Estigma dificulta
acesso até às questões básicas garantidas na constituição e forçam quem vive
com a doença à uma luta constante por suporte e melhor qualidade de vida
Entre cada cem pessoas, uma a duas tem epilepsia.
Estima-se que ao redor do mundo 50 milhões de pessoas têm epilepsia ativa, ou
seja, estão em tratamento ou tiveram crises no último ano. No Brasil, elas
enfrentam dificuldade em obter tratamento, diagnóstico e fármacos. No aspecto
social, ainda não são vistas, compreendidas ou reconhecidas, portanto não
possuem os direitos necessários para enfrentar, tanto dificuldades impostas
pela doença, quanto as grandes barreiras de atitude como o preconceito, que
constituem a desigualdade, a exclusão social e a falsa impressão de pessoas que
têm crises epiléticas são incapazes.
E quais são os direitos dessas pessoas? De acordo
com Regina Silva Alves de Lima, Assistente Social do Departamento de Neurologia
da UNIFESP e Terapeuta Familiar, os mesmos garantidos a todos os cidadãos do
país pela Constituição Federal de 1988 e outras leis nacionais. No entanto, há
necessidade de políticas públicas direcionadas para maior inclusão social, no
que tange ao ambiente escolar, mercado de trabalho e, acesso a atendimento
especializado e medicamentos específicos de quem vive com a doença: “É preciso
muito trabalho para o desenvolvimento de Leis que garantam os direitos das
pessoas com epilepsia, uma vez que existem dificuldades para a concessão de
benefícios diante da complexidade da legislação brasileira”, comenta.
O preconceito e estigma diante da doença são
universais. As crises não são permanentes, o que dificulta a legislar. Se a
pessoa for considerada incapacitada, devido a limitação de qualquer atividade
básica, como andar, falar, aprender, trabalhar, entre outros, poderá solicitar
um benefício assistencial ou um benefício previdenciário (auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez ou aposentadoria da pessoa com deficiência). Porém,
a concessão pelo INSS depende da avaliação dos
sintomas pela perícia médica.
Conforme a Assistente Social, por ser um problema
de saúde intermitente, que não é constante e nem visível, muitos profissionais
da área médica, responsáveis pela perícia, não compreendem a epilepsia,
desconhecem as questões psicossociais e as dificuldades vividas pelos
pacientes. Há falta de informação sobre os direitos existentes, a maneira de
acessá-los, como e quando a pessoa recorre a esses direitos: “Os benefícios da
previdência social não atendem a necessidade das pessoas com epilepsia, muito
embora é dito que todos os cidadãos têm direito a previdência social. Elas têm
dificuldades na sua aposentaria por invalidez, assim como ao benefício de
prestação continuada, o BPC, uma vez que elas não conseguem justificar a sua
incapacidade, que é decorrente do tipo de crise e dos riscos que ela traz”,
comenta.
SUS – Sistema único de Saúde e a pessoa com
epilepsia
A pessoa com epilepsia que necessita de
medicamentos que estão listados no protocolo clínico que contém as diretrizes
adotadas pelo SUS e divulgado pelo Ministério da Saúde tem o direito a receber
o tratamento de forma gratuita. Se a medicação não for encontrada no posto de
saúde, o paciente poderá fazer um pedido por escrito que será direcionado para
a Secretaria de Saúde do município, incluindo todas as informações que estão no
relatório médico, e explicando a necessidade e o que está ocorrendo.
Em último caso, poderá ser feito um pedido
judicial, com defensor público ou com um advogado, e apresentar os documentos
médicos e uma cópia da solicitação para a Secretária da Saúde. Ressaltando que
essa situação deve ocorrer depois da tentativa extrajudicial, que é mais rápida
e eficaz.
Outro ponto importante a destacar é sobre o
tratamento médico. Se o município de origem do paciente não fornecer o
tratamento, a pessoa com epilepsia poderá solicitar o Tratamento Fora de
Domicílio (TFD), que consiste em uma ajuda de custo ao paciente e, em alguns
casos, também ao acompanhante, encaminhados por ordem médica à unidade de saúde
de outro município ou Estado da Federação, quando esgotados todos os meios de
tratamento na localidade de residência do paciente. O TFD, fornecido pelo SUS,
destina-se a pacientes que necessitem de assistência médico-hospitalar cujo
procedimento seja considerado de alta e média complexidade eletiva.
Não existe conquista sem demanda social
As pessoas com epilepsia não estão na lista que a
legislação considera com deficiência física ou mental. Quem trabalha, estuda e
busca uma vida comum, se expõe a crises e sofre com preconceitos. No âmbito
profissional, podem ser demitidas com frequência ou ter dificuldade na
contratação. Os principais fatores que sustentam a resistência do empregador
são, medo de absenteísmo, medo de problemas legais decorrentes de acidentes de
trabalho, bem como receio que a imagem pública da empresa seja afetada.
Para Regina, em todas as instâncias está o
preconceito. Ela defende que é preciso união e empoderamento por parte das pessoas
com epilepsia: “Devido ao preconceito, as pessoas com epilepsia aprendem a
ficar dentro de casa, escondidas da exposição porque ter crises em público
podem implicar em muitas perdas: do trabalho; dos amigos, do seu ambiente
social [..] se necessário é preciso ir às ruas, nas assembleias e chamar a
atenção de políticos. Na medida que eles não enxergam essa demanda social tão
explícita, eles não investem em melhores condições para assistência de quem tem
epilepsia. Sem demanda social, não há ganhos de direitos, finaliza.
Sobre Associação Brasileira de Epilepsia
A ABE é uma Associação sem fins lucrativos que se
estabeleceu como organização para divulgar conhecimentos acerca dos tipos de
epilepsia, disposta a promover a melhora da qualidade de vida das pessoas
que convivem com a doença. Integra o International Bureau for Epilepsy e
é composta por pessoas que têm epilepsia, familiares, neurologistas,
nutricionistas, advogados, assistentes sociais, pesquisadores e outros
profissionais. Atua formando grupos de autoajuda, facilitando a reabilitação
profissional, lutando pelo fornecimento regular de medicamentos nos postos
de saúde e hospitais públicos, além de batalhar, incansavelmente, pelo
bem-estar das pessoas que convivem com a doença e pelo fim dos estigmas e
preconceitos sociais.
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