Psicóloga esclarece os efeitos nos
indivíduos e explica como a família pode colaborar no tratamento do vício em
apostas
Nos últimos anos, as apostas online cresceram consideravelmente no Brasil e isso tem preocupado especialistas sobre os impactos sociais e psicológicos dessa prática. Um relatório da XP Investimentos aponta que o setor já movimenta o equivalente a 1% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e compromete cerca de 20% do orçamento disponível das famílias mais pobres. Além disso, estimativas do Banco Central (BC) demonstram que, apenas em agosto de 2024, cinco milhões de beneficiários do Bolsa Família enviaram R$ 3 bilhões às plataformas de apostas por meio do Pix, valor que pode ser ainda maior, já que não foram contabilizados pagamentos realizados com cartões de débito e crédito.
Para a professora de Psicologia do Centro Universitário Facens, Beatriz Silvério da Rocha Paiva, o vício em apostas é prejudicial não apenas do ponto de vista econômico, mas também comportamental. Segundo ela, o excesso dessa prática pode trazer prejuízos na rotina de trabalho, na funcionalidade do indivíduo e nas relações sociais. A especialista comenta, inclusive, que o ciclo de perdas e ganhos pode impactar a confiança e o estado emocional dos jogadores.
“Dentro da Psicologia Comportamental, existe um conceito chamado
‘reforço intermitente’, que ocorre quando somos recompensados por algo que às
vezes dá certo e outras vezes não, desenvolvendo um repertório de
‘persistência’ que é necessário no trabalho e nas relações amorosas, por
exemplo”, diz Beatriz, que acrescenta que “esse esquema mantém a pessoa
persistente mesmo após perdas, na expectativa de um futuro ganho”.
Relações familiares, tratamentos e prevenção
De acordo com a psicóloga, o vício em apostas online também afeta as relações familiares, o que estremece os laços de confiança. Isso porque na maioria dos casos, a família só percebe o problema quando os prejuízos financeiros e emocionais já estão consolidados, o que pode agravar ou reativar conflitos preexistentes. Para lidar com a situação, ela recomenda que “os familiares ofereçam apoio não só financeiro, mas principalmente emocional, assegurando que o indivíduo tenha acesso à ajuda profissional”.
Para a professora, os tratamentos para pessoas com vícios relacionados a transtornos de jogo são semelhantes aos de dependentes de substâncias químicas ou até mesmo de indivíduos que passaram por relacionamentos amorosos abusivos, com a adoção de acompanhamento psicológico e psiquiátrico aos pacientes. “Dependendo da gravidade da situação, pode ser necessária uma internação emergencial, quando, por exemplo, existe risco à integridade física do próprio indivíduo (como em casos de tentativa de suicídio)”, complementa.
As apostas podem ocorrer inicialmente em grupos de amigos e,
portanto, o indivíduo pode iniciar esse tipo de comportamento para aceitação
social. E, de modo geral, são valorizadas nas mídias, com propagandas que
ocorrem de forma indiscriminada, o que influencia a percepção das pessoas sobre
os riscos envolvidos. Por isso, deve-se adotar abordagens educacionais que
enfatizem a importância de se cuidar da saúde mental ao longo da vida, com foco
na prevenção em vez de apenas no tratamento de situações de sofrimento psíquico
intenso.
“Nesse processo, o indivíduo precisa desenvolver tolerância ao
mal-estar - visto que os desafios são imprevisíveis e inerentes à existência
humana - e habilidades de enfrentamento. Além disso, a supervisão e
monitoramento dos familiares em relação ao uso de dispositivos durante a
infância e adolescência também é essencial”, conclui Beatriz.
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