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segunda-feira, 5 de agosto de 2024

Combate ao trabalho escravo - preocupação de empresas deve ir além do trivial


Denúncias recentes têm revelado a existência de trabalho análogo à escravidão em diversas partes do Brasil, com investigações rigorosas em andamento. Mesmo empresas que possuem políticas claras contra o trabalho escravo podem estar involuntariamente associadas a essas práticas, especialmente através de seus fornecedores. É crucial que as empresas se mantenham vigilantes sobre as condições de trabalho ao longo de toda a sua cadeia de suprimentos.

Exemplo foi a divulgação recente de uma força-tarefa recente coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego foi responsável pelo resgate de 23 trabalhadores, incluindo um adolescente de 16 anos, em fazendas de café no Sul de Minas Gerais.

Os auditores identificaram condições degradantes de trabalho em três fazendas, levando os proprietários a pagarem multas rescisórias de aproximadamente R$ 100 mil. Todas as fiscalizações tinham como alvo trabalhadores migrantes da Bahia e do Norte de Minas.

Os números são alarmantes: em 2023, o Brasil registrou um aumento de 61% no número de denúncias de trabalho escravo ou análogo à escravidão em comparação ao ano de 2022, segundo o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Foram 3.422 denúncias protocoladas nos 12 meses do ano pelo Disque 100, o maior número desde sua criação em 2011.


Como as empresas podem ajudar no combate

O aumento nos casos de trabalho análogo à escravidão no Brasil também acende um alerta para as empresas, que precisam estar atentas às condições de trabalho a que são expostos seus colaboradores e terceirizados, uma vez que podem ser corresponsáveis por essas práticas. A ignorância sobre esses abusos não exime as empresas de responsabilidade legal e do desgaste reputacional que pode impactar significativamente os negócios.

O trabalho análogo à escravidão é caracterizado por:

  • Submissão do colaborador a trabalhos forçados ou jornadas exaustivas;
  • Sujeição do trabalhador a condições degradantes de trabalho;
  • Restrição da locomoção do trabalhador;
  • Vigilância ostensiva para reter o trabalhador no local de trabalho;
  • Posse de documentos ou objetos pessoais do trabalhador para retê-lo no local de trabalho.

“É importante observar que o trabalho análogo à escravidão está, muitas vezes, ligado ao não cumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho. Assim, as empresas expõem os trabalhadores a condições precárias e perigosas, violando os direitos humanos e desrespeitando a vida e a integridade física e mental dos trabalhadores”, argumenta a CEO da Moema Medicina do Trabalho, Tatiana Gonçalves.
 

Cuidados com terceirizados

O advogado Mourival Boaventura Ribeiro, sócio da Boaventura Ribeiro Advogados, ressalta que casos recentes envolvem frequentemente trabalhadores contratados por empresas terceirizadas. “Se você se atentar bem, recentes escândalos de utilização de mão de obra análoga à escravidão na maioria das vezes envolvem a prestação de serviços terceirizados. Antes e durante a vigência destes contratos, as empresas contratantes devem analisar e fiscalizar o cumprimento dos mesmos”, alerta Mourival Ribeiro.

A empresa tomadora dos serviços será subsidiária ou solidariamente responsabilizada pelas violações aos direitos dos trabalhadores. O Ministério Público e a Justiça do Trabalho têm atuado no sentido de imputar responsabilidade à empresa que se beneficia desse tipo de mão de obra.


Cuidados em casa

A preocupação também se estende aos contratos de trabalho domésticos, com muitos casos de famílias que mantêm funcionários em condições deploráveis e com restrições à liberdade do trabalhador. No ambiente doméstico, essa situação pode se agravar, com empregados domésticos frequentemente isolados do convívio social e familiar, trabalhando em condições de exploração extrema.

Em 2022, o TST julgou um caso no qual uma professora e suas filhas mantiveram uma empregada doméstica em condições degradantes de trabalho por 29 anos, condenando-as ao pagamento de indenização por danos morais no valor de 1 milhão de reais.

 

Normas regulamentadoras

Para minimizar os possíveis riscos existentes, as empresas devem se atentar e conhecer as regras regulamentares existentes para o ambiente de trabalho, conforme explica Tatiana Gonçalves. 

“As normas estão aí e qualquer pessoa pode ter acesso a elas. O importante é se atentar e avaliar se o ambiente de trabalho está condizente às regras. Um exemplo é a norma regulamentadora do trabalho, número 6, que trata dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI). O regulamento deixa claro que a empresa não pode cobrar por essas proteções, além de ser obrigada a fornecer, educar sobre o uso e acompanhar o uso correto”, explica a CEO da Moema Medicina do Trabalho. 

Contudo, Gonçalves detalha outra norma, a NR24, que estabelece as condições mínimas de higiene e de conforto a serem observadas pelas organizações. Nessa mesma linha, confira alguns pontos de destaque segundo Tatiana Gonçalves:

  • Locais para refeições: os empregadores devem oferecer aos seus trabalhadores locais em condições adequadas de conforto e higiene para as refeições por ocasião dos intervalos concedidos durante a jornada de trabalho.
  • Alojamento: é o conjunto de espaços ou edificações, composto de dormitório, instalações sanitárias, refeitório, áreas de vivência e local para lavagem e secagem de roupas, sob responsabilidade do empregador, para hospedagem temporária de trabalhadores. Esses espaços devem:
    1. ser mantidos em condições de conservação, higiene e limpeza;
    2. ser dotados de quartos;
    3. dispor de instalações sanitárias, respeitada a proporção de 1 (uma) instalação sanitária com chuveiro para cada 10 (dez) trabalhadores hospedados ou fração; e
    4. ser separados por sexo. 

Caso as instalações sanitárias não sejam parte integrante dos dormitórios, devem estar localizadas a uma distância máxima de 50 m (cinquenta metros) desses ambientes, interligadas por passagens com piso lavável e cobertura. 

“Esses são apenas exemplos básicos dos cuidados a serem tomados pelas empresas, mas existem muitos outros. Assim, a recomendação é entender as normas e se adequar. Feito isso, os riscos ficam muito menores, garantindo o normal funcionamento do negócio”, finaliza Tatiana.

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