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| IMAGEM: Acervo ACSP |
*com equipe do Conselho de Política Urbana (CPU) da ACSP
“Se vai virar parque, pista, praça ou
peça de museu, a gente ainda não sabe. Mas que ele precisa sair da crise
existencial, isso não há dúvida”
Se você já circulou por São
Paulo – seja como paulista, paulistano, turista ou mero sobrevivente do
trânsito – é praticamente certo que já topou com ele: o lendário, polêmico e
indeciso Minhocão. Atualmente chamado de Elevado Presidente João Goulart (para
os íntimos, só Minhocão mesmo), esse viaduto conecta o Centro da cidade à zona
Oeste e, de quebra, conecta também décadas de debates urbanos mal resolvidos.
Inaugurado com pompa e concreto
durante o governo Maluf, em pleno aniversário da cidade, lá em 1971, o Minhocão
desde sempre gerou amor e ódio – um clássico paulistano. De um lado, os
defensores da velha guarda rodoviarista, que acreditam que as pistas resolvem o
trânsito (spoiler: não resolvem). Do outro, os que veem nele uma
cicatriz urbana, uma espécie de muralha de concreto que sombreia calçadas,
silencia fachadas e deteriora a paisagem urbana do entorno.
Ainda nos anos 70, tamanho o
impasse, resolveram restringir o uso do viaduto. O Minhocão foi sendo adaptado
aos trancos e barrancos até virar... parque? Sim, desde 2018, temos um parque
suspenso com horário de funcionamento digno de praça de condomínio: das 20h às
22h durante a semana e das 7h às 22h aos fins de semana e feriados. Uma espécie
de “Cinderela urbanística”: a mágica acaba depois do expediente.
No embalo das boas intenções, o
Plano Diretor de 2014 determinou que o Minhocão deveria ser desativado
gradativamente até 2029. E como toda boa previsão em São Paulo, virou letra
morta. O Plano de Intervenção Urbana criado em 2018 para dar conta do recado?
Engavetado. A decisão da Câmara em 2020 de resolver tudo por plebiscito? Até
hoje esperamos. Parece que o Minhocão, além de concreto, é feito também de
promessas vãs.
Mas calma, que agora temos até
jardins de chuva e bolsões de estacionamento sob o elevado. Quase um spa
urbano. Enquanto isso, propostas não faltam: muitos são os projetos acadêmicos,
profissionais e da própria Prefeitura que ofertam novas possibilidades de uso
para o espaço, com e sem ele... o problema nunca foi a falta de projeto, e sim
de decisão.
Reunião do Conselho de Política
Urbana da Associação Comercial de São Paulo, realizada em junho deste ano, reuniu
ex-secretários, estudiosos da mobilidade, especialistas e interessados em
debater o tema. A oportunidade, bem como as décadas de discussão sobre a
questão e os estudos realizados pela Municipalidade entre 2018 e 2019, deixaram
claro que há urgência de abrir esse debate com a sociedade civil, com base em
dados reais, estudos técnicos e viabilidades, e veja só, transparência(!).
Parece básico, mas por aqui é quase revolução.
Afinal, já passou da hora de
parar de tratar o Minhocão como um adolescente rebelde da urbanização e dar a
ele uma identidade definida. Desmontar? Não é tecnicamente viável (embora
tentador). Transformar de vez em parque? Talvez, desde que com planejamento de
verdade, participação social, e não mais um puxadinho verde.
São Paulo, em pleno 2025,
precisa – e merece – soluções urbanas à altura do que se espera de uma
metrópole contemporânea. Com mais de cem projetos na mesa, já dá para começar
uma conversa séria. E tomara que dessa vez, ao invés de importarmos um High
Line genérico ou resgatarmos o rodoviarismo como se fosse inovação, a
cidade reconquiste um espaço público digno, democrático e ambientalmente
consciente.
Se o Minhocão vai virar parque,
pista, praça ou peça de museu, a gente ainda não sabe. Mas que ele precisa sair
da crise existencial, isso não há dúvida.
Antonio Carlos Pela - Vice-presidente da ACSP e coordenador do CPU
Fonte: https://www.dcomercio.com.br/publicacao/s/minhocao-uma-novela-que-nunca-termina
**As opiniões expressas em artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores e não coincidem, necessariamente, com as do Diário do Comércio

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