Os serviços
médicos de atenção domiciliar, ora denominado home care,
funcionam como uma extensão da internação hospitalar com o principal objetivo
de proporcionar ao paciente a oportunidade de recepcionar os atendimentos de
assistência médica e enfermagem no conforto de seu lar, proporcionando mais
comodidade a sua evolução em seu quadro clínico.
Nesta senda, o home care
subdivide-se em quatro categorias, para melhor adaptabilidade e precisão ao
definir as necessidades do paciente, quais sejam: Atenção Domiciliar,
Atendimento Domiciliar, Internação Domiciliar e Visita Domiciliar.
Em breve
síntese, podemos definir a Atenção Domiciliar como o conjunto de ações de
prevenção e tratamento de doenças, reabilitação, paliação e promoção à saúde,
prestadas em domicílio, garantindo continuidade de cuidados.[1]
Já o Atendimento
Domiciliar pode ser compreendido como as atividades que representam ações menos
complexas, podendo inclusive serem comparadas a uma espécie de “consultório em
casa”, enquadrando-se como um conjunto de ações que buscam a prevenção de possíveis
agravos a saúde, a sua manutenção e recuperação de saúde, abrangendo atividades
mais simples, bem como as mais complexas como é o caso da visita domiciliar e
até mesmo o da internação domiciliar.
A Internação
Domiciliar são os serviços prestados a residência do paciente de forma que
podemos interpreta-las como extensivas a internação hospitalar, tendo em vista
a sua consistência em atendimento de acordo com as necessidades, incluindo
serviços que vão desde administração de medicamento até mesmo serviços de
enfermagem, fisioterapia e afins.
Por fim, a
Visita Domiciliar é um serviço de assistência médica ou social em que
profissionais de saúde, assistentes sociais ou outros especialistas visitam a
residência do paciente para avaliar sua condição de saúde, fornecer cuidados,
monitorar progresso e oferecer suporte personalizado no ambiente familiar.
Posto isto, é
comum que os pacientes beneficiários dos planos de saúde recorram ao judiciário
para compelir as operadoras a realizarem a prestação de serviços de home care
com base na indicação de seu médico de confiança, o que, por um lado é inegável
a atuação do judiciário como alicerce da justiça a fim de igualar as relações
contratuais e de prestação de serviços, por outro lado o excesso de
protecionismo acabam onerando as operadoras de planos de saúde que se veem com
os seus direitos de defesas completamente cerceados diante a atuação.
Para melhor
contextualizar, é comum que as ações ajuizadas envolvendo home care
tenham como sua principal pilastra a solicitação do médico de confiança, assim,
salvo exceções, sequer levam em consideração os demais contextos aplicados pela
medicina. Assim, a posição do judiciário como medida de protecionismo jurídico,
como é o caso da aplicação das Súmulas 90 [2]de 102[3] do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, tendo
equivalências em demais estados, como o caso da Sumula 352[4] do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Neste fulcro, ao
magistrado reconhecer que basta única e exclusivamente a indicação expressa do
médico de confiança do paciente, consequentemente ocasiona o cerceamento de
defesa completo das operadoras de plano de saúde, sendo completamente
incompatível com o direito ao contraditório, a ampla defesa e natural
imparcialidade que se espera do judiciário.
Desta forma, são
comuns os casos em que os magistrados simplesmente optam por ignorar e
invalidar todas as tentativas de defesa das operadora, simplesmente entendendo
que as avaliações realizadas pela equipes que recepcionam a solicitação de
desospitalização e entendem que o paciente não necessita dos tratamentos
pleiteados em sua totalidades, entendendo ser compatível a concessão parcial
dos tratamentos para assegurar o mesmo resultado, seriam provas unilateralmente
produzidas e sem arcabouço probatório.
À titulo de
exemplo, imagine-se que o paciente requeira a manutenção de serviço de
enfermagem 24 horas por dia na casa do paciente, contudo, a equipe que lhe
presta serviço hospitalar ou até mesmo a equipe que lhe prestará o serviço em home care
atestar que a manutenção de enfermagem durante 12 horas diárias sem nenhuma
prejudicialidade a evolução do quadro clínico, o que geraria certa divergência
imprescindível de ser dirimida, eis que ambos os entendimentos tratam-se de
documentação unilateral elaboradas por seu médico de confiança, restando nítido
a necessidade de se instituir um perito imparcial para atestar as necessidades.
Neste fulcro, há
de se ressaltar que tais ações visando a garantia de tratamentos medicinais,
são diretamente ligados as ciências biológicas, não cabendo única e
exclusivamente aos doutores da ciência jurídica, sendo esta um campo das
ciências humanas, defini-lo o seu direito sem que haja a instrução probatória
lastreada em pericia médica, contudo, grande parte limita-se apenas a ignorar a
sua produção, entendendo que a solicitação do médico de confiança do paciente é
o suficiente para determinar as necessidades do paciente.
Por esse
princípio, destaca-se a necessidade da evolução do judiciário no que tange a
atuação da magistratura para dirimir ações que norteiam a medicina, como é o
exemplo da Resolução nº1, de 21/07/2017 que cita as aplicações de critérios
objetivos necessários para aferir e classificar os atendimentos de home care
pelo SUS, conforme destrincha o Art. 2º em seu parágrafo 2º que reconhece a
necessidade de utilização das tabelas NEAD e ABEMID para avaliação de
complexidade assistencial e critérios de elegibilidade.
Ambas as tabelas
são escalas desenvolvidas pela Associação Brasileira de Empresas de Medicina
Domiciliar e o Núcleo Nacional da Empresas de Assistência Domiciliar, que se
baseiam em critérios técnicos para estabelecerem uma pontuação determinando a
necessidade de internação e quais os serviços a serem fornecidos, o que diante
da limitação atual, poderiam ser adotadas como critério avaliativo de
necessidade ante a tutela de direitos.
Contudo não se
vê a obrigatoriedade da aplicação de nenhuma conjectura médica no âmbito
judiciário, do qual limita-se apenas a indicação do médico para a concepção de
direito.
Ficando
claramente perceptível que a aplicação da inversão do ônus da prova por se
tratar de ação consumerista, torna-se a ilegal restrição de direitos das
operadoras, eis que detém o onus de comprovar as desnecessidades pleiteadas,
contudo ao faze-las, as contraprovas não produzem nenhum efeito processual, eis
que o judiciário opta por descartá-las por entende-las como unilaterais, sendo
completamente desconsideradas.
Neste teor, de
mãos atadas e por muitas vezes sem a oportunidade de dirimir com base em seus
limites probatórios, as operadoras de saúde indiretamente acabam se tornando
reféns do judiciário, tendo todos os seus direitos reduzidos a única função de
executar o que lhe é judicialmente e coercitivamente ordenado.
O que o
judiciário deixa de considerar é justamente que a manutenção de serviços sem
auferir e comprovar as reais necessidades do paciente, transformam-se em
custos, o que futuramente onerará o próprio coletivo de beneficiários da
própria operadora do plano de saúde, eis que, influenciará gravemente os
estudos de sinistralidade e reajustes e sua aplicabilidade, ocasionando o risco
de aumentos significativos em suas respectivas mensalidades.
Posto isto, pode se averiguar que urge a necessidade do
judiciário atualizar-se ante a condução dos processos envolvendo a concessão de
home
care, aplicando medidas atípicas, tais como a antecipação de
produção de prova pericial ou até mesmo deferindo medidos típicas como a
produção de prova pericial para garantir a ambas as partes, iguais
oportunidades e direitos processuais, bem como intrinsicamente a instituições
de critérios aquém dos já utilizados antes de se pôr fim ao mérito, eis que os
métodos atualmente adotados ocasiona, única e exclusivamente o excesso de
inversão do onus da prova, ocasionando o mais puro cerceamento de direito às
operadoras.
GABRIEL FELIPE SOARES GONÇALVES - advogado desde 2022, atuando na área de Direito Médico e da Saúde na área de Healthcare Law do Vigna Advogado Associados, formado em Direito pela Universidade Cruzeiro do Sul em 2021.
[1] Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 825, de 25 de abril de 2016. Redefine a Atenção Domiciliar no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e atualiza as equipes habilitadas [internet]. Brasília, DF: Ministério da saúde; 2016
[2] Havendo expressa indicação médica para a utilização dos serviços de “home care”, revela-se abusiva a cláusula de exclusão inserida na avença, que não pode prevalecer.
[3] Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.
[4] "É ABUSIVA A CLÁUSULA CONTRATUAL QUE EXCLUI INTERNAÇÃO DOMICILIAR E SUA RECUSA CONFIGURA DANO MORAL."
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