Artigo destaca que o Brasil é o país do mundo com maior sucesso na utilização de biofertilizantes para prover nitrogênio na soja. Introdução de microrganismos no solo garante maior produtividade, reduz a emissão de gases do efeito estufa e, estima-se, gera uma economia de US$ 10 bilhões por ano (foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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Com 80% da área plantada fazendo uso
de biofertilizantes, a soja brasileira mostra o impacto ambiental e econômico
da substituição de adubo químico pelo que os cientistas chamam de microbioma. A
estratégia consiste no efeito conjunto de fungos, bactérias e outros
microrganismos em prover os nutrientes necessários às plantas, garantindo maior
produtividade nas lavouras, além, é claro, de ganhos econômicos e ambientais.
O caso da soja brasileira é um dos 14
destacados em artigo publicado na revista Frontiers in Microbiology sobre
o impacto da pesquisa em microbioma nos diferentes setores da economia, como a
agricultura, em produtos fermentados e na saúde humana. A iniciativa faz parte
do MicrobiomeSupport, programa patrocinado pelo Horizon 2020 da União Europeia
que envolve pesquisadores e empresas de 28 países, entre eles o Genomics for Climate Change Research Center (GCCRC), um dos Centros de Pesquisa
em Engenharia (CPE) apoiados
pela FAPESP em parceria com a Embrapa.
“O Brasil é um dos poucos países do
mundo a obter sucesso na utilização de biofertilizantes na soja. O país é o
maior produtor e exportador da commodity e,
atualmente, 80% da área plantada de soja utiliza microrganismos para fixar o
nitrogênio. Isso tem um impacto ambiental positivo muito grande. Estima-se que
430 milhões de toneladas de CO2 equivalente não sejam lançados na atmosfera por
conta do uso das bactérias fixadoras de nitrogênio. Há ainda a proteção de
mananciais, pois o nitrogênio químico tende a contaminar os rios”, afirma
Rafael de Souza, pesquisador associado do GCCRC e um dos autores do artigo.
Souza é cofundador da Symbiomics, startup brasileira de biotecnologia focada no
desenvolvimento de biológicos de nova geração.
Na parte
econômica, o impacto do uso de microrganismos do solo também é grande. “A
guerra na Ucrânia mostrou a forte dependência que temos pela importação de
fertilizantes químicos. O Brasil importa aproximadamente 77% do fertilizante
nitrogenado utilizado nas culturas agrícolas. A soja é a única exceção. Ela não
depende dessa importação justamente por conta dos fixadores biológicos de
nitrogênio, o que gera uma economia de aproximadamente US$ 10 bilhões em
fertilizante nitrogenado” afirma o pesquisador.
Os
biofertilizantes trazem uma economia enorme para o agricultor. De acordo com
Solon Cordeiro de Araujo, consultor da Associação Nacional dos Produtores e
Importadores de Inoculantes (ANPII) e coautor do estudo, enquanto o
fertilizante químico custa em torno de R$ 1.000,00 por hectare, o inoculante
(produto que leva o microrganismo) custa menos de R$ 50,00 por hectare. “O
trabalho realizado no caso da soja foi selecionar determinadas bactérias,
isolá-las e aplicá-las na lavoura, de modo a incrementar a quantidade desses
microrganismos benéficos no solo. Com isso, as bactérias substituem o
fertilizante nitrogenado. Portanto, em vez de fornecer via produto sintético
[químico], os agricultores utilizam o biofertilizante, denominado inoculante,
que aproveita o nitrogênio do ar e fornece o nutriente diretamente para a
planta”, explica Araujo.
O impacto
é particularmente importante, considerando que o Brasil é o maior produtor e
exportador de soja do mundo, com mais de 36 milhões de hectares plantados.
Tanto que ao destacar os resultados econômicos e ambientais gerados a partir da
pesquisa em microbioma no Brasil, os autores do artigo também pretendem
estimular que outras culturas agrícolas do país adotem o uso dos
biofertilizantes, assim como também mais pesquisa seja realizada para a
substituição de outros adubos químicos por microrganismos.
Isso
porque a planta necessita principalmente de três linhas de adubo para se
desenvolver: o nitrogênio, o fósforo e o potássio. No caso da soja, apenas o
nitrogênio é fornecido como biofertilizante, os outros dois nutrientes são
utilizados na forma de adubo químico. Nas outras culturas, como milho, feijão e
arroz, por exemplo, geralmente utiliza-se adubação química para os três
nutrientes.
Os
biofertilizantes de nitrogênio vêm sendo desenvolvidos no Brasil desde que se
introduziu a soja, ainda na década de 1960. “O Brasil optou por essa linha, de
desenvolver e aperfeiçoar a bactéria e os produtos à base de bactéria, para que
pudesse substituir o nitrogênio químico”, diz Araujo.
De acordo
com o artigo, foi o trabalho conjunto de três setores que permitiu a
substituição do nitrogênio químico pelo microbioma nas lavouras de soja.
"Isso é resultado do trabalho de três setores. Primeiro, a pesquisa, com a
academia, a Embrapa e as universidades, trouxe a tecnologia necessária para o
país; o regulatório, ou seja, o legislativo permitiu a regulamentação desses
produtos; e também a indústria, na adoção e comercialização”, diz Souza.
A pesquisa
com microrganismos está presente desde a implantação da soja no país, no
entanto, houve um maior crescimento no número de artigos e produtos nos últimos
dez anos em decorrência das ferramentas de sequenciamento genético mais
acessíveis. “O caso da soja brasileira é importante também para abrir portas
para que outros produtos ganhem mercado e outras culturas agrícolas passem a
utilizar biofertilizantes”, diz Souza.
Modelo para outras culturas
A
expectativa é o crescimento do desenvolvimento de tecnologias baseadas em
microbioma no país. Além dos avanços na pesquisa, que permitem selecionar
melhor os microrganismos e produzir inoculantes mais potentes, os pesquisadores
destacam outra série de fatores que devem contribuir para seu uso em diferentes
culturas.
“Fala-se
em tempestade perfeita para o impulsionamento do uso de biofertilizantes no
Brasil. Hoje temos uma variedade grande de startups e centros de pesquisa
interessados em desenvolver novos produtos em microbioma para diferentes
culturas agrícolas. Os números de economia e proteção ambiental são
consideráveis. Fora isso, ficou clara a necessidade de maior autonomia frente
aos fertilizantes químicos, pois eles são, em sua maioria, importados. Com
isso, o caso da soja brasileira pode ser um impulsionador para que se avance
ainda mais no uso de biofertilizantes no país”, afirma Souza.
O artigo Microbiome Research as an Effective Driver of Success Stories in Agrifood Systems – A Selection of Case Studies (doi: 10.3389/fmicb.2022.834622) pode ser lido em https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fmicb.2022.834622/full.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/uso-de-biofertilizantes-na-soja-brasileira-e-destaque-em-publicacao-cientifica/39156/
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