Em comparação com o ano anterior, o aumento
de casos foi de 11%; mais da metade das ocorrências aconteceu na residência da
própria criança
Todos
os anos, o Hospital Pequeno Príncipe recebe crianças e adolescentes vítimas de todos
os tipos de violência: sexual, física, psicológica, negligência ou
autoagressão. Em 2021 foram 618 atendimentos – um crescimento de 11% em relação
aos dados de 2020 –, e mais uma vez a violência predominante foi a sexual, com
344 vítimas, ou seja, 55% do total de casos. Em 76 ocorrências não foi a
primeira situação desse tipo de violência sofrida por uma criança ou
adolescente.
Do
total de casos, 136 meninas e meninos precisaram ser hospitalizados para se
recuperar das lesões sofridas ou para ser retirados da convivência familiar,
até que os órgãos de defesa da infância tomassem as medidas protetivas
cabíveis. Um bebê, de apenas 4 meses, entrou em protocolo de morte cerebral
após chegar à instituição com várias fraturas e traumatismo cranioencefálico. Um
dado alarmante é com relação à pouca idade das crianças submetidas a situações
violentas atendidas no ano passado: 282 tinham até 3 anos.
O
estresse na primeira infância – que vai desde a gestação até os 6 anos –,
incluindo a exposição à violência, acarreta consequências mentais e
fisiológicas negativas em longo prazo, que podem causar mudanças permanentes no
cérebro que está em desenvolvimento, afetando, por exemplo, o funcionamento
cognitivo, a aquisição da linguagem e o autocontrole. Nessa faixa etária, as
crianças ainda não conseguem defender-se dessas situações, ou pedir ajuda, pela
pouca maturidade e discernimento.
Infelizmente,
o lugar em que crianças e adolescentes mais sofrem violência é dentro de casa:
471 casos registrados em 2021 eram de natureza doméstica. Mais da metade dos
agressores era do sexo masculino (63,7%), e o pai é apontado como o principal
suspeito. "O agressor, normalmente, se aproveita dos vínculos de confiança
estabelecidos com a vítima, além do conhecimento da rotina e dos hábitos, para
praticar a violência e ficar mais distante da suspeita de tal ato pelos
responsáveis e familiares. Por isso, é importante observar mudanças no
comportamento da criança e adolescente", analisa a psicóloga Daniela
Prestes, do Pequeno Príncipe.
Saúde
mental
Segundo
um estudo do Unicef sobre os impactos da pandemia da COVID-19 na saúde mental
de crianças e adolescentes, uma a cada sete pessoas de 10 a 19 anos sofre de
algum transtorno mental, que pode levar à incapacidade ou até à morte no mundo.
Considerada também como violência, a autoagressão é bastante preocupante. Em
2021, a menor vítima de ideação suicida atendida na instituição foi uma criança
de apenas 7 anos.
Ao
todo, o Pequeno Príncipe atendeu 52 crianças e adolescentes por autoagressão.
Um aumento de 173% em comparação com os dados de 2020, quando o Hospital
recebeu 19 casos desse tipo de violência. Em 21 ocorrências, não foi a primeira
vez que aconteceu. "O tempo de isolamento, com menor convívio familiar e
social, afetou o emocional de todos, especialmente das crianças e adolescentes,
que tinham, principalmente, no âmbito escolar a possibilidade de pedir ajuda.
Todo o contexto da pandemia somado fragilizou ainda mais os meninos e
meninas", explica a psicóloga.
A
autoagressão, muitas vezes, é decorrente de violência psicológica, mais difícil
de ser identificada. A Organização Mundial da Saúde a descreveu como ameaças e
intimidação, abuso de poder, discriminação, rejeição e outras formas não
físicas de tratamento hostil. Conforme os últimos dados da Ouvidoria Nacional
de Direitos Humanos, mais de 34 mil denúncias desse tipo de violência foram
averiguadas em pessoas de até 17 anos no Brasil em 2020.
Perfil
das vítimas
Nos
casos de violência sexual, a grande maioria das crianças atendidas pelo Hospital
Pequeno Príncipe que foram submetidas a alguma situação violenta é menina – 78%
do total. A faixa de idade com mais casos registrados, do sexo feminino, é
entre 4 e 7 anos, com 107 ocorrências. No sexo masculino, os registros de
violência sexual concentram-se entre 5 meses e 3 anos – com 32 casos. Do número
total, 220 crianças e adolescentes apresentaram lesões e 31 necessitaram de
internamento. A residência foi o lugar menos seguro para essas crianças, pois
75% dos casos foram de natureza doméstica. Já sobre a autoria do crime, 60% dos
agressores faziam parte do círculo familiar da vítima.
Depois
da violência sexual, a negligência registra o maior número de casos: 150. Em 32
situações, não foi a primeira vez que a criança sofreu esse tipo de violência –
que aparece como intoxicação, fratura e traumatismo craniano.
As
crianças precisam da sua atenção! Violência não!
Desde
2006, o Pequeno Príncipe promove a Campanha
Pra Toda Vida – A Violência não Pode Marcar o Futuro das Crianças, para dar visibilidade
às ações de combate à violência promovidas na instituição. Por meio de manuais
e palestras educativas voltadas a profissionais de saúde e da educação, livros
sobre autoproteção direcionados ao público infantojuvenil, e mobilização da
comunidade por meio de vídeos, posts em redes sociais, divulgação na imprensa e
apoio de influenciadores digitais desde 2019, a campanha busca dar destaque ao
tema, seja ajudando os profissionais a identificar os sinais de violência, seja
incentivando as pessoas a fazer denúncias.
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