Estrutura cristalina do composto de chumbo (vermelho) e telúrio (azul). À esquerda, sem a presença do campo magnético. À direita, sob a influência de um forte campo magnético (ilustração: Andrey Baydin)
Fônon é uma excitação que se propaga
pela rede cristalina de um material sólido. Em física clássica, poderia ser
descrito como uma onda elástica. Mas, considerando que o fenômeno ocorre em
escala atômica, é preciso utilizar a física quântica. E, nesse caso, o fônon
deve ser pensado como um quantum de energia que viaja pela rede – ou como
uma quase-partícula.
A
manipulação de fônons oferece um amplo leque de aplicações tecnológicas – entre
elas, o transporte de calor em dispositivos termoelétricos, a modificação das
propriedades de um material ou até mesmo a indução de efeitos quânticos como a
supercondutividade.
“Existem formas de controlar os
fônons. Mas, até a realização de nosso estudo, não era esperado que campos
magnéticos pudessem ser usados para isso”, diz o pesquisador Felix Hernandez,
professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP).
Uma investigação conduzida por
Hernandez em colaboração com Junichiro Kono, da Rice University,
nos Estados Unidos, obteve esse tipo de manipulação em amostras de telureto de
chumbo (PbTe), um dos materiais mais utilizados para aplicações termoelétricas.
Os resultados foram publicados no
periódico Physical Review Letters.
Metodologia
Filmes
finos de PbTe foram produzidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe). E submetidos a campos magnéticos extremamente intensos, superiores a 25
tesla, no laboratório da Rice University, em Houston, Texas. Apenas para efeito
de comparação, um campo magnético dessa magnitude é 5 mil vezes mais intenso do
que um ímã comum, de geladeira.
“Quando os
átomos vibram de forma sincronizada, os fônons podem ser entendidos como ondas
acústicas, que se propagam pela rede transferindo calor. Mas existe também outra
modalidade de fônon. Se um pulso de laser for lançado sobre o telureto de
chumbo, os íons de telúrio e chumbo que formam a rede cristalina passarão a
oscilar transversalmente, na mesma direção, mas em sentidos contrários. Esse
tipo de fônon é classificado como óptico”, informa Hernandez.
Ao ser
aplicado o campo magnético intenso, os íons de telúrio e chumbo, que possuem
massas diferentes, ganham um momento angular. E o movimento transversal
transforma-se em circular. “Fônons ópticos circularmente polarizados absorvem
luz de forma desigual, um fenômeno conhecido como dicroísmo circular magnético.
Adicionalmente, observamos que as frequências desses fônons se separam em
função da magnitude do campo. Isso é resultado do momento magnético na
interação de Zeeman e do deslocamento diamagnético”, afirma o pesquisador.
Assim
denominado em referência ao nome de seu descobridor, o físico holandês Pieter
Zeeman (1865-1943), contemplado com o Prêmio Nobel de Física em 1902, o Efeito
Zeeman consiste na divisão das linhas espectrais de um material causado por um
forte campo magnético. Quanto ao diamagnetismo, este consiste no aparecimento
de um momento angular orientado no sentido oposto ao do campo magnético
externo. “Demonstramos que esses dados observados resultam de mudanças mórficas
induzidas pelo campo magnético nas simetrias do cristal”, comenta Hernandez.
O estudo
forneceu um conjunto de resultados bastante expressivo. Em resumo, mostrou que
o modo de oscilação dos fônons não é harmônico; que os fônons se suavizam, isto
é, que sua energia diminui com a diminuição da temperatura; que os fônons se
tornam circularmente polarizados, à direita ou à esquerda, no campo; que cada
sentido de polarização, direita ou esquerda, absorve luz de forma diferente,
isto é, que o material passa a apresentar dicroísmo circular magnético; que a
separação em energia dos tipos de polarização é devida à interação de Zeeman e
ao deslocamento diamagnético; que a interação de Zeeman é cem vezes mais
intensa do que a esperada pela teoria.
“Foi a
primeira vez que se observou o diamagnetismo de fônons”, destaca Hernandez. E
arremata: “Este trabalho apresenta a prova de conceito de um novo mecanismo
para controlar os fônons, que poderá ser usado para melhorar os dispositivos
termoelétricos”.
Segundo o
pesquisador, o próximo passo é investigar as propriedades magnéticas dos fônons
de PbTe dopados com estanho (Sn), que é um isolante topológico cristalino.
O estudo contou com dois apoios da
FAPESP: o Projeto Temático “Pesquisas em novos materiais
envolvendo campos magnéticos intensos e baixas temperaturas”,
conduzido por Gennady Gusev e que tem
Hernandez como um dos pesquisadores principais; e o projeto “Rotação de Kerr/Faraday em
materiais quânticos”, coordenado pelo próprio Hernandez.
O artigo Magnetic Control of Soft Chiral Phonons in PbTe pode
ser acessado em: journals.aps.org/prl/abstract/10.1103/PhysRevLett.128.075901.
O texto também está disponível no repositório arXiv: arxiv.org/abs/2107.07616#:~:text=PbTe%20crystals%20have%20a%20soft,in%20anomalously%20low%20thermal%20conductivity.
José Tadeu Arantes
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/estudo-mostra-pela-primeira-vez-que-e-possivel-manipular-fonons-por-meio-de-campo-magnetico/39075/
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