“Fazer
uma faculdade, se formar e achar que a carreira vai ser aquela pela vida toda é
algo para se esquecer, pois isso não existe mais”Pixabay
Não tem escapatória, o fim de ano chega e as pessoas
fazem um balanço do que aconteceu e, principalmente, pensam no que gostariam
para o ano que está chegando. Todos sabemos que 2020 foi um ano diferente,
atípico e desafiador. E o que esperar de 2021, e dos próximos anos, quando
pensarmos em emprego, mercado de trabalho, mudanças, pandemia e home office?
São tantas dúvidas.
O coach Edson Moraes, formado pelo
Instituto EcoSocial e certificado pelo ICF – International Coach Federation,
ajuda a compreender melhor o que as empresas esperam dos colaboradores e como
se preparar para atendê-las. Para começar,
ele cita dois termos que estão em alta quando
se fala em carreira: upskiliing e reskilling. “São processos nos quais as
pessoas investem para estar em evolução constante. Costumo dizer que hardskill
vem de fora para dentro, e softskill de dentro para fora, e você os
desenvolve”.
Explicando: hardskill é
conhecimento, aquilo que vamos buscar, como cursos, pesquisas, leituras.
Softskill são habilidades sutis, aquilo que você já tem e desenvolve.
Comunicação, por exemplo, você pode buscar as técnicas (hardskill) para
aprimorar sua habilidade em se comunicar, que é algo que você traz de dentro
(softskill).
“Upskilling é um aprimoramento das
competências que desempenhamos. Reskilling, por outro lado, é a oportunidade de
transformar os skills, se adaptar às transformações pelas quais o mundo está
passando, principalmente nos aspectos digitais. Em ambos os casos são
oportunidades de desenvolvimento para novas habilidades”, completa.
Um softskill muito festejado é a resiliência,
porém Moraes cita um ainda mais importante: “Eu gosto muito de um
aspecto de softskill que é a plasticidade, pois, às vezes, apenas a resiliência
não é suficiente. Você vai, toma uma pancada e volta. E de novo. Quantas vezes
vai aguentar? Então, você tem de ser plástico, se adaptar e fazer uma
transformação, pois aquilo que você tinha tanta certeza pode não dar certo. E
aí pode pensar: por que não posso tentar de outro jeito? Isso é ser plástico,
não ser resiliente, você se adaptar e se moldar a uma nova condição”.
Se os jovens soubessem, se os maduros pudessem
Pesquisas mostram que os jovens são os que mais estão
sofrendo com o desemprego, pois não conseguem o primeiro emprego. Já os
maduros, na casa dos 50, perdem o cargo e não conseguem se recolocar. Como
resolver isso? Para o coach, só vão ter sucesso se os dois extremos trabalharem
juntos e unirem a experiência de um com o desafio do outro, pois os dois públicos
têm dificuldades parecidas: “Os mais jovens em entrar no mercado, porque isso
está baseado em modelos antigos, e eles já entram perdendo, pois a maioria se
formou e não tem um diferencial. Não importa a idade, as pessoas têm de
desafiar o outro e a si mesmas”. Pexels
Segundo Moraes, em uma entrevista de emprego, é preciso
se apresentar de forma interessante e atraente para quem for entrevistá-lo, o
que vale para todos. Para os mais velhos, também valem o aprendizado contínuo,
a disposição para conhecer coisas novas, ter propósitos na vida e se conectar a
eles.
Algo que o coach frisa, constantemente, é que devemos esquecer as relações
empregatícias como eram, pois o tempo em que alguém se formava na faculdade,
entrava em uma empresa, com carteira assinada, e ficava lá por anos e anos,
acabou. “Esqueça. Não vai funcionar, não falamos mais de emprego, mas de
modalidade de trabalho, pois o vínculo ocorrerá de diversas formas, quando você
se projeta e se atualiza, se sente desafiado e pode desafiar até o local onde está,
isso fará toda a diferença, E isso vale para novos e maduros”.
Um pecado mortal para um profissional mais velho é se
“sentar sobre uma carreira” e achar que viveu, sabe e aprendeu tudo. Ele
precisa olhar e entender que sabe, sim, alguma coisa, e pode ensinar, mas
também tem de aprender com o novo, se colocar de forma proativa, positiva. Não
olhar para o copo meio vazio, para o problema sem focar na solução, e aprender
a lidar com o humor dele e com o dos outros. Se não agir assim, terá
dificuldades cada vez maiores ao tentar se recolocar no mercado.
Moraes lembra o exemplo das startups, que estão
aprendendo que não adianta criar uma empresa só de jovens: “É preciso cabelo
branco, ou sem cabelo, para fazer as pessoas interagirem e aprenderem umas com
as outras. O jovem pode saber e se colocar na condição de aprendiz, enquanto o
mais velho pode se colocar na posição de estar aberto a aprender coisas novas,
como falei antes. Usar a experiencia que viveu, como lidou com as pessoas e
grupos, pode fazer a diferença”.
Para o coach, a grande diferença para todos que procuram
uma colocação é a capacidade de interrelação e de comunicação, o networking.
“Não importa a idade, pois se colocar no mundo profissional depende da
qualidade do networking construído. E isso pode se construir ou reconstruir em
qualquer momento de vida. Requer disciplina e atenção, perceber a necessidade
do outro e até que ponto se pode atendê-la. Se a pessoa se coloca na posição do
‘eu sei tudo e é assim que trabalho’ (não estou falando de valores e questões
éticas), ela precisa se adequar à realidade urgentemente”.
Lifelong learning e o desafio dos 50+ de se
manterem atualizados
Para Moraes, o mais complicado ao se falar de lifelong
learning (formação contínua em tradução livre), outro termo em alta, é como
manter as pessoas animadas para que estudem por toda a vida. Ele lembra que a
geração 50+ é aquela que pensava que faria uma faculdade, depois trabalharia
dos 25 aos 60 anos, e entraria na aposentadoria e desfrutaria o melhor da vida. Pexels
“Novamente, esqueça. Isso não existe mais. É
inconcebível. As mudanças de carreira vão ocorrer durante toda a existência. E
insistir em só uma carreira pode ser prejudicial. Então, em determinados
momentos da vida, buscar outras coisas, fazer transformações e mudar
radicalmente é perfeitamente possível, aceitável e até louvável”, aponta.
Para ele, as universidades têm de se repensar, pois a
essência continua válida, mas os conceitos, a metodologia, os processos e o
ferramental mudam. As pessoas precisam se capacitar continuamente, não precisam
fazer uma graduação, que é longa, mas cursos mais curtos, indo às
universidades, experimentando outras coisas, mantendo-se atualizadas com as
notícias, ouvindo podcasts, assistindo aos fóruns, seguindo pessoas que tenham
conteúdo significativo.
“Lifelong learning é algo extremamente positivo para
manter a pessoa não só atualizada, mas motivada, pois o aprendizado gera
motivação. Estar disposto a conhecer coisas novas faz a vida ter outra cor.
Insistir em não aprender é algo pequeno, pobre de espirito. É preciso despertar
para o novo, se relacionar com ele, crescer e aprender, em qualquer idade,
principalmente neste mundo que está em contínua transformação. Se a pessoa não
tiver interesse pelo aprendizado, isso gerará dificuldades profissionais”.
Novo normal - trabalho é o que se faz e não o local para onde se vai
Para o coach já vivíamos um “novo normal” antes da
chegada da pandemia, mas as pessoas insistiam em um mundo que não existia mais.
“O trabalho remoto, por exemplo, será extremamente importante, mesmo quando as
pessoas resgatarem dinâmicas e rotinas anteriores. A pandemia nos ensinou que
podemos ter uma outra forma de trabalhar. Já falo há muito tempo que trabalho é
o que se faz e não o local para onde se vai. Tenho conversado com clientes que
estão trabalhando no conceito 4X1, quatro dias em casa e um no escritório.
Alguns até diminuíram o espaço das empresas. Supondo que acabou a pandemia, a
pessoa não vai voltar integralmente. Um grupo vai trabalhar quatro ou três dias
em casa e os demais no local. Há carreiras nas quais não há como trabalhar
remotamente, como algumas da área de saúde, por exemplo, mas, em geral, as
pessoas vão trabalhar mais em casa que nos escritórios, isso já é uma
transformação”. Pexels
O Brasil tem 14 milhões de desempregados, um número
altíssimo, e isso tem outras razões além da crise econômica e da pandemia.
Segundo Moraes, muitas dessas pessoas, infelizmente, não têm diferenciais a
oferecer: “Em compensação, e falo por experiência própria, tenho projetos de
consultoria que não consigo atender porque não encontro pessoas capacitadas. A
forma como estão capacitando os profissionais está errada, já que as empresas
precisam de pessoas, mas as que chegam não preenchem os requisitos. Muitos têm
formação acadêmica, o que não significa mais nada hoje. O que vale é como esta
pessoa se mantém atualizada para desenvolver o trabalho. E quando falo
trabalho, não é emprego. É preciso parar de pensar que se vai sair da escola e
conseguir um emprego de carteira assinada. Isso vai diminuir cada vez mais”.
Para Moraes, as pessoas terão de se colocar, de forma
atraente, pelo conhecimento e experiência, pelo que podem agregar ao grupo.
Elas trabalharão, provavelmente, por projeto ou demanda, serão freelancers,
produzirão e entregarão o que for pedido. “O tempo inteiro temos de entender
para onde o que chamamos de mercado está indo, quais são os valores e
princípios e o que estudar para atender as demandas solicitadas. E de que
forma? Funcionário, freelancer, terceirizado ou prestador de serviços. O
desemprego é enorme porque muitas pessoas têm a expectativa de um determinado
cargo formal que, como falei antes, talvez não exista mais. É preciso se
autoconhecer e estudar continuamente para ter algo a oferecer. Repito: fazer
uma faculdade, se formar e achar que a carreira vai ser aquela pela vida toda é
algo para se esquecer, pois isso não existe mais”, finaliza.
Fonte: Edson Moraes é sócio do Espaço Meio - https://espacomeio.com.br , Executive Coach desde 2014 e Consultor (Gestão & Governança) desde 2003. Foi Executivo do Bank of America entre 1982 e 2003. Seguiu carreira na Área de Tecnologia da Informação, foi Head do Escritório de Projetos e CIO por 4 anos. É Master em Project Management pela George Washington University. Participou de programas de educação executiva na área de TI ( Stanford University, Business School São Paulo e Fundação Getúlio Vargas). Formado em Comunicação Social – Jornalismo pela PUC/SP. É Conselheiro de Administração formado pelo IBGC, Coach pelo Instituto EcoSocial e certificado pelo ICF. Articulista e palestrante nas áreas de Governança, Tecnologia da Informação e Gestão de Projetos.