Especialista ressalta que, apesar do impacto emocional provocado pelo diagnóstico, com acompanhamento profissional é possível reconhecer sentimentos e encontrar forças para enfrentar a jornada
Um diagnóstico oncológico, independentemente da gravidade, costuma impactar emocionalmente a vida de quem recebe essa informação. É nesse momento que os pacientes confrontam-se com a possibilidade de uma doença potencialmente fatal. Por isso, durante o primeiro mês do ano, a campanha Janeiro Branco reforça a ideia de que cuidar da saúde mental é essencial para o indivíduo reconhecer, validar e tratar esse sofrimento, a fim de encontrar esperança e determinação ao longo de toda a sua jornada.
Uma história relatada por uma paciente da psico-oncologista Natalia Baratta Gil, da Oncoclínicas Rio de Janeiro, ajuda a entender como podem ser fortes as emoções experimentadas por quem está em tratamento de câncer.
"Em uma ida ao mercado, para fazer uma compra do cotidiano, ela pegou um frasco de canela em pó que tinha uma validade determinada. Isso gerou uma crise de choro por não saber se duraria mais do que aquele produto. A mulher comprou a canela e, quando passou o prazo, e estava viva, ela estourou um champanhe para comemorar. Isso ocorre porque o diagnóstico ainda está muito associado à morte, ao sofrimento", conta a profissional.
A sensação de luto, geralmente associada à morte, pode ser comum entre os diagnosticados com câncer, principalmente no que diz respeito às perdas relacionadas a situações vitais, como a fragilidade da saúde. No entanto, o fato de alguém ter medo não impede o surgimento de pensamentos positivos e da esperança. E a saúde mental passa por essa regulação emocional.
Natalia explica que vão existir períodos de maior vulnerabilidade, muitas vezes, próximos a exames e à mudança de um protocolo, momentos que precisam ser avaliados por profissionais. A preocupação com o futuro, a relação com o sono, o papel social e, inclusive, a instabilidade financeira vão afetar o indivíduo. No entanto, o repertório emocional que o paciente adquire ao longo da vida será fundamental para a estabilidade da sua saúde mental.
“Se nos momentos em que me deparo com uma adversidade, como uma doença, se eu sou proativa, esse é o meu recurso de enfrentamento, a forma como vou me colocar. Se sou mais quietinha, também vou reagir assim, porque é como lido com as emoções. Por esse motivo, mais do que estabelecer o que é certo ou não, é identificar como cada um vai reagir. E o profissional da psicologia é quem faz essa avaliação. É preciso saber, por exemplo, quais serão minhas redes de suporte, instrumental e afetiva. Tudo isso conta”, explica Natalia.
De acordo com a especialista, atualmente há muita informação sobre saúde em circulação, e as pessoas se esquecem que adoecer também faz parte da vida. E esse costuma ser o primeiro impacto após o diagnóstico: a perda emocional de um mundo presumido. Quem achava que tinha tudo sob controle, de repente, perde as rédeas do próprio corpo. E muitas vezes isso ocorre sem que haja um sintoma, ou seja, o paciente não se sente doente.
"São tempos emocionais
diferentes. E isso é comum na oncologia, porque o sofrimento causado segue num
contínuo, no diagnóstico, no tratamento. Depois, a cada período de exames esse
medo é reativado, vem a preocupação se tudo continuará bem. Se eu estiver
saudável, ufa, ganhei uma nova sensação de que está tudo sob controle",
relata a psicóloga.
‘Saúde mental está ligada à capacidade de percepção’
Para que os pacientes entendam o que é a saúde mental, Natalia alerta que não tem a ver com pensamento positivo nem felicidade, mas com o que, na psicologia, é chamado de coping, que são as estratégias de enfrentamento, como a pessoa se coloca diante do fato, a quem ela pede ajuda. Está relacionado com a cognição do ser humano, como ele se reconhece, com a capacidade de fazer boas escolhas e estabelecer relações. Tudo isso impacta, e cada experiência é única.
"A saúde mental está
ligada à percepção, às conexões, aos meus relacionamentos positivos. Saber quem
me faz bem, quem eu quero perto de mim nesse momento de fragilidade. Pertenço a
algum lugar? Igreja, família, escola, meu time de pelada. Tem a ver ainda com
lidar com o estresse, saber me adaptar. Sou flexível para reagir às mudanças
que a doença e o tratamento impõem? Posso adotar novas ideias, novos hábitos,
fazer escolhas complexas? Se não estiver bem, não vou escolher o melhor”,
reforça a especialista.
‘Ninguém escolhe ficar triste’
Natalia explica que o primeiro passo para quem busca equilíbrio da saúde mental é reconhecer e validar seus sentimentos, pois ninguém escolhe ficar triste. Ela alerta que o paciente não pode ser culpado por seu adoecimento.
"Se eu reconheço e valido o meu sentimento, entendo que posso estar muito preocupado e triste, mas preciso me tratar. É o que vamos chamar na psicologia de um processo dual. Assim, vou tentando me restaurar e me reconstruir enquanto pessoa. É o que a gente falava na pandemia sobre o novo normal. Dessa forma, saímos do que é melhor ou pior, do certo e do errado, para quem eu era e quem eu sou agora", explica Natalia.
Acompanhamento profissional auxilia pacientes durante a jornada
O acompanhamento profissional vai auxiliar o paciente nesse processo, ajudá-lo, por exemplo, a superar o bloqueio emocional do diagnóstico e a enfrentar o medo, a angústia e a incerteza. O psico-oncologista contribui para a melhoria da qualidade de vida desse indivíduo ao dar suporte para que elabore seus pensamentos e emoções.
Também caberá ao psicólogo apoiar no manejo da dor e do estresse associados ao câncer e na tomada de decisões, além de preparar o paciente para procedimentos invasivos dolorosos. Se necessário, é ele quem vai acompanhá-lo no retorno à rotina profissional, familiar e social ou até mesmo para o fim da vida. Estar preparado emocionalmente é fundamental nessa jornada.
“Saúde mental é isso, se
conectar à nossa funcionalidade e às escolhas saudáveis, para aprender a lidar
com esse dia a dia que o tratamento exige", conclui Natalia.
Oncoclínicas&Co
www.grupooncoclinicas.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário