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quinta-feira, 7 de junho de 2018

Já é hora de encontrarmos uma alternativa para as greves


Importante instrumento para a conquista de direitos da sociedade nos séculos XIX e XX deve ser repensado para os dias de hoje


Recentemente, o assunto greve ganhou importância nas rodas de conversa dos brasileiros, já que duas recentes paralisações tiveram destaque na mídia. Primeiro, a de professores, que tomou conta de São Paulo e outras cidades do Brasil, depois a dos caminhoneiros, que afetou muitos pontos de todo o País. Esses dois exemplos devem nos fazer refletir sobre esse instrumento de manifestação, e se ele é o melhor caminho para que diferentes categorias detenham e defendam seus direitos.

Mas, antes, é preciso entender a origem da greve da forma que a vemos na Era Moderna. No século XVII, na França, existia um local que reunia operários em busca de atividades, a Place de la Grève. Eles ficavam parados, sem trabalho, esperando que um empregador fosse até aquela região e recrutasse quem achasse melhor para a jornada. No século XIX, a praça e a palavra “greve” ganharam uma nova conotação, tanto pela movimentação de trabalhadores que começaram a lutar contra as más condições em que trabalhavam como pelo desenvolvimento do capitalismo. Por um lado, houve um liberalismo econômico, um acúmulo muito grande de riquezas nas mãos de uma minoria, que provinha do trabalho. Por outro, havia também neste ambiente a exploração desses empregadores sobre os trabalhadores, resultando nesse conflito entre capital e trabalho. 

Esse tipo de movimento começou a ganhar cada vez mais espaço na Europa do século XIX, quando aconteceram várias paralisações grandes e significativas. Um exemplo é a Comuna de Paris, em 1871, que lutava pelos direitos dos trabalhadores. E, tudo isso, sem entrar na discussão histórica e econômica, mas é importante ressaltar que as próprias leis do país deram direito à greve.


Mas a greve é o melhor instrumento para o século XXI?

Ao analisarmos essa ferramenta do século XIX para exigir direitos no século XXI, notamos que ela precisa ser revista, pois traz consequências multifacetadas, prejuízos, pressão social e desarmonia na sociedade.

Dependendo dos sindicatos e dos países em que as paralisações acontecem, essas greves podem se mobilizar de tal forma que conseguem obter vitórias exageradas ou injustas. E podem até dificultar que outras categorias menores sejam escutadas, mesmo que tenham causas mais justas, corretas e apropriadas. Então, há nesse instrumento uma ação política do movimento sindical, que acaba por afastar o tema primário da discussão entre trabalhador e empregador.

Não que os direitos e deveres não devam ser debatidos, não que cada categoria não deva lutar pela sua posição respeitosa dentro da sociedade humana, mas, atualmente, assistimos e testemunhamos uma greve que relativiza o pleito. 

Por exemplo, no caso das escolas, embora todas a discussões levantadas sejam importantes para a categoria, a greve não parece ser o melhor caminho e pode trazer consequências futuras negativas. Uma passagem talmúdica diz que a cidade de Jerusalém foi destruída pelos romanos porque as instituições de ensino pararam de funcionar, porque os professores pararam de lecionar. Obviamente, essa não foi a razão, mas os sábios de Israel quiseram deixar claro que abandonar a educação é destruir sua própria cidade e sua cultura.


Uma alternativa para a greve

Na literatura judaica encontramos um outro caminho. Nela, todas as discussões entre empregadores e trabalhadores devem ser referendadas em um tribunal de justiça. Mesmo que a greve seja necessária, ela precisa ser autorizada antes, porque é preciso que a sociedade não seja afetada no seu dia a dia e que a discussão que está em litígio, entre empregado e empregador, seja feita de forma civilizada nos fóruns.

Claro que, para isso, é preciso que os tribunais sejam mais ágeis e se debrucem sobre esses conflitos. Que a greve seja trabalhada à luz da justiça e que sejam feitas discussões nesses ambientes, para que não parem um país, não afetem uma sociedade e que a grande pressão não leve a conclusões equivocadas.

Então, de forma análoga, a greve é como um pai que atende seu filho quando ele chora. Toda vez que a criança abre o berreiro, recebe a atenção do progenitor, mas tudo poderia ser resolvido por meio de uma conversa, respeitando necessidades, direitos e deveres de ambos. E, no caso da sociedade, esse diálogo seria mediado e julgado de forma conclusiva nos tribunais de justiça. Devemos rever, e até abandonar, esse instrumento que foi importante no século XIX e em boa parte do século XX, mas se tornou inadequado, obsoleto e que potencializa cada vez mais uma polarização, quando na verdade precisamos ter outras leituras para o futuro da humanidade e o bem-estar de todos.





Rabino Samy Pinto - formado em Ciências Econômicas, se especializou em educação em Israel, na Universidade Bar-llan, mas foi no Brasil que concluiu seu mestrado e doutorado em Letras e Filosofia, pela Universidade de São Paulo (USP). Foi diretor do Colégio Iavne, por 22 anos. O Rav. Samy Pinto ainda é diplomado Rabino pelo Rabinato chefe de Israel, em Jerusalém, e hoje é o responsável pela sinagoga Ohel Yaacov, situada no Jardins também conhecida como sinagoga da Abolição.

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