De acordo com psicóloga Gislene Erbs, falar sobre o assunto de forma natural é a maneira mais eficaz de criar um ambiente mais acolhedor e informado sobre saúde mental e prevenção ao suicídio
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), mais
de 700 mil pessoas no mundo todo morrem por ano devido ao suicídio. Na grande
maioria dos casos, a falta de conhecimento ou o preconceito com relação ao tema
é determinante para esse resultado. Nesse sentido surgiu a iniciativa
brasileira do Setembro Amarelo, campanha para conscientizar a população sobre a
importância da prevenção do suicídio e transtornos mentais que podem ser sua
causa.
A psicóloga e autora do livro “Sim ou Não – A
difícil arte de colocar-se em primeiro lugar na sua vida”, Gislene Erbs,
comenta como o estigma associado a transtornos mentais contribui para que
pessoas cometam suicídio, isto porque o medo de estarem doentes gera um
desconforto, que pode piorar o quadro e até gerar a desistência do tratamento.
“É comum as pessoas não saberem o motivo de estarem com dificuldades e
transtornos. Quando entendem que estão doentes, o preconceito que sentem em
relação a isso só piora o quadro, porque tendem a negar a doença”, diz.
Gislene explica que a psiquiatria é uma área da
medicina e tem entre outras funções o tratamento por meio de medicação na
reorganização fisiológica. Já a psicologia está relacionada à compreensão das
dificuldades e à reorganização dos pensamentos e comportamentos.
A psicóloga destaca a importância da disseminação
do conhecimento a respeito do tema para fazer com que mais pessoas busquem
tratamento e melhorem sua condição. Conforme Gislene, falar sobre o assunto de
forma natural é a maneira mais eficaz de criar um ambiente mais acolhedor e
informado sobre saúde mental e prevenção ao suicídio. “Pessoas que já sofreram
de alguma maneira com relação a isso deveriam relatar suas experiências, pois
isso mostra que existe tratamento e melhora e desmistifica a doença mental, que
ainda é vista como 'loucura' e um caso isolado”, afirma.
Além disso, segundo a psicóloga, campanhas como
Setembro Amarelo e matérias jornalísticas abordando de maneira responsável o
assunto são de grande ajuda para diminuir o preconceito e aumentar o
conhecimento sobre os sintomas.
No que se refere ao papel dos governos para ajudar
a prevenir o suicídio, Gislene afirma que mais acesso e agilidade no
diagnóstico e tratamento das doenças psicológicas nas redes públicas são
imprescindíveis. “A demora para as consultas e retorno com especialistas
compromete a vida das pessoas que trabalham e necessitam ir várias vezes aos postos
de saúde para conseguir uma única consulta”, diz.
Possíveis causas, sintomas e
prevenção
São diversas as causas relacionadas aos transtornos
mentais, desde fatores genéticos, psicológicos a nutricionais. Gislene
aponta a forma como a sociedade atual está estruturada como um dos aspectos
causadores. Conforme a psicóloga, a velocidade e instantaneidade proporcionada
pelas tecnologias existentes vem deixando o cérebro humano em estado de alerta,
gerando nas pessoas sentimento de culpa, de insuficiência e de incapacidade,
por não conseguirem atender a todas as demandas do dia a dia.
Gislene explica que este sentimento surge porque,
diante da instantaneidade da comunicação e da rapidez e acúmulo das
informações, as pessoas sentem a necessidade de estarem inteiradas o tempo todo
sobre todas as coisas, seja no que diz respeito a aspectos da profissão, vida
pessoal e até com relação às interações sociais. “Como é impossível acompanhar
tudo, elas acabam por se sentirem inúteis, incompetentes e ineficientes, o que
faz com que fiquem estressadas e ansiosas” diz.
Essas sensações despertadas por falharem no intuito
de se manterem atualizadas a qualquer custo, explica a psicóloga, contribuem
também para complicar a situação de pessoas depressivas, muitas vezes dando o
gatilho para que cometam suicídio. “Isto porque em algumas ocasiões as atitudes
suicidas não são premeditadas, mas tomadas por impulso, motivadas por um
desespero momentâneo”, explica.
Já o uso excessivo das redes sociais e dos
aparelhos eletrônicos, comenta Gislene, faz com que crianças, adolescentes e
adultos se sintam mais solitários, o que aumenta as chances de desenvolverem
transtornos mentais. A vida mostrada nas redes, comenta a psicóloga, é, na
maioria das vezes, feliz, agitada, repleta de compromissos. “Ao verem que isso
não está acontecendo com elas, as pessoas, principalmente jovens, tendem a
aumentar o sentimento de falta e solidão”, explica.
Dessa forma, ressalta Gislene, o principal desafio
da sociedade contemporânea é saber equilibrar a velocidade das informações com
a saúde, o conhecimento profissional, habilidades sociais e os vínculos
afetivos. “Todos somos responsáveis e temos de aprender a lidar com as novas
demandas sem perder o foco na saúde”, declara.
Nesse sentido, a psicóloga sugere algumas ações
preventivas que podemos incorporar no dia a dia visando promover e manter a boa
saúde mental. De acordo com Gislene, com o objetivo de não sermos atropelados
pelos afazeres cotidianos, evitando dessa forma, nos sentirmos impotentes,
cansados e tristes, devemos estabelecer uma organização do tempo, das
necessidades básicas, das metas e objetivos, separando um período do dia para
descansarmos física e mentalmente, confraternizarmos com amigos e familiares,
estudarmos e praticarmos o autoconhecimento.
Conforme a psicóloga, amigos e familiares são
importantíssimos para prevenir o desenvolvimento de doenças mentais e para
auxiliarem as pessoas que estiverem passando por dificuldades nesse sentido. O
auxílio será mais eficaz, contudo, ressalta Gislene, se vier desprovido de
julgamentos e conselhos. “Saber ouvir sem criticar ou responsabilizar é
fundamental. Não há nada pior para quem está doente do que ouvir 'tudo depende
de você'. Além de não ser verdade, o comentário só gera mais culpa e cobrança e
contribui para o agravamento do quadro”, diz.
Para quem desconfia que está sofrendo de algum tipo
de transtorno emocional, Gislene destaca alguns sintomas comuns que devem ser
motivo atenção, tais como: insônia, tristeza, angústia, pensamento lento,
dificuldade em tomar decisões, perda de interesse em atividade que antes eram
prazerosas, irritação ou impaciência. A psicóloga ressalta, porém, que a intensidade
dos sintomas é que definirá se a pessoa realmente está com algum problema ou
não. Para isso, é de suma importância o auxílio de um profissional
especializado: psicólogo ou psiquiatra, pois é ele que irá verificar o que
realmente está acontecendo. “Quanto antes a pessoa buscar ajuda, mais rápido e
mais simples será o tratamento da doença”, comenta.
Quanto a sinais e sintomas de pessoas em risco de
suicídio, a psicóloga destaca que os mais evidentes, mas não tão comentados,
são: revolta ou sentimento de injustiça, medo de ser rejeitado, de não ser
compreendido, de ser ignorado e deixado de lado, sentimento de inutilidade e
desesperança de mudança.
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