Uma frase
costumeiramente dita pelo líder sul-africano Nelson Mandela, vencedor do Prêmio
Nobel da Paz de 1993, nunca perde o sentido: “A educação é a arma mais poderosa
que você pode usar para mudar o mundo”. Eis uma lição que o Brasil não aprendeu
porque permanece sem priorizar a educação como agente de transformação do País.
Há 33 anos a
Constituição Federal de 1988 deu um passo significativo ao obrigar, em seu
artigo 212, que a União aplique ao menos 18% e os governos estaduais e
municipais invistam, no mínimo, 25% da receita resultante de impostos em
educação. O problema é que um equívoco histórico se perpetua por falta de
coragem ou omissão propositada de nossos governantes, com a covarde
cumplicidade do Congresso Nacional.
Isso porque o
governo federal até hoje se aproveita de uma inexatidão terminológica seguida
pelos constituintes, os quais, ao tratar da obrigação constitucional de
investimento em educação, fixaram percentual de arrecadação de impostos e não
de tributos (que englobam impostos, taxas e contribuições). E faz isso
aumentando a carga tributária via contribuições – como Contribuição Social
sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição para o Financiamento da Seguridade
Social (Cofins) e Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) – e
adotando a política de conceder renúncias fiscais com os impostos
compartilhados com estados e municípios, como o Imposto de Renda (IR) e o
Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
Ou seja, sem que
congressistas, governadores, prefeitos e reitores de universidades percebessem,
o governo federal conseguiu, ao mesmo tempo, subtrair as receitas dos Estados e
Municípios e impedir o aumento dos investimentos obrigatórios em educação e
saúde, calculados apenas sobre os impostos. Além disso, sobrepôs as receitas e
o poder da União, e consequentemente a dependência dos Estados e Municípios,
(entortaram a federação), distorcendo o princípio federativo.
Com a ciência de
tais informações, é incontestável pensar que se o percentual destinado à
educação abarcasse também os tributos, e não somente aos impostos, haveria
imediato e robusto reforço nos recursos carimbados para esse segmento, vital
para mudar para melhor a realidade do Brasil. Mas não é só.
Se o Brasil almeja
garantir mais receitas para a educação, precisa rever a prática enraizada de
concessão de renúncias fiscais, especialmente as que envolvem IR e IPI, cujo
total correspondeu, em 2021, de 4,5 a 5% do Produto Interno Bruto (PIB)
nacional. Como são impostos compartilhados com estados e municípios, ambos
representam perda para esses entes federativos aplicarem em educação cada vez
que uma renúncia fiscal é concedida.
Em valores
calculados sobre a estimativa do PIB de 2022 (R$ 9,7 trilhões), IR e IPI somam
R$ 657 bilhões. E a renúncia fiscal da União sobre esses dois impostos atinge
R$ 145 bilhões, ou até R$ 165 bilhões se considerada a renúncia fiscal
adicional sobre IPI garantida por decretos recentes do governo federal. Isto é:
as renúncias fiscais consomem 25,11% das receitas de IR e IPI.
Há outros números
superlativos. As benesses fiscais da União resultam de perda de R$ 37,15
bilhões para o Fundo de Participação dos Estados e de R$ 40,42 bilhões para o
Fundo de Participação dos Municípios. Isso representa R$ 19,39 bilhões a menos
para investimento nos ensinos fundamental e médio (estados e municípios) e
menos R$ 15,84 bilhões para o ensino superior e institutos de pesquisa (União).
Um país que ainda tem 11 milhões de analfabetos não pode se dar ao luxo de desprezar
R$ 35,23 bilhões por ano para investimento em área tão sensível. É possível
mudar esse rumo, proibindo a renúncia fiscal com impostos compartilhados ou
garantindo compensações por meio do repasse do volume de recursos retirados
pela renúncia, via outra fonte.
Além de aumentar
os investimentos, o Brasil ainda precisa repensar a qualidade da educação que
oferece aos seus cidadãos. É urgente implantar escolas de tempo integral nos
ensinos fundamental e médio assim como, na mesma medida, é necessário valorizar
a profissão de professor, oferecendo-lhe remuneração adequada, capacitação
permanente com treinamento e reciclagem, e melhores condições de segurança e
transporte, sobretudo para os profissionais que atuam nas periferias, na zona
rural e nos cursos noturnos. Recursos para isso existem e viriam da redução das
renúncias fiscais.
As novas
tecnologias, as novas profissões, as recentes necessidades do mercado exigem
também uma revisão das grades curriculares, hoje defasadas, trazendo-as para o
século XXI a fim de preparar os estudantes para os desafios atuais e futuros do
mundo globalizado e altamente tecnológico. A Matemática hoje lecionada nos
ensinos fundamental e médio no Brasil, por exemplo, sequer aborda a questão das
finanças, com a qual o cidadão vai conviver até o fim da vida, seja a nível
pessoal, seja a nível profissional. Todos os cursos deveriam incluir noções
elementares de finanças, de economia e de controle de gastos.
Nem é preciso
dizer que o Brasil também precisa universalizar o acesso ao ensino superior e
fomentar as instituições de pesquisas, aproveitando a fonte de recursos
garantida por uma nova política de renúncias fiscais que deveria ser limitada
por lei a 1,5% a 2% do PIB, no máximo. Educação nunca foi despesa; sempre foi
investimento com retorno garantido, como ensinou o economista britânico Sir
Arthur Lewis, em lição ainda não aprendida pelos governantes brasileiros.
É unanimidade
nacional o conceito de que sem educação não há salvação. O problema é que a
prática se mantém distanciada do discurso. Com isso, a salvação não veio e não
virá sem mudanças profundas como, por exemplo, as discutidas nessas linhas.
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