“Viajar! Perder países! / Ser outro constantemente, / Por a alma não ter raízes / De viver de ver somente!”, bradava Fernando Pessoa em um de seus poemas mais conhecidos, escrito em 1933. Quase cem anos mais tarde, os versos do poeta se renovam em um espírito aventureiro que parece ser compartilhado por tantos de nós, depois de tantos meses impossibilitados de ver muito além dos metros quadrados de nossas próprias casas e apartamentos.
Uma série de estudos feitos em todo o mundo têm
demonstrado que, conforme a vacinação avança, as pessoas começam a olhar
novamente para além de suas esquinas. Isso se traduz em uma nova onda de buscas
por passagens, hospedagens e passeios. Mas se engana quem pensa que tudo será
como antes, porque as viagens pós-pandemia devem servir a propósitos muito mais
profundos e duradouros que simplesmente “perder países”. Pesquisas nos Estados
Unidos revelaram que ficar perto da família é a prioridade para a maioria dos
entrevistados: 32% mencionam esse tipo de viagem como o mais importante.
Os efeitos de mais de um ano de conexões
majoritariamente virtuais serão os propulsores de viagens à procura do afeto e
do acolhimento humanos. Durante esse tempo, fomos capazes de compreender a
importância da socialização para nossa saúde mental. Agora, prestes a ficarmos
livres do necessário distanciamento social, procuraremos experiências que nos
permitam fortalecer laços com aqueles que amamos.
Enquanto o Google registrou 131% de aumento nas
buscas por viagens solitárias entre 2016 e 2019, neste momento, a tendência é
outra. Estar perto, compartilhar risadas, paisagens e refeições, aproveitar a
companhia de amigos e familiares podem parecer objetivos singelos, mas
adquiriram um imenso significado para quem tem sentido o impacto da solidão na
rotina do dia a dia, antes tão cheia de rostos e vozes.
Sentir-se só é um fardo ainda mais pesado para um
povo como o brasileiro, acostumado aos apertos de mãos, beijos no rosto e
abraços espontâneos. E essa não é uma observação empírica ou hipotética, mas
uma estatística devidamente mensurada. O Instituto Ipsos ouviu mais de 23 mil
pessoas em 28 países e descobriu que, no Brasil, metade das pessoas afirmam ter
sentido solidão “muitas vezes”, “frequentemente” ou “sempre” ao longo da
pandemia.
A procura por novas experiências que permitam
esticar as pernas e expandir a mente - de preferência acompanhado - é, então,
uma fagulha de esperança para muitos. Há, atualmente, uma atmosfera que é, ao
mesmo tempo, de suspensão e expectativa. Mesmo com a vacinação a passos lentos
no país, a demanda por viagens já começa a apresentar tendência de alta, até
mesmo no Google Trends. O mesmo aconteceu no fim de 2020, quando o número de casos
estava mais baixo e a Covid-19 parecia dar uma trégua, o que gerou um pico de
pesquisas pelo termo “pacote de viagem”. Isso significa que estamos só
aguardando condições seguras para nos lançarmos a jornadas de descobertas e
coletividade.
Com o fim da pandemia, nossa necessidade de
convivência pode nos levar por agradáveis caminhos rumo à reconexão com o
próximo. Excursões em grupo, por exemplo, podem estar no horizonte de muitos de
nós como uma forma de dividir essa maravilhosa sensação de estarmos novamente
no mundo. Tomaremos pelas mãos quem nos é caro e os levaremos para ver e
experimentar tudo aquilo de que fomos privados pelo vírus. Fomos todos
transformados pelo trauma e pelos inúmeros sacrifícios que precisaram ser
feitos em 2020 e 2021.
Não há como descolar nosso futuro dessas vivências
que foram, em maior ou menor grau, dolorosas para todos. São justamente elas,
portanto, que nos levarão a um novo estágio do nosso aprendizado enquanto seres
sociais e ávidos por explorar novas fronteiras físicas e metafóricas. Vacina no
braço, será hora de, descobrindo novos destinos e possibilidades, lado a lado
com quem nos fez tanta falta durante esses tempos, reencontrarmos aqueles que
somos de verdade.
Adonai Aires de Arruda
Filho - diretor da Serra Verde Express, da BWT Operadora,
da pousada Caraguatá, presidente da Associação Brasileira das Operadoras de
Trens Turísticos e Culturais (Abottc) e também diretor do Curitiba Região e
Litoral Convention & Visitors Bureau (CCVB), entidade que presidiu por dois
mandatos
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