Não, este texto não trata de investimento
financeiro em bancos ou bolsas de valores. Trata-se de uma estratégia
tradicional na agricultura e defendida por muitos: o uso de adubo fosfatado
para formar uma reserva de fósforo no solo, a chamada poupança, usada para
garantir disponibilidade futura de fósforo às plantas.
Mas antes de entrar nesse assunto, vamos utilizar
as informações do mercado financeiro para responder à pergunta: Poupança é um
bom investimento? Consultando o Google, encontramos a reposta abaixo: A
poupança está bem longe de ser um bom investimento. Muitas pessoas utilizam
essa opção para investir dinheiro, esperando que traga um bom retorno após anos
de aplicação, porém, isso é um grande erro.
De fato, o investimento em Poupança é relativamente
seguro, porém, pouco rentável. Existem outras opções tão seguras quanto e que
podem proporcionar um resultado melhor que o rendimento da Poupança.
Poupança de fósforo no solo
É o resultado da aplicação contínua, por anos e
anos, de quantidades de fertilizante fosfatado acima da necessidade das
plantas, gerando um acúmulo de fósforo no solo. Tecnicamente não existe erro
neste posicionamento; a fosfatagem é um exemplo disso. Trata-se de uma técnica
de correção de fósforo do solo com aplicação de fertilizantes fosfatados, sendo
os mesmos incorporados ou não no perfil do solo. Essa é uma prática que tem
como objetivo a elevação da disponibilidade de fósforo do solo. Porém, até que
ponto vale a pena colocar todos seus recursos neste investimento? Este
questionamento é feito porque o equilíbrio entre ações práticas, técnicas e
econômicas deve ser alcançada, pois de nada adianta adotar uma estratégia
tecnicamente justificada sem ser economicamente viável ou prática.
Por exemplo, o GAPE (Grupo de Apoio à Pesquisa e
Extensão), faz a seguinte orientação para tomar decisão sobre o uso da
fosfatagem. “A fosfatagem é uma prática agrícola recomendada principalmente em
solos com baixo teor de argila (onde a fixação do nutriente é baixa,
possibilitando maior aproveitamento pelas plantas”.
Para dar números à essa estratégia (Fosfatagem) e
poder analisar matematicamente esta prática, faremos uma análise de manejo de
adubação fosfatada ao longo de 20 anos de cultivo em um sistema de rotação soja
(safra verão)/milho (safrinha). Sabemos que o uso contínuo deste sistema de
rotação tem pontos negativos, pois o uso de outras plantas de cobertura traz
benefícios ao sistema; mas para facilitar os cálculos, este foi o sistema de
rotação considerado.
Adubação fosfatada: Quantidade aplicada versus
Aproveitamento
Vamos considerar uma situação de um agricultor que
cultiva, há 20 anos, soja e milho safrinha na mesma área. Ao longo deste
período ele usou, em média, todo ano, 90 kg P2O5/ha e 60
kg P2O5/ha na adubação da soja e do milho,
respectivamente. Neste manejo, ao longo dos 20 anos de cultivo, este agricultor
colocou 3.000 kg P2O5/ha no seu solo. Vamos considerar
que neste período, a produtividade média de soja e de milho safrinha foi de 50
sc/ha e 80 sc/ha, respectivamente. Sabe-se que para produzir 1,0 t de soja e
1,0 t de milho, estas culturas exportam (retiram da lavoura) 11,0 kg P2O5/t
e 6,87 kg P2O5/t, respectivamente. Ou seja, ao longo
destes 20 anos, a quantidade de fósforo que saiu da lavoura (na colheita) foi
de 660 kg P2O5/ha (na soja) e 659 kg P2O5/ha
(no milho safrinha), totalizando 1.319 kg P2O5/ha.
Resumindo, haveria um saldo 3.000 – 1.319 = 1.681 kg P2O5/ha
após 20 anos de cultivo.
Este saldo (1.681 kg P2O5/ha)
deveria mostrar um acréscimo de 367,0 mg P/dm3 ao teor de fósforo no
solo. Entretanto, sabemos que na prática esta conta não “fecha” desta forma,
pois existem pesquisas mostrando o quanto se eleva o teor de fósforo no solo a
cada quilo de fósforo aplicado no solo. Segundo a Embrapa, para um solo com 45%
de argila, são necessários 18 kg P2O5/ha para elevar em 1
mg/dm3 o teor de fósforo determinado em Mehlich 1. Usando esta
informação no nosso exemplo, o saldo de fósforo que “ficou” no solo (1.681 kg P2O5/ha)
resultaria em acréscimo de 93,4 mg P/dm3 ao teor de fósforo do solo.
Segundo a Comissão de Fertilidade do Solo no Estado
de Minas Gerais, solos com teor de argila = 45% e teores de P superiores a 12
mg/dm3 são classificados como “Bom Teor de Fósforo”. No nosso
exemplo temos um aumento do teor de P 7,78x ao que é considerado “Bom”.
Entretanto, na prática, temos visto que as chamadas “áreas velhas” de cultivo
agrícola que apresentam altos teores de fósforo apresentam teores na ordem de
25 a 30 mg/dm3 (teores elevados).
Onde foi parar este “Excedente” de fósforo?
Muito se fala da fixação de fósforo no solo, mas
pouco se fala sobre o processo de envelhecimento de fósforo no solo. Trata-se
de um fenômeno conhecido e que explica por que, com o passar do tempo, a
disponibilidade do fósforo aplicado via adubação vai se reduzindo.
Sabemos que as plantas não precisam de solos com altos teores de nutrientes, pois o que elas precisam são solos com adequados teores de nutrientes. Logo, a chamada poupança de fósforo no solo (elevados teores de fósforo no solo) não traria, de imediato, benefícios à lavoura.
Pelo exposto acima, verifica-se que para fazer a
chamada poupança de fósforo no solo é necessário a aplicação de fertilizante
fosfatado em quantidade maior do que futuramente ficará disponível às plantas.
Como fertilizante fosfatado não é gratuito (tem alta participação no custo de
produção) e as reservas utilizadas para sua produção são finitas, seu uso, para
elevar os teores de fósforo no solo em valores acima do que as plantas
precisam, deve ser reconsiderado. Ou seja, o solo não é o melhor lugar para
estocar adubo fosfatado!
E agora, vale investir na melhoria do solo?
A resposta é SIM, pois sem a devida correção de
fertilidade, no caso do fósforo, teremos uma “ripa” curta no famoso barril da
Lei do Mínimo e, consequentemente, limitação de produtividade. A questão a
refletir não é SE VALE INVESTIR e sim COMO
INVESTIR na correção da fertilidade.
Voltando ao exemplo do mercado financeiro, temos
que pensar no “5 investimentos melhores que a poupança para aplicar seu
dinheiro”. Fazendo um paralelo ao tema que estamos abordando, Investir somente
na aplicação de fertilizantes fosfatados (fornecimento de fósforo), fazendo a
chamada poupança de fósforo no solo, não é a única estratégia disponível para
garantir a boa disponibilidade de fósforo às plantas e, consequentemente, a boa
produtividade. Como o exemplo da figura acima sugere, existem outras
estratégias que irão garantir melhor retorno do investimento realizado, que
são:
- Práticas que eliminam limitação de crescimento
radicular (Correção de acidez; Neutralização de alumínio em profundidade;
Correção de compactação de solo)
- Práticas que promovam acúmulo de matéria orgânica
no solo
- Práticas que promovam o acúmulo de umidade no
solo (umidade do solo influencia significativamente a difusão de fósforo no
solo – principal mecanismo de transporte de fósforo até as raízes das plantas)
- Uso correto do Sistema Plantio Direto
- Práticas que promovam o crescimento radicular
(estimulantes hormonais, microrganismos, etc)
Também não podemos esquecer do Conceito 4C,
utilizado para amentar a eficiência da adubação:
- Dose Certa (análise de solo é fundamental para
isso)
- Local Certo (aplicação localizada x área total -
“à lanço”/superficial/incorporado)
- Época Certa (lembrar dos problemas de
envelhecimento do fósforo)
- Produto Certo (hoje existem adubos fosfatados de
eficiência aumentada no mercado)
Ao Conceito 4C poderíamos adicionar mais um item
(Conceito 5C?), que seria o Manejo (do solo) Correto, envolvendo práticas como
Sistema Plantio Direto, correção de compactação e acidez do solo, incremento do
teor de matéria orgânica do solo, etc.
“E agora José?” Qual sua opinião sobre fazer a
poupança de fósforo no solo?
Roberto Reis - Eng. Agr., D.Sc. - Wirstchat (roberto@wsct.com.br)
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