Durante boa parte de nossa história, o
serviço público e a política foram os destinos principais de quem buscasse uma
feliz combinação de sustento familiar e relevo social. Mães zelosas
ambicionavam ver os filhos empregados no setor público ou numa empresa estatal.
Passaram-se os anos, o Estado brasileiro
cresceu e sua burocracia se sofisticou. Às centenas, surgiram empresas públicas
e se multiplicaram os ministérios, as secretarias, os departamentos. Miríade de
novos municípios, conforme iam sendo criados, reproduziam essa expansão na base
da pirâmide do poder político. Todo o organismo estatal se agigantou, num
fenômeno que lembra a divisão celular por mitose e meiose. Concursos públicos e
cargos de confiança proveram novas, crescentes e permanentes possibilidades de
acesso a vagas em posições detentoras do privilégio da estabilidade.
O serviço público se manteve, através
das décadas, como um lugar que permitia a sobrevivência digna, sob proteção de
regras que concediam segurança e remuneração por vezes acima do mercado de
trabalho no setor privado da economia.
Há mais de 40 anos, porém, luzes
vermelhas começaram a sinalizar a gradual aproximação de severas dificuldades.
Os ombros dos carregadores não iriam suportar o peso daquele andor. A atividade
se tornara campo fértil para atuação de grupos em que a demagogia política de
uns turbinava a voracidade corporativa de outros. A conta cada vez mais salgada
das folhas de ativos, inativos e pensionistas foi reduzindo drasticamente a
capacidade de pagamento e de investimento do setor público. A qualidade foi
sumindo dos serviços prestados, as instalações se degradando e os vencimentos
perdendo poder de compra. O problema aqui descrito passou a afetar a União, os
estados e os municípios.
Durante
longos anos, porém, enquanto essa realidade tolhia os governos, a autonomia dos
poderes permitiu que o custo da crise fosse circunscrito ao executivo. Os
demais conseguiram preservar dedos e anéis.
Nestes dias, contemplamos o fim de um
ciclo. Três anos de recessão e mais dois de baixíssimo crescimento do PIB
completaram o estrago. Acabou. Medidas duríssimas já vêm sendo adotadas e
precisarão ser ampliadas para pôr fim à crise fiscal e para que se restaure a
confiança e a capacidade de investimento do setor privado e do setor
público.
Então, com a experiência de quem
trabalha há 55 anos, tendo atuado nos dois lados desse balcão, constato que o
futuro do emprego público é nada promissor, fora (e assim mesmo, talvez) de
algumas limitadas e disputadíssimas carreiras de Estado.
Bem ao contrário do que hoje acontece
como orientação pedagógica, é importante despertar, nos jovens, interesse por
atividades produtivas e estimulá-los a buscar o merecimento indispensável à
competitividade. Desenvolver a mente e o espírito, aderir a valores perenes,
adquirir hábitos de leitura e de estudo continuado e fazer de si mesmo o melhor
possível será sempre um caminho virtuoso de inserção ativa nas complexidades da
vida social, política e econômica. Em meio a elas, não convém a dispersão
proporcionada pelas facilidades, nem o esmorecimento sugerido pelas
dificuldades. O futuro, ou estará no setor privado da Economia, ou será um
estuário de maus pressentimentos.
A experiência dos povos ensina que a
crise pela qual estamos atravessando é parteira de novas e melhores
possibilidades. E essa é a boa notícia que tenho a dar.
*Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil. integrante do grupo Pensar+.
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