Como se não bastasse a dificuldade de atuar
em um setor considerado sagrado usando as regras frias do mundo dos negócios,
as operadoras de saúde ganharam mais recentemente um upgrade neste desafio que
é o de reduzir os dilemas deste aparente antagonismo incorporando no dia a dia
da operação os comportamentos de conformidade com o famoso padrão EESG. Na
prática, isto se resume em ganhar o dinheiro suficiente para agradar às
expectativas dos acionistas, mas ao mesmo tempo, oferecer atendimento médico a
baixos custos e ainda respeitando elevados critérios de responsabilidade
socioambiental e de gestão.
Fazendo uma analogia com os icebergs, é
como se toda essa complexidade estivesse escondida nas profundezas do mar,
deixando à vista apenas a ponta mais elevada resultante de todo este processo
que é o alto custo das mensalidades.
Para falar apenas a respeito das questões
relacionadas à jornada EESG deste setor, é inegável que após a pandemia e, até
mesmo por causa dela, a dimensão Social (S) experimentou um inequívoco avanço
nos últimos anos.
Só para ter uma ideia, segundo a Associação
Brasileira de Empresas de Telemedicina e Saúde Digital, entre os 2020 e 2021
foram realizados mais de 7,5 milhões de atendimentos remotos no Brasil, feitos
por 52,2 mil médicos, psicólogos e terapeutas que alcançaram um índice de
resolutividade de 91% dos casos.
Isto é resultado direto do uso intensivo da
telemedicina e de outras tecnologias que conseguiram reduzir os custos e
democratizar o acesso à saúde, permitindo que um número maior de brasileiros
pudesse passar a usufruir dos benefícios oferecidos pelos chamados convênios
médicos.
Por outro lado, esta possibilidade de
expansão da cobertura ampliou as alternativas para a fuga de recursos dessas
empresas pela prática mais constante de fraudes e abusos.
Não por acaso, a Federação Nacional de
Saúde Suplementar (FenaSaúde) trabalha com a estimativa de que em 2022 as
operadoras de planos médico-hospitalares tiveram prejuízo operacional de R$
10,7 bilhões, o que seria o recorde de prejuízo em 25 anos.
Neste sentido, claramente se observa uma
dificuldade maior em avançar na dimensão da governança (G) e impacta também no
outro componente do EESG que é a sustentabilidade. Esta expressão não deve ser
confundida apenas com questões relacionadas aos cuidados com o planeta, mas também
com a sustentação da própria empresa e do mercado como um todo.
Afinal, como disse recentemente a
diretora-executiva da FenaSaúde, Vera Valente, a “inviabilização da saúde
suplementar não vai afetar apenas as operadoras. Vai prejudicar seus 50,3
milhões de usuários, que podem se ver sem cobertura, em caso de insolvência”.
Tal situação, segundo ela poderia levar ao
colapso todo o sistema de saúde nacional, uma vez que os planos respondem por
83% das receitas dos hospitais privados e mais de 50% das receitas dos
laboratórios.
A palavra sustentabilidade não é empregada
à toa. Sustentar significa se manter. Uma empresa não sustentável tem vida
curta. Quando uma companhia se preocupa em criar formas de produzir mais e
melhor com menos desperdício de matéria prima, ela está garantindo a manutenção
desse recurso para ela própria ao mesmo tempo que o dinheiro investido nas
inovações necessárias, resultam em produtos mais competitivos. É um ciclo.
Empresas aderentes a padrões EESG valem mais.
Portanto, para que um modelo de governança
corporativa seja implantado com base no padrão EESG é preciso total engajamento
dos acionistas e dos executivos que lideram esse processo.
Um caminho viável talvez seja o de
aprofundar ainda mais o uso de tecnologia, não só para baratear custos, mas
também e principalmente como forma de melhorar a governança. As chamadas
healthtechs já demonstraram que podem contribuir decisivamente neste processo.
Elas têm desenvolvido soluções inovadoras
em vários segmentos da saúde como a medicina preventiva, que evita ou minimiza
efeitos das doenças e a medicina preditiva, cuja finalidade é identificar a
predisposição a alguns males como câncer, hipertensão etc. Vale ressaltar
também o bom trabalho de algumas dessas startups em medicina proativa, que
estreita e prolonga a relação entre médico e paciente de forma suportada pela
tecnologia e a medicina personalizada que, como o próprio nome diz, permite que
tratamentos sejam aplicados conforme a característica de cada indivíduo.
Prevenir custa menos ao sistema de saúde e
gera maior bem-estar ao paciente do que tratar uma doença em estágio avançado.
Bem implantada, a tecnologia reduz a quantidade de consultas presenciais sem
prejuízo para o tratamento e para a relação médico/paciente e ainda contribui
para redução de filas em clínicas e hospitais e também do número de vezes que o
paciente tem de se locomover de casa ao consultório apenas para mostrar um
exame que poderia ter chegado ao médico por meios digitais.
Tudo isso é ganho de tempo, de eficiência,
de qualidade de vida para quem precisa e, na outra ponta diminuição de custos,
redução da emissão de carbono, já que exige menos locomoção, e do uso de papel
por meio da digitalização.
Enfim, apesar de parecer um problema a mais
para as operadoras de saúde, a busca por padrões EESG com apoio da tecnologia,
pode ser uma luz no fim do túnel com potencial de derreter o iceberg para que a
ponta que fica para fora da água seja cada vez menor e não assuste tanto aos
navegantes.
Roberto Gonzalez - consultor de governança
corporativa e EESG.
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