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sexta-feira, 25 de julho de 2025

Equilíbrio imunológico é essencial para uma gestação saudável, alertam especialistas

Sistema de defesa da mãe precisa proteger contra infecções e, ao mesmo tempo, tolerar o feto; falhas nesse equilíbrio podem causar complicações como abortos e parto prematuro

 

Durante a gestação, o corpo da mulher passa por uma série de transformações hormonais, metabólicas e imunológicas. Uma das mais importantes, e menos conhecidas, é a modulação do sistema imunológico para permitir que o organismo da mãe aceite o embrião — que, apesar de ser gerado por ela, carrega material genético do pai e, portanto, é parcialmente "estranho" ao corpo materno. Manter esse equilíbrio é um verdadeiro desafio biológico e, quando falha, pode levar a complicações como abortos de repetição, pré-eclâmpsia, parto prematuro ou insucesso em tratamentos de fertilização. 

“A gestação é um estado de imunidade ajustada, e não de imunossupressão completa. O sistema imune precisa continuar defendendo o corpo da mãe contra infecções, mas sem reagir contra o embrião em desenvolvimento”, explica a Dra. Klissia Pires, ginecologista e membro da AMCR (Associação Mulher, Ciência e Reprodução Humana do Brasil). “Esse processo envolve um sofisticado jogo entre células que produzem substâncias pró-inflamatórias e células que produzem substâncias reguladoras, especialmente as células T reguladoras, que ajudam o organismo materno a tolerar a presença do feto.” 

Logo nas primeiras semanas de gravidez, o sistema imunológico materno contribui para a implantação do embrião e para a formação de uma placenta saudável. A própria placenta atua como uma barreira imunológica parcial, liberando substâncias que controlam inflamações excessivas. No entanto, esse mecanismo pode ser impactado por diversos fatores, como doenças autoimunes, distúrbios de coagulação e até mesmo a idade da gestante. 

Um dos exemplos mais relevantes é a Síndrome dos Anticorpos Antifosfolípides (SAF), uma forma adquirida de trombofilia que tem origem autoimune. Nessa condição, o sistema imune da mulher produz anticorpos que atacam estruturas como fosfolípides ou proteínas ligadas à placenta, aumentando o risco de trombose, restrição de crescimento fetal, perdas gestacionais em diferentes trimestres e descolamento prematuro da placenta. “A SAF é um dos fatores mais desafiadores quando falamos em reprodução. Mesmo em gestações aparentemente saudáveis, ela pode causar complicações graves se não for identificada e tratada adequadamente”, afirma a Dra. Klissia. 

Outro fator que interfere diretamente na resposta imunológica é a idade materna. Mulheres com mais de 35 anos tendem a apresentar um fenômeno chamado imunossenescência, que é o envelhecimento natural do sistema imunológico. “Com a idade, há uma redução na eficiência das células reguladoras e um aumento na inflamação basal do organismo, o que chamamos de ‘inflammaging’. Esse ambiente pode dificultar a implantação embrionária e favorecer rejeições imunológicas precoces”, explica a médica. 

A rejeição do embrião pelo sistema imunológico da mãe, embora diferente da rejeição de um órgão transplantado, também pode ocorrer. Isso acontece principalmente por falhas no desenvolvimento da tolerância imunológica, o que compromete processos-chave como a implantação e a manutenção da gravidez nos estágios iniciais. A produção de anticorpos contra estruturas da gestação, como o trofoblasto, é uma das manifestações desse desequilíbrio. 

Para muitas mulheres que enfrentam dificuldades para engravidar ou manter a gestação, investigar a saúde imunológica pode ser um passo importante. “Hoje sabemos que uma parte significativa dos casos de aborto de repetição ou falhas de FIV (fertilização in vitro) está relacionada a alterações imunológicas, que muitas vezes passam despercebidas nos exames de rotina”, destaca a Dra. Klissia Pires. 

A boa notícia é que a medicina reprodutiva já dispõe de exames e abordagens terapêuticas para avaliar e tratar essas disfunções. “Com o avanço da ciência e o maior conhecimento sobre imunologia da reprodução, conseguimos oferecer alternativas mais seguras e eficazes para mulheres que antes não tinham explicações claras para suas perdas gestacionais”, conclui a especialista da AMCR.

 

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