Um antigo sonho da população da Baixada Santista pode se tornar um pesadelo de proporções gigantescas. O aguardado reservatório de água destinado a abastecer Guarujá já está previsto em edital, publicado no último dia 20 de maio.
Às margens da rodovia Cônego Domênico Rangoni, na
Cava da Pedreira, região continental de Santos. o projeto terá capacidade para
armazenar 3 bilhões de litros de água, tornando-o assim o maior reservatório da
região. Com ele, a Sabesp pretende resolver o problema de desabastecimento de
água no Guarujá, algo recorrente em períodos de estiagem e na temporada de
verão. Portanto, uma demanda antiga e necessária.
Ocorre que o local escolhido para a construção do
reservatório fica a 1.142 metros das instalações do futuro incinerador de resíduos
sólidos, cujo projeto também está em andamento, na fase de aprovação do
licenciamento ambiental. Assim, caso ambos evoluam, teremos lado a lado duas
atividades totalmente incompatíveis compartilhando o mesmo espaço, com graves
consequências para a fauna e flora local e, principalmente, com enorme agravo à
saúde pública.
Parte de procedimento do Ministério Público de Sao
Paulo, um estudo técnico demonstra que as emissões de poluentes provenientes
das chaminés do incinerador podem chegar a 3 km de distância, o que significa
atingir com poluentes cumulativos diversos compartimentos ambientais (áreas de
preservação permanente, rios, mangues, águas do estuário de Santos e mananciais
de abastecimento público).
Para entender esse impacto, é preciso lembrar que
todo processo de combustão gera resíduos tóxicos. Além de conter
organoclorados, as cinzas geradas pelo incinerador possuem materiais
inorgânicos em sua composição (sílica, alumínio, cálcio e metais pesados,
substâncias altamente cancerígenas).
Entre os gases a serem emitidos diuturnamente estão
substâncias e compostos químicos perigosos, como óxidos de enxofre, óxidos
nitrosos, hexaclorobenzeno, bifenilapolicloradas (PCBs), dioxinas e furanos,
além de muitas partículas finas e ultrafinas inaláveis e não passíveis de
filtragem, com alta capacidade de atingir as partes mais profundas do sistema
respiratório e a corrente sanguínea.
Doenças respiratórias, pulmonares, alérgicas e
dermatológicas, ou mesmo enfermidades genéticas, endócrinas, cognitivas e
câncer estão entre os reflexos dessa poluição. Imaginem esse material
sobrevoando livremente o reservatório destinado a armazenar a água para consumo
humano no Guarujá!
Não é preciso ser um especialista para concluir que
essas duas atividades são irremediavelmente inconciliáveis. Portanto, a decisão
da Sabesp em construir seu reservatório no local elimina a possibilidade de
licenciamento para o incinerador. Caso isso venha acontecer, emissões de
poluentes tóxicos fatalmente atingirão o grande espelho d'água do reservatório.
Não obstante os impactos ambientais, o projeto do
incinerador ainda afronta, segundo o próprio Ministério Público, pelo menos
duas leis federais – o Estatuto da Metrópole e a Política Federal de Saneamento
Básico.
As autoridades precisam se atentar à
incompatibilidade desses projetos e priorizar o reservatório de água para
instalação no local, destinando outra área para o incinerador.
A AGUAVIVA, Associação Guarujá Viva, já está se
manifestando junto ao Ministério Público com uma representação, a fim de que um
inquérito possa ser instaurado, e que as medidas cabíveis sejam tomadas a tempo
de salvar a água que tanto precisamos.
José Manoel Ferreira Gonçalves - engenheiro e presidente da AGUAVIVA, Associação Guarujá Viva.
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