Liberada para uso fora do
ambiente de pesquisa, a redução de estômago por endoscopia se mostra uma opção
mais segura e menos invasiva
Apenas quatro meses após a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovar a utilização do fio
de sutura usado na gastroplastia endoscópica (GPE), cerca de 300 cirurgias já
foram realizadas na rede privada com o novo procedimento para redução do
estômago, conforme levantamento do Instituto Mineiro de Obesidade (IMO). Em
novembro de 2016, a agência havia aprovado a utilização do aparelho conhecido
como Apollo Oversticth, principal componente para o procedimento, mas, sem a
liberação do fio de sutura, somente agora a rede privada obteve condições para
adotar a nova técnica. Em novembro de 2017, o procedimento foi também
reconhecido pelo CRM-SP, pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e
Metabólica - SBCBM, e pela Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva SOBED.
Entre os principais ganhos
A GPE utiliza orifícios
naturais, boca e esôfago, para chegar ao estômago do paciente, e emprega um
endoscópio equipado com aparelho de sutura. O cirurgião sutura o estômago a
partir de marcações padronizadas para diminuir o tamanho desse órgão. A volume
total pode ser reduzido entre 70% a 80%.
Apesar de a GPE não ser
indicada para tratamento de todos os tipos de obesidade, tem sido apontada por
médicos especialistas como uma grande evolução no tratamento da doença, por ser
muito menos invasiva que a cirurgia por videolaparoscopia, que já era
considerada minimamente invasiva.
Nos Estados Unidos, onde o
procedimento foi criado, um estudo desenvolvido por um grupo de médicos na
Cornell University, acompanhou 248 pacientes de obesidade tratados com a
gastroplastia endoscópica, entre 2013 e 2015. Os pesquisadores concluíram que a
GPE efetivamente induz a perda de peso em até 24 meses em pacientes com
obesidade moderada.
Em Belo Horizonte, o cirurgião
Dr. Leonardo Salles, especializado em tratamentos contra obesidade, acredita
que a gastroplastia dará maior acesso a esse tipo de terapêutica contra
obesidade: “A cirurgia bariátrica é excelente, mas não consegue tratar a
obesidade em nível populacional. Menos de 1% da população obesa consegue acesso
à cirurgia”. De acordo com ele, o procedimento já é mais barato que a cirurgia
bariátrica quando criada: “Esse 1% de pacientes atendidos pode chegar a 20%”,
acredita.
Recuperação quase imediata
O que tem mais chamado a
atenção sobre a GPE – que para muitos médicos nem deveria ser considerada uma
cirurgia por não haver cortes – é a rápida recuperação e menor risco de
complicações, “uma verdadeira evolução”, segundo especialistas da área. Nos
primórdios da cirurgia bariátrica, com o primeiro tipo de cirurgia, era
necessário um corte de até 20 centímetros no paciente, resultando em grande
possibilidade de infecção, com tempo de recuperação entre 30 e 60 dias. “O
pós-operatório era tão difícil que víamos na cara do paciente o arrependimento.
A dor era intensa, sendo imprescindível muita morfina”, conta.
Já na cirurgia por videolaparoscopia reduziu-se o tempo para
cerca de 15 dias com a substituição do corte por pequenos furos na região
abdominal. Já na nova técnica, realizada entre 50 e 60 minutos, o paciente
volta às atividades mais rapidamente: “É uma plástica no estômago feita de
dentro para fora, ao invés de fora para dentro. O paciente toma medicação para
dor no primeiro dia e volta às atividades normalmente. De 3 a 5 dias já volta a
fazer atividades físicas. É um novo salto em termos de qualidade
pós-operatório”, explica o médico.
Em relação à alimentação, é
igual aos outros procedimentos:15 dias com dieta líquida, 15 dias com a
pastosa; e depois a dieta de reeducação alimentar indicada por um
nutricionista. Como resultado, segundo o cirurgião, o paciente deverá perder
cerca de 6 a 8% do peso no primeiro mês, de 4 a 6% no segundo mês, e de 20 a
30% em um ano.
Em quatro meses o médico operou
15 pacientes, o que corresponde a 90% do total de cirurgias realizadas no
local. A maior parte são mulheres, apenas dois são homens, com média de faixa
etária nos 40 anos. Ele conta que os pacientes operados com a técnica no IMO
têm conseguido excelentes resultados. “Um dos pacientes, com 107 kg, apresentou
já no primeiro mês 17% de emagrecimento”, e uma média entre os pacientes de
9,37% já no primeiro mês, diz.
Menor perda de nutrientes
Embora ainda não existam
estudos que comprovem, os especialistas da área acreditam que na nova técnica a
perda de nutrientes e vitaminas pode ser muito menor, por não haver perda
efetiva do tecido do estômago. “Apesar de não mais receber alimentos para
digestão, a parte suturada não é retirada e, por isso, continua em
funcionamento produzindo suco gástrico. Só reduz o tamanho do espaço para
armazenamento do alimento ingerido, ao contrário da laparoscopia em que a parte
excedente do estômago é retirada.
Como a produção de suco gástrico continua,
esse suco migra para onde o alimento está, contribuindo com a digestão e,
possivelmente, reduzindo a deficiência de ferro e de cálcio”, explica.
Apenas uma ponte para
tratamento da obesidade
Apesar de todos os benefícios, o médico alerta que o novo procedimento
é apenas um passo no tratamento da obesidade, ao contribuir com uma janela
terapêutica de perda de peso. “A gente deixa muito claro que qualquer
procedimento é uma ponte para tratamento da obesidade. Tratar peso é tratar o
sintoma, mas é o tratamento multidisciplinar que irá tratar a base do problema.
Gosto muito de comparar ao tratamento de uma pneumonia, onde o paciente vai ter
como sintoma a febre; você pode usar uma dipirona e tratar o “sintoma” febre
dele, se não der um antibiótico para tratar a “causa”, o problema vai
continuar. É o mesmo quando tratamos a obesidade, com o procedimento tratamos o
“sintoma” peso, mas é com o tratamento multidisciplinar que tratamos a “causa”
do problema, trabalhando sedentarismo, má educação alimentar, distúrbios
psicológicos que levam ao descontrole do peso, assim como causa metabólicas. A
gastroplastia dá uma janela terapêutica de emagrecimento, que vai deixar o
paciente magro por um tempo, funcionando como catalizador para o tratamento
multidisciplinar da obesidade. Se tratou a base ótimo, se não, o peso vai
voltar”, enfatiza.
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