Quem nunca foi para a cozinha pegar alguma coisa, mas chegando lá, não lembrava o que tinha ido buscar? Esse é o exemplo clássico do Efeito Porta, como são popularmente conhecidos os lapsos de memória que ocorrem no dia a dia.
De acordo com a psicanalista Maristela Carvalho, esses esquecimentos podem acontecer em diferentes fases da vida e em pessoas de qualquer idade.
“O Efeito Porta pode revelar que estamos passando por um estresse grande, excesso de estímulos ou sobrecarga em nossa rotina e, sobretudo, em nosso processo de atenção”, explica.
São tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, um excesso de demandas para resolver, que não conseguimos a atenção plena para as atividades básicas do dia a dia. Por isso esquecemos o que fomos buscar na cozinha, onde colocamos o celular, deixamos a porta de casa aberta, o fogão aceso e uma série de outras situações que não deveriam acontecer, mas estamos sobrecarregados, sobretudo emocionalmente”.
De acordo com a psicanalista, a tecnologia, que oferece ferramentas de extrema importância para nos auxiliar, inclusive na organização ao longo do dia, pode atrapalhar se não tomarmos cuidado.
“As mensagens de whatsapp, e-mails e notificações que nos
interrompem a todo instante comprometem nossa concentração e invadem nossa
rotina. Se paramos a todo momento o que estamos fazendo para responder, olhar
as redes sociais, resolver questões que nem sempre são prioridades, muitas
vezes esquecemos o que estávamos fazendo. Quando estamos vivendo este tipo de
situação, é preciso reavaliar, antes que estas interferências tomem proporções
maiores, prejudicando nossa vida pessoal, profissional e colocando em risco
nossa saúde física e mental”.
Atenção aos sinais do corpo
Desviar a atenção das nossas prioridades pode ser um sinal da
nossa mente de que aquilo que estamos fazendo, por algum motivo, até mesmo
emocional, esteja nos incomodando.
“No processo de análise, poderemos identificar o que nos dificulta concretizar trabalhos importantes, realizando outros, menos importantes”, diz Maristela.
O primeiro passo para reverter essa situação, orienta a psicanalista, é investigar e mudar alguns hábitos.
“Há estratégias práticas que nos ajudam a manter o foco. Anotar os compromissos, priorizar as tarefas, utilizar recursos como agenda, ainda que uma agenda online, post-it, bloco de notas, mas fazer anotações importantes e não depender exclusivamente da nossa memória”.
No campo emocional, é preciso identificar aquilo que nos angustia para que seja possível desconstruir as ansiedades mais fortes e, aos poucos, alcançar a tranquilidade.
“A atividade física, a meditação e uma boa noite de sono
tranquilizam a mente, auxiliando no foco e atenção ao longo do dia. A psicoterapia
e a análise são ferramentas importantes, inclusive para identificar aquilo que
nos angustia e porque estamos tão sobrecarregados”, explica.
Uma boa noite de sono
Além dos esquecimentos, este excesso de estímulos e a sobrecarga ao longo do dia podem trazer outros efeitos nocivos, como os distúrbios de sono.
“Quando vamos dormir, nos deitamos e tentamos relaxar, mas somos atropelados por uma avalanche de pensamentos, é um sinal de que a nossa cabeça está sobrecarregada de problemas e emoções, em busca de uma solução. É a nossa mente tentando resolver questões que não conseguimos resolver ao longo do dia, da semana, dos meses. Neste caso, não basta toar remédio para tratar a insônia, é importante buscar a causa para, então, encontrar uma solução”.
Na análise, revela Maristela, psicanalista e paciente têm a
oportunidade de conversar em busca dessas causas, traumas, dores, com o
objetivo tranquilizar a mente e consequentemente voltar a dormir, voltar a
pensar com tranquilidade e permitir se organizar.
Maristela
Carvalho - formada em pedagogia pela PUC/SP; em psicologia pela Université
Lumière Lyon II, na França; e em psicanálise pelo Centro de Estudo
Psicanalítico. É membro do Grupo APOIAR e do Centro de Refugiados da USP, nos
quais presta serviços de apoio à saúde mental para refugiados e pessoas em
situação de vulnerabilidade social, e do Órion Instituto Médico.
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