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segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Moedas digitais, moedas eletrônicas, moedas virtuais e criptomoedas: sinônimos ou termos com significado próprio?



É importante que os usuários compreendam algumas premissas de ordem técnica relativas aos conceitos de moedas digitas e moedas virtuais.
Não é raro nos depararmos com situações em que estes termos são equivocadamente equiparados ou utilizados de maneira fungível. Em tais situações, apesar de os termos moeda digital, moeda virtual e criptomoedas serem utilizados de forma intercambiável, demonstraremos que, em verdade, tais locuções não se confundem, razão pela qual devem ser corretamente individualizadas.

A compreensão destes termos fica mais didática quando tomamos por premissa o fato de que a relação existente entre tais expressões é de gênero-espécie-subespécie, tal como pontuado em relatório elaborado pelo FMI.

Com base na taxanomia das moedas virtuais delineada pelo Fundo Monetário Internacional, podemos afirmar que os termos moeda digital, moeda virtual e criptomoeda não são intercambiáveis e se relacionam da seguinte maneira:

Tabela 1
Gênero
Moedas Digitais
Espécie
Moedas Virtuais – não possuem lastro em moeda fiduciária. Possuem unidade de medida própria. Não possuem curso legal nem curso forçado. São centralizadas.
Moedas Eletrônicas – possuem lastro em moeda fiduciária de curso forçado. São uma “mera” representação eletrônica das moedas fiduciárias.
Subespécie
Criptomoedas – não possuem lastro em moeda fiduciária de curso forçado. Possuem unidade de medida própria. Não possuem curso legal nem curso forçado. São descentralizadas em sua maioria e baseadas em tecnologias de criptografia.


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A locução moeda digital possuiria um sentido amplo e com poucas restrições técnicas, de modo a englobar todas suas espécies e subespécies. Daí porque podemos afirmar que moeda digital é um tipo de ativo que proporciona, de diversas formas, a circulação de valor por meio eletrônico (de forma intangível) ou via internet.

Este valor pode ou não estar embasado em uma moeda fiduciária de curso forçado e, além disso, pode ou não ser transmitido por meio de um sistema descentralizado e criptografado, fazendo com que surjam as subclassificações moedas virtuais, moedas eletrônicas e criptomoedas.

As moedas virtuais são bens jurídicos móveis incorpóreos, nos termos do artigo 83, inciso III do Código Civil, que, ao lado das moedas eletrônicas, configuram espécie de moeda digital, podendo ser definidas como representações de valor em formato digital que: (i) são armazenadas e transacionadas eletronicamente; (ii) possuem denominação, forma, unidade de medida e valores próprios; (iii) não possuem lastro em moeda fiduciária nem em commodities de valor; (iv)  não possuem curso legal ou curso forçado; (v) não são emitidas por bancos centrais, instituições de créditos ou instituições que lidam com moedas eletrônicas, mas sim por entes privados; (vi) podem ser utilizadas como meio de troca, de pagamento ou, ainda, como investimento especulativo; e (vii) dentro de ambientes e comunidades específicas, podem funcionar como meio de troca, reserva de valor e unidade de medida.

As moedas virtuais já existiam “muito antes do aparecimento do atual sistema descentralizado de negociação de moedas”[1], sendo exemplos de moedas virtuais centralizadas: o e-gold, os créditos do Facebook e os pontos de programas de fidelidade para acumulação de milhas aéreas (frequent flyer programs)[2].

As moedas virtuais não se confundem com as moedas eletrônicas. No caso brasileiro, o inciso VI do artigo 6º da Lei nº 12.865/2013, define moeda eletrônica como sendo os “recursos armazenados em dispositivo ou sistema eletrônico que permitem ao usuário final efetuar transação de pagamento”.

No caso das moedas eletrônicas, portanto: (i) existe um emissor identificável da moeda eletrônica; e (ii) há um vínculo da moeda eletrônica com o sistema monetário tradicional (com as moedas fiduciárias), de modo que as moedas eletrônicas possuem a mesma unidade de medida que as moedas fiduciárias, características estas que não estão presentes nas moedas virtuais.

Tanto isso é verdade que o Banco Central do Brasil já teve a oportunidade de afirmar, no Comunicado nº 25.306/2014, que as “moedas virtuais não se confundem com a ‘moeda eletrônica’ de que tratam a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, e sua regulamentação infralegal”.

Em síntese, a diferença entre moedas virtuais e moedas eletrônicas reside no fato de que estas são denominadas em unidades de medida equivalentes às da moeda fiduciária, enquanto que as moedas virtuais possuem “forma própria de denominação, ou seja, são denominadas em unidade de conta distinta das moedas emitidas por governos soberanos”, consoante previsto no Comunicado nº 25.306/2014.

Restou demonstrado, até o presente momento, que as moedas virtuais não são equiparáveis às moedas eletrônicas.

Feito isso, devemos compreender em que medida o termo moeda virtual se relaciona com a locução criptomoeda. Nesse tocante, devemos fazer uma ressalva importante: existem diversas categorias de moedas virtuais.

As moedas virtuais podem possuir, a depender do seu fluxo de dados, ser fechadas, abertas ou híbridas. Caso exista uma autoridade central responsável pela moeda virtual, estaremos diante de uma moeda virtual centralizada. Caso contrário, inexistindo tal entidade, ter-se-á uma moeda virtual descentralizada.
Na tabela abaixo, são utilizados quatro critérios classificatórios para segregar as moedas virtuais. Esta classificação permite a depuração dos termos utilizados no presente trabalho e justifica o motivo pelo qual entendemos que tais conceitos (moedas virtuais e criptomoedas) não podem ser utilizados de forma intercambiável.

As moedas virtuais poderão ou não ser conversíveis em moedas fiduciárias. Além disso, a segurança do seu protocolo de funcionamento pode ou não estar embasada em criptografia.

As diferenças no desenho da estrutura e nas funcionalidades das moedas virtuais evidencia que existe uma infinidade de combinações possíveis. No caso das criptomoedas (subespécie de moeda virtual), podemos fizer que tais ativos são considerados moedas virtuais de abertas, descentralizadas, criptografadas e com fluxo de conversibilidade bidirecional.

Logo, “toda criptomoeda é uma moeda virtual (e, portanto, uma moeda digital), mas nem toda moeda virtual é uma criptomoeda”[3]. As criptomoedas são um meio de troca que não possui lastro em moedas fiduciárias, daí porque podemos afirmar que toda criptomoeda é uma moeda digital e moeda virtual, mas nem toda moeda digital e moeda virtual será enquadrada como uma criptomoeda.

Diante de todo quanto exposto, pontuadas as distinções existentes entre moedas digitais, moedas virtuais e criptomoedas, bem como tendo sido estabelecida a premissa de que tais ativos possuem verdadeira relação de “gênero-espécie-subespécie”, respectivamente, podemos afirmar, de forma categórica, que as criptomoedas – cujo maior exemplo são os bitcoins – são uma subespécie de moeda virtual aberta (ou universal), descentralizada, criptografada e de conversibilidade bidirecional.





Daniel de Paiva Gomes – Sócio de Vieira, Drigo e Vasconcellos Advogados. Professor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Mestre em Direito Tributário (FGV Direito/SP). Especialista em Direito Tributário Internacional (IBDT) e em Direito Tributário Brasileiro (PUC-COGEAE).

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