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sexta-feira, 5 de maio de 2023

No 'Dia Nacional do Uso Racional de Medicamentos', especialistas alertam pessoas sobre a automedicação de psicoestimulantes

O dia 5 de maio é considerado o Dia Nacional do Uso Racional de Medicamentos, e o fenômeno do uso de drogas psiquiátricas, as “pílulas mágicas" sem escrutínio cresce cada vez mais para pessoas que buscam performance para estudar, trabalhar ou até mesmo para ficarem acordadas em festas. 

Procuramos os especialistas da Allure Presses (@allurepresses) para entender melhor esse aspecto de viver com o consumo desses medicamentos. 

Os medicamentos antidepressivos ou descritos para TDAH, compulsão alimentar, são medicamentos prescritos com base em evidências que podem ajudar as pessoas a se sentirem melhor. Pode levar a algumas tentativas e erros para encontrar o medicamento certo para você porque alguns funcionam de maneira diferente de outros, mas a chave para encontrar a opção para você é tomar qualquer medicamento prescrito exatamente como indicado pelo seu médico. Confira:

 

Uso para melhora da performance mental: 

Alexandre Lucidi (@alucidi) - médico geneticista, atuante em Neurogenética e Neuroimunologia, diz que medicações psicoestimulantes como o metilfenidato e modafinil são usadas há décadas para tratar condições como o déficit de atenção e a narcolepsia. Entretanto, estudos relatam uso como uma droga recreativa e intoxicações agudas e fatalidades envolvendo o metilfenidato foram relatadas.  

A rápida expansão dos análogos destas substâncias no mercado de medicamentos nos últimos anos torna provável a ocorrência de intoxicações e fatalidades. O monitoramento cuidadoso e o controle sistemático das prescrições devem ser realizados para aumentar a segurança na prescrição, e os esforços de educação devem ser feitos entre as populações de risco ou com potencial de abuso.  

Estas medicações têm como alvo as catecolaminas do sistema nervoso central, ou seja, a dopamina, a norepinefrina, a serotonina, para induzir seus efeitos. Como tal, eles também modificam o estado de alerta, a sociabilidade e a libido e com potencial de abuso entre indivíduos saudáveis para fins recreativos.  

Estudos científicos mostraram apenas pouco ou nenhum benefício para o aprimoramento cognitivo. “Pior ainda, o consumo dessas drogas pode ser viciante e prejudicial à saúde com riscos de distúrbios psicológicos, neurológicos e cardiovasculares que podem ser fatais”, diz Alexandre. 

De um modo geral, o uso de fármacos em sujeitos saudáveis para melhorar o desempenho físico e psíquico modificou o conceito de corporeidade e a possibilidade de projeção da sua própria corporeidade. O conceito de autodeterminação na medicina levado ao excesso pode levar a escolhas perigosas, como no caso do uso indevido de substâncias. Mesmo a relação médico-paciente, que se modificou consideravelmente, deixou ampla possibilidade ao paciente/indivíduo, até quase imaginar que sobrepor a figura do médico por meio de informações errôneas e transposição imediata destas identidades. 

Nas novas gerações, o conceito de aperfeiçoamento pessoal, com pouco esforço e pouco risco percebido pode tornar tudo lícito. Consequentemente, a falta de percepção do perigo dessas substâncias em questão, as torna absolutamente utilizáveis e lícitas, o que aumenta o risco social. 

Estudos relatam reações adversas ao metilfenidato, por exemplo, com eventos cardiovasculares, que incluem infarto agudo do miocárdio, morte súbita cardíaca, acidente vascular cerebral, taquicardia e aumento da pressão arterial, relatados em pacientes adultos e pediátricos. O metilfenidato, semelhante a outros estimulantes do SNC, foi associado à morte súbita em crianças e adolescentes com alterações cardíacas estruturais preexistentes. Os dados disponíveis em pacientes sem cardiopatia congênita são conflitantes. Um grande estudo de coorte retrospectivo mostrou uma baixa incidência geral e risco de eventos cardiovasculares graves em crianças e adultos jovens, da mesma forma, os bancos de dados de com análise retrospectivas não mostraram um aumento de eventos cardiovasculares graves (infarto agudo, morte súbita, acidente vascular cerebral) com o uso de estimulantes em adultos jovens e de meia-idade, o que torna conflitante os dados da literatura.  

O metilfenidato aumenta a frequência cardíaca média e a pressão arterial sistólica por meio da mediação dos sistemas catecolaminérgicos simpático, central e periférico. Esse aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial pode levar a eventos cardiovasculares, como arritmias ou infarto do miocárdio com fatores de risco como doença cardíaca estrutural, uso concomitante de medicamentos que prolonguem o intervalo QT.  

Há outras reações adversas descritas nesta medicação, que aqui é citada como um exemplo, como o atraso do crescimento em crianças, priapismo, sempre com fatores de risco relacionados. Por isso, é importante a escolha correta da medicação, a indicação correta e o conhecimento clínico, além da especialidade atendida pelo médico, finaliza Lucidi

 

Uso para fins recreativos: 

Philipe Diniz, médico psiquiatra do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais), mestre em saúde coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professor de pós-graduação (Universidade Celso Lisboa), diz que medicações psicoestimulantes são drogas utilizadas no tratamento de algumas condições neuropsíquicas. “No Brasil temos disponíveis três formulações principais: metilfenidato (ritalina), lisdexanfetamina (venvanse) e o modafinil (stavigile). São usados para o tratamento de TDAH, depressões refratárias, alguns transtornos alimentares e em transtornos do sono, como a narcolepsia. Todas têm ótimos resultados quando bem indicadas e acompanhadas por médico especialista. Entretanto, seu uso indiscriminado como pré-treino e como drogas de balada se torna preocupante, pois apresentam efeitos adversos importantes e perigosos nessas situações”, diz ele. 

Nesses casos, os efeitos mais preocupantes dizem respeito ao risco cardiovascular e ao risco de surto psicótico. Psicoestimulantes aumentam a frequência cardíaca, a pressão arterial e o risco de eventos potencialmente fatais, como arritmias, infarto e AVC. Além disso, por aumentarem os níveis cerebrais de dopamina, podem desencadear surtos psicóticos agudos, com delírios, alucinações, agitação intensa e paranoia. 

Analisando tais efeitos, precisamos pensar nas duas situações em pauta: a academia e a balada. Na academia, o exercício físico gera os mesmos efeitos cardiovasculares, como aumento da frequência cardíaca e da pressão, porém estes efeitos são autolimitados e benéficos ao organismo. Entretanto, quando potencializados com psicoestimulantes, a chance de um evento perigoso, como infarto e AVC, aumenta muito. Precisamos lembrar também, que há um aumento grande no uso de anabolizantes de forma indiscriminada e também de outras formulações pré-treino, que normalmente contém outros estimulantes, como a taurina e a cafeína. Se somarmos tudo isso, o corpo vira uma verdadeira bomba pronta para explodir no próximo agachamento. 

Já nas baladas, o contexto é até mais preocupante. O principal risco ocorre devido à mistura dessas substâncias, como álcool ou outras drogas. Os estimulantes diminuem o efeito sedativo do álcool. Normalmente, o sono do álcool acaba sendo uma forma de proteção, pois a pessoa ao longo da noite vai ficando lenta e demorando mais para terminar sua bebida ou pegar outra. Ou seja, “estar bebinho” normalmente limita a quantidade ingerida. Entretanto, quando você usa um psicoestimulante, você consegue beber um volume muito maior, sem dormir. É isso que as pessoas descobriram e buscam. O perigo é que você não percebe quando já está chegando aos limites tóxicos do álcool. Ou seja, você tem duas substâncias que juntas podem desencadear um ataque cardíaco, um AVC ou uma psicose.  

Philipe diz que na tentativa de anular um efeito limitador de uma droga, você acaba se colocando em risco. Já na mistura com outras drogas, principalmente outros psicoestimulantes, como ecstasy, cocaína e MDMA, a lógica do aumento do risco cardiovascular é a mesma, porém mais intensa. Entretanto aqui gostaria de frisar que o risco no desenvolvimento de psicoses é maior, pois todas elas são substâncias que aumentam a ação da dopamina. Este neurotransmissor é importantíssimo para nossos tratamentos, melhorando a atenção, o nível de alerta e também o prazer. É ele o responsável pelas “ondas” prazerosas geradas pelas drogas citadas. No entanto, sua ação desregulada e excessiva pode desencadear alucinações, delírios e paranóias. Portanto, mais uma vez, o somatório dessas substâncias aumenta muito o risco destes efeitos adversos nada prazerosos. É sabido, por exemplo, que a associação de Metilfenidato com ecstasy não potencializa o efeito prazeroso do ecstasy, como provavelmente deseja o corajoso que tenta misturá-los. Ou seja, tal associação acaba sendo inútil e perigosa. Para finalizar, precisamos comentar sobre outros dois perigos do uso de psicoestimulantes em baladas. Normalmente, as pessoas se hidratam pouco ao longo das festas e o álcool estimula a produção de hormônio antidiurético (por isso vamos toda hora no banheiro).  

O resultado final tende a ser um balanço hídrico negativo, ou seja, uma desidratação. Um corpo desidratado tende a ter mais efeitos adversos de medicações, pois ela fica mais concentrada no sangue. Além disso, num país quente como o nosso, não é raro que uma balada seja um ambiente quente. Os psicoestimulantes aumentam a temperatura corporal, podendo gerar até mesmo hipertermia – um aumento excessivo da temperatura corporal que não consegue ser superado pelos mecanismos normais de eliminação de calor (suor, respiração). Quando usamos uma substância que aumenta a temperatura do corpo num ambiente quente, a chance de ocorrer uma hipertermia é enorme, especialmente se a hidratação não estiver boa. Dito isto, podemos concluir que usar um psicoestimulante para levar nosso corpo ao limite pode parecer útil e até muito gostoso, mas o preço a pagar é caro demais. Esse preço é o colapso; seja ele físico ou mental, finaliza Diniz.      

 

Uso para emagrecimento:  

Muitas pessoas estão recorrendo ao uso dos medicamentos para transtorno de compulsão alimentar em adultos e indicados para o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) para emagrecer, e isso pode causar problemas. Isto é o que aponta Higor Caldato (@drhigorcaldato), médico psiquiatra e sócio do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais), especialista em psicoterapias e transtornos alimentares 

Segundo o psiquiatra, a lisdexanfetamina trata duas condições que estão muito comuns na nossa população: o transtorno do déficit de atenção à hiperatividade e o transtorno alimentar. A grande dúvida que existe é, como um remédio para o TDAH também trata a compulsão alimentar? Será que as pessoas estão fazendo uso disso de uma maneira errada? Na verdade não, essa mesma medicação tem uma ação terapêutica para essas duas condições. “É comum por exemplo às vezes a mãe que está em tratamento de um transtorno de compulsão alimentar, está usando talvez o mesmo medicamento do filho que tem um transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Isso pode gerar alguma confusão na cabeça de tantas pessoas”, comenta Higor. 

O venvanse é usado para o tratamento da compulsão alimentar, mas quando esse paciente tem o transtorno, não é uma medicação que deve ser usada para a obesidade. “Se é um paciente obeso que tem compulsão alimentar, é uma medicação indicada, se é um paciente obeso que não tem transtorno de compulsão alimentar, essa medicação não deve ser usada. Então tem critérios muito importantes, até porque nem todo obeso tem compulsão alimentar, nem todo mundo que tem compulsão alimentar tem obesidade, é obeso. Então no fundo, no fundo é importante reforçar que o venvanse é sim o medicamento utilizado para o tratamento da compulsão alimentar, tem indicações precisas dependendo da gravidade dos episódios de compulsão que esse paciente apresenta, da frequência, então nós temos critérios diagnósticos muito bem definidos e que devem ser direcionados por um profissional especialista em transtornos alimentares”.  

Ao mesmo tempo, o venvanse é um psicoestimulante, então se um paciente que começa a fazer uso por conta própria, mesmo sendo uma medicação controlada, mas que foi prescrito de uma maneira não adequada para algum paciente, se ele tiver um transtorno de ansiedade, essa ansiedade pode piorar se ela não for tratada.  

São medicamentos como o venvanse que podem dar efeitos colaterais como inibição do apetite, muitas vezes de uma maneira exacerbada, sem um acompanhamento e controle, esse paciente pode ter problema na alimentação, ter dor de cabeça, enjoo e palpitação. Então esse medicamento só deve ser usado com o acompanhamento médico. Deve ser avaliado se esse paciente tem algum histórico de arritmia, pois tem vários cuidados que são muito importantes e que devem ser considerados no tratamento com esse tipo de medicamento, completa Caldato

 


Alberto Borges



REFERÊNCIAS:

CARLIER, J.; GIORGETTI, R.; VARÌ, M.R.; PIRANI, F.; RICCI, G.; BUSARDÒ, F.P.. Use of cognitive enhancers: methylphenidate and analogs. European Review For Medical And Pharmacological Sciences, [S.L.], v. 23, n. 1, p. 3-15, jan. 2019. Verduci Editore s.r.l.. http://dx.doi.org/10.26355/eurrev_201901_16741.

Cordioli, A. V., Gallois, C. B., & Isolan, L. (2015). Psicofármacos-: Consulta Rápida. Artmed Editora.

Diehl, A., Cordeiro, D. C., & Laranjeira, R. (2009). Tratamentos farmacológicos para dependência química: da evidência científica à prática clínica. Artmed Editora.

Morais, S. L. (2011). Irismar-Psicofarmacologia Clínica. Brazilian Journal of Psychiatry, 33, 315-315.

Cantarelli, M. D. G. (2007). Manual de psicofarmacologia clínica.

Estimulantes prescritos em indivíduos com e sem transtorno de déficit de atenção e hiperatividade: uso indevido, impacto cognitivo e efeitos adversos - https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3489818/

A influência da medicação para o TDAH nos processos fisiológicos e no exercício -https://www.physiopedia.com/The_influence_of_ADHD_medication_on_physiologic_processes_and_exercise



ESPECIALISTAS ALLURE PRESSES (@allurepresses):

Alexandre Lucidi (@alucidi) - médico geneticista, atuante em Neurogenética e Neuroimunologia. Com atuação em Neurogenética e Neuroimunologia, graduado em Medicina pela Universidade Estácio de Sá (UNESA), tem Residência Médica em Genética Médica pelo Instituto Nacional da Saúde da Criança, da Mulher e do Adolescente Fernandes Figueira, Fiocruz (IFF/Fiocruz) e Especialização em Neurologia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Mestrando do Programa de Pós Graduação em Neurologia da UNIRIO/HUGG e participa de estudos fase 3 na mesma instituição. Integrante da equipe de Neurologistas do Hospital Copa D’Or/ Rede D’Or São Luiz e voluntário em ações de conscientização sobre a esclerose múltipla na Associação de Pacientes do Estado do Rio de Janeiro.

Philipe Diniz, médico psiquiatra do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais), mestre em saúde coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professor de pós-graduação (Universidade Celso Lisboa).Graduado em medicina pela Faculdade de Medicina de Petrópolis (FMP), com residência em psiquiatria e mestrado em saúde coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Higor Caldato (@drhigorcaldato), médico psiquiatra e sócio do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais), especialista em psicoterapias e transtornos alimentares. Graduado em medicina pelo Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos (ITPAC/FAHESA) e fez sua residência médica em psiquiatria pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), bem como suas especializações de psicoterapias e transtornos alimentares também pela universidade carioca.


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