Há quem diga que a melhor defesa é o ataque. Após
mais de dois anos de guerra entre Rússia e Ucrânia, já presenciamos várias
tentativas ucranianas de adentrar as fronteiras russas. Inicialmente, esses
ataques eram vistos como missões suicidas — ações que se esperava fracassar —
mas que poderiam, ao menos temporariamente, desviar a atenção e os esforços dos
exércitos de Moscou para um lado específico do front. Eram
ataques de pequena proporção e curta duração.
Na semana passada, no entanto, ocorreu a mais
ousada incursão ucraniana em solo russo desde o início da guerra, atacando o
oblast de Kursk. Um oblast é uma das subdivisões administrativas da Federação
Russa, semelhante a uma província ou estado em outros países. Esses territórios
possuem certo grau de autonomia, mas são administrados diretamente pelo governo
central em Moscou. A Rússia é composta por 85 dessas entidades federativas, que
incluem oblasts, repúblicas, krais e cidades federais.
O oblast de Kursk está localizado no oeste da
Rússia, na fronteira com a Ucrânia, e faz parte do distrito federal central do
país. A capital do oblast é a cidade de Kursk, que também é a maior cidade da
região. A área é caracterizada por terrenos planos e férteis, com um clima
temperado continental, que é favorável à agricultura. Com aproximadamente 1,1
milhão de habitantes, a região possui uma densidade populacional relativamente
baixa quando comparada a outras partes da Rússia.
Na terça-feira, 6 de agosto, iniciou-se uma ofensiva
ucraniana na região, que varreu partes do oblast de Kursk. A decisão da Ucrânia
de invadir essa área pode ser vista como uma tentativa de transferir o conflito
para o território russo, desestabilizando a linha de defesa do país e
aumentando a pressão sobre o Kremlin. Um dos objetivos de Kiev pode ser forçar
a Rússia a redistribuir tropas e recursos que estavam focados nas frentes
internas da Ucrânia, aliviando a pressão sobre áreas estratégicas como Donetsk
e Luhansk.
Além disso, o forte ataque ucraniano está obrigando
a Rússia a lutar em múltiplos fronts simultaneamente, o que pode
esgotar ainda mais os recursos militares russos. Mais do que isso, a Ucrânia
está demonstrando à comunidade internacional sua capacidade não apenas de
resistir, mas também de contra-atacar, fortalecendo sua posição em futuras
negociações de paz.
A resposta russa não tardou: o país, agora sob
ataque, não apenas está retirando a população do oblast de Kursk, como também
intensificou seus ataques a alvos civis na Ucrânia. Desde o início da incursão
de Kiev, supermercados, prédios residenciais e até mesmo escolas foram
alvejadas pela artilharia russa.
Com a Ucrânia invadindo o território russo, as
negociações de paz podem se tornar mais complexas. A Rússia pode endurecer sua
posição, exigindo a retirada completa das forças ucranianas como pré-condição
para qualquer diálogo, enquanto a Ucrânia pode utilizar sua posição fortalecida
no campo de batalha para buscar condições mais favoráveis.
Segundo teorias de guerra e conflito, a decisão de transpor uma fronteira e invadir o território de um estado soberano, como a Ucrânia fez em Kursk, pode ser interpretada sob a lógica da "escalada controlada". Clausewitz, em sua teoria da guerra, argumenta que a guerra é uma extensão da política por outros meios; esse movimento pode ser entendido como uma tentativa ucraniana de criar novas realidades políticas no terreno, que obriguem a Rússia a negociar. A "teoria dos jogos" também pode ser aplicada, sugerindo que a Ucrânia está aumentando a aposta na esperança de forçar a Rússia a reconsiderar suas ações e buscar um acordo antes que a situação se agrave para ambos os lados.
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