ou utilizados de maneira fungível. Em tais situações, apesar de os
termos moeda digital, moeda virtual e criptomoedas serem utilizados de forma
intercambiável, demonstraremos que, em verdade, tais locuções não se confundem,
razão pela qual devem ser corretamente individualizadas.
A
compreensão destes termos fica mais didática quando tomamos por premissa o fato
de que a relação existente entre tais expressões é de
gênero-espécie-subespécie, tal como pontuado em relatório elaborado pelo FMI.
Com base
na taxanomia das moedas virtuais delineada pelo Fundo Monetário Internacional,
podemos afirmar que os termos moeda digital, moeda virtual e criptomoeda não
são intercambiáveis e se relacionam da seguinte maneira:
Tabela
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Gênero
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Moedas
Digitais
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Espécie
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Moedas Virtuais – não possuem lastro em
moeda fiduciária. Possuem unidade de medida própria. Não possuem curso legal
nem curso forçado. São centralizadas.
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Moedas Eletrônicas – possuem lastro em moeda
fiduciária de curso forçado. São uma “mera” representação eletrônica das
moedas fiduciárias.
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Subespécie
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Criptomoedas – não possuem lastro em
moeda fiduciária de curso forçado. Possuem unidade de medida própria. Não
possuem curso legal nem curso forçado. São descentralizadas em sua maioria e
baseadas em tecnologias de criptografia.
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A locução moeda
digital possuiria um sentido amplo e com poucas restrições técnicas, de modo a
englobar todas suas espécies e subespécies. Daí porque podemos afirmar que
moeda digital é um tipo de ativo que proporciona, de diversas formas, a
circulação de valor por meio eletrônico (de forma intangível) ou via internet.
Este valor
pode ou não estar embasado em uma moeda fiduciária de curso forçado e, além
disso, pode ou não ser transmitido por meio de um sistema descentralizado e
criptografado, fazendo com que surjam as subclassificações moedas virtuais,
moedas eletrônicas e criptomoedas.
As moedas
virtuais são bens jurídicos móveis incorpóreos, nos termos do artigo 83, inciso
III do Código Civil, que, ao lado das moedas eletrônicas, configuram espécie de
moeda digital, podendo ser definidas como representações de valor em formato
digital que: (i) são armazenadas e transacionadas eletronicamente; (ii) possuem
denominação, forma, unidade de medida e valores próprios; (iii) não possuem
lastro em moeda fiduciária nem em commodities de valor; (iv) não possuem
curso legal ou curso forçado; (v) não são emitidas por bancos centrais,
instituições de créditos ou instituições que lidam com moedas eletrônicas, mas
sim por entes privados; (vi) podem ser utilizadas como meio de troca, de
pagamento ou, ainda, como investimento especulativo; e (vii) dentro de
ambientes e comunidades específicas, podem funcionar como meio de troca,
reserva de valor e unidade de medida.
As moedas
virtuais já existiam “muito antes do aparecimento do atual sistema
descentralizado de negociação de moedas”,
sendo exemplos de moedas virtuais centralizadas: o e-gold, os créditos
do Facebook e os pontos de programas de fidelidade para acumulação de
milhas aéreas (frequent flyer programs).
As moedas
virtuais não se confundem com as moedas eletrônicas. No caso brasileiro, o
inciso VI do artigo 6º da Lei nº 12.865/2013, define moeda eletrônica como
sendo os “recursos armazenados em dispositivo ou sistema eletrônico que
permitem ao usuário final efetuar transação de pagamento”.
No caso
das moedas eletrônicas, portanto: (i) existe um emissor identificável da moeda
eletrônica; e (ii) há um vínculo da moeda eletrônica com o sistema monetário
tradicional (com as moedas fiduciárias), de modo que as moedas eletrônicas
possuem a mesma unidade de medida que as moedas fiduciárias, características
estas que não estão presentes nas moedas virtuais.
Tanto isso
é verdade que o Banco Central do Brasil já teve a oportunidade de afirmar, no
Comunicado nº 25.306/2014, que as “moedas virtuais não se confundem com a
‘moeda eletrônica’ de que tratam a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, e
sua regulamentação infralegal”.
Em
síntese, a diferença entre moedas virtuais e moedas eletrônicas reside no fato
de que estas são denominadas em unidades de medida equivalentes às da moeda
fiduciária, enquanto que as moedas virtuais possuem “forma própria de
denominação, ou seja, são denominadas em unidade de conta distinta das moedas
emitidas por governos soberanos”, consoante previsto no Comunicado nº
25.306/2014.
Restou
demonstrado, até o presente momento, que as moedas virtuais não são
equiparáveis às moedas eletrônicas.
Feito
isso, devemos compreender em que medida o termo moeda virtual se relaciona com
a locução criptomoeda. Nesse tocante, devemos fazer uma ressalva importante:
existem diversas categorias de moedas virtuais.
As moedas
virtuais podem possuir, a depender do seu fluxo de dados, ser fechadas, abertas
ou híbridas. Caso exista uma autoridade central responsável pela moeda virtual,
estaremos diante de uma moeda virtual centralizada. Caso contrário, inexistindo
tal entidade, ter-se-á uma moeda virtual descentralizada.
Na tabela
abaixo, são utilizados quatro critérios classificatórios para segregar as
moedas virtuais. Esta classificação permite a depuração dos termos utilizados
no presente trabalho e justifica o motivo pelo qual entendemos que tais
conceitos (moedas virtuais e criptomoedas) não podem ser utilizados de forma
intercambiável.
As moedas virtuais
poderão ou não ser conversíveis em moedas fiduciárias. Além disso, a segurança
do seu protocolo de funcionamento pode ou não estar embasada em criptografia.
As
diferenças no desenho da estrutura e nas funcionalidades das moedas virtuais
evidencia que existe uma infinidade de combinações possíveis. No caso das
criptomoedas (subespécie de moeda virtual), podemos fizer que tais ativos são
considerados moedas virtuais de abertas, descentralizadas,
criptografadas e com
fluxo de conversibilidade bidirecional.
Logo,
“toda criptomoeda é uma moeda virtual (e, portanto, uma moeda digital), mas nem
toda moeda virtual é uma criptomoeda”. As
criptomoedas são um meio de troca que não possui lastro em moedas fiduciárias,
daí porque podemos afirmar que toda criptomoeda é uma moeda digital e moeda
virtual, mas nem toda moeda digital e moeda virtual será enquadrada como uma
criptomoeda.
Diante de
todo quanto exposto, pontuadas as distinções existentes entre moedas digitais,
moedas virtuais e criptomoedas, bem como tendo sido estabelecida a premissa de
que tais ativos possuem verdadeira relação de “gênero-espécie-subespécie”,
respectivamente, podemos afirmar, de forma categórica, que as criptomoedas –
cujo maior exemplo são os bitcoins – são uma subespécie de moeda virtual
aberta (ou universal), descentralizada, criptografada e de conversibilidade
bidirecional.
Daniel de Paiva Gomes – Sócio de Vieira, Drigo e Vasconcellos
Advogados. Professor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).
Mestre em Direito Tributário (FGV Direito/SP). Especialista em Direito
Tributário Internacional (IBDT) e em Direito Tributário Brasileiro
(PUC-COGEAE).