Luciano Aparecido de Almeida Júnior, primeiro autor do artigo, analisa imagem da pesquisa no laboratório do grupo (foto: Francisco Wanderley Garcia de Paula-Silva/USP) |
Em camundongos, pesquisadores da USP mostraram a importância da via de sinalização mediada pela citocina pró-inflamatória TNF-α e por seu receptor TNFR1; conhecimento pode orientar a busca por medicamentos
Por meio de experimentos
com camundongos, pesquisadores desvendaram mecanismos envolvidos em inflamações
na polpa dentária e em lesões periapicais (em torno da extremidade da raiz do
dente), abrindo caminho para a busca de medicamentos que podem ser usados para
inibir a perda óssea decorrente de infecção endodôntica. O mecanismo estudado
envolve um receptor denominado TNFR1, no qual a citocina pró-inflamatória TNF-α
se liga.
Em uma das
situações avaliadas, a via de sinalização TNF-α-TNFR1 foi capaz de proteger e
permitiu o reparo do dente, mas, em outro caso, gerou resposta em sentido
diferente, levando a um processo inflamatório com perda óssea – a diferença foi
a presença ou não de microrganismos.
Um dos estudos,
publicado no Journal of Endodontics, mostrou que o receptor TNFR1
está envolvido na formação de dentina reparadora após a realização do chamado
“capeamento” da polpa dentária, ou seja, a colocação de um material bioativo
diretamente sobre o local exposto na tentativa de permitir a cicatrização da
polpa.
Quando o TNFR1 é
removido ou desativado geneticamente (processo conhecido como ablação), há uma
alteração da resposta inflamatória e inibição da produção de proteínas-chave de
mineralização (sialoproteína dentinária e osteopontina), levando à necrose da
polpa dentária e ao desenvolvimento de periodontite apical. Com isso, os
pesquisadores demonstraram, in vivo, que essa via de sinalização
pró-inflamatória é importante para a diferenciação celular e síntese de
proteínas que controlam o processo de biomineralização dentária – um caminho
crucial para a cicatrização adequada dos dentes.
Já no outro
trabalho, publicado na mesma revista, os cientistas observaram que a via de
sinalização TNF-α-TNFR1 é responsável por mediar a degradação do tecido ósseo
após a contaminação do canal radicular. Essa via desempenha um papel importante
na inflamação e na perda óssea quando o canal radicular do dente está
contaminado por microrganismos. Se houver o bloqueio dela, é possível reduzir
os efeitos negativos.
“Nosso grupo tem
trabalhado na investigação de mediadores biológicos envolvidos na diferenciação
de células-tronco e biomineralização de dentes e ossos. Estudamos lesões
periapicais, que são um tipo bem específico, quando há entrada de bactérias no
canal radicular dos dentes, resultando em uma contaminação no canal”, afirma o
professor da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo (FORP-USP) Francisco Wanderley Garcia de
Paula-Silva.
Os dois artigos são
resultado do doutorado de Luciano Aparecido de Almeida Júnior no
Programa de Pós-Graduação em Odontopediatria da FORP-USP, sob orientação de
Paula-Silva. Ambos receberam apoio da FAPESP (19/00204-1 e 19/02432-1).
Recentemente, o
grupo ligado ao professor também publicou um artigo direcionado
e revisado por crianças para explicar o processo de regeneração dos dentes, com
ênfase nas células e moléculas envolvidas neste mecanismo. Além disso, eles
mantêm um canal no
YouTube sobre “alfabetização” em saúde bucal (leia mais em: agencia.fapesp.br/41826).
Entre crianças e
adolescentes, as cáries são o principal problema bucal, segundo dados
preliminares da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal, que vem sendo realizada pelo
governo federal. O levantamento mostra ainda que cerca de 45% dos idosos de 65
a 74 anos precisam de algum tipo de tratamento imediato, devido à dor ou
infecção dentária, e, entre adultos (de 35 a 44 anos), foi identificada a
necessidade de ao menos um procedimento odontológico eletivo em 48% da
população avaliada.
Passos
Na pesquisa que
envolveu a formação de dentina reparadora, os cientistas compararam as
respostas de reparo da polpa dentária de camundongos geneticamente deficientes
do receptor-1 de TNF-α com roedores “selvagens” (linhagem C57Bl6). O capeamento
da polpa foi realizado com agregado de trióxido mineral. Após sete e 70 dias,
os tecidos foram coletados para avaliação.
Nessa situação
(falta do receptor TNFR1), a resposta inflamatória gerada foi muito grande,
resultando na perda óssea com recrutamento de células que fazem essa reabsorção
do tecido.
No estudo que
avaliou a via de sinalização TNF-α-TNFR1 frente à infecção, os pesquisadores
induziram a periodontite apical por meio da inoculação de microrganismos orais
nos canais radiculares de molares dos camundongos e compararam com o grupo de
controle após sete, 14, 28 e 42 dias.
Foram realizadas
análises por microtomografia computadorizada – com a participação do
Laboratório de Pesquisa em Endodontia da FORP-USP –, avaliação histopatológica,
histomicrobiológica e histométrica. A conclusão foi de que os roedores
deficientes de TNFR1 exibiram menor recrutamento de neutrófilos aos 14, 28 e 42
dias, resultando em diminuição da área e do volume da periodontite apical aos
42 dias.
O número de
osteoclastos – células responsáveis pela reabsorção óssea por meio da desmineralização
e degradação da matriz do osso – também foi menor nestes animais aos 14 e 42
dias.
Paula-Silva diz que
seu grupo vem agora buscando perspectivas terapêuticas com base nos achados das
duas pesquisas. “Com esses resultados, percebemos que, se bloquearmos essa
resposta inflamatória, inibindo o receptor, podemos trabalhar em um protocolo
de tratamento. Estamos na fase inicial, ainda em modelo animal, mas é um alvo
bem interessante”, complementa o professor em entrevista à Agência
FAPESP.
Os artigos Reparative
Dentin Formation Following Dental Pulp Capping is Mediated by TNFR1 In Vivo e TNF-α-TNFR1
Signaling Mediates Inflammation and Bone Resorption in Apical Periodontitis podem
ser lidos, respectivamente, em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37423584/ e https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37499863/.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/descoberta-de-mecanismo-envolvido-em-inflamacao-dentaria-abre-caminho-para-terapias-contra-perda-ossea/44930
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