Decisão recente do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese de que é prática abusiva das
companhias áreas brasileiras o cancelamento automático e unilateral de bilhete
de volta por não comparecimento de cliente em voo de ida. O tribunal firmou o
entendimento ao julgar caso de uma empresa que cancelou o bilhete de dois
clientes que adquiriram passagens entre São Paulo e Brasília, pretendendo
embarcar no aeroporto de Guarulhos, mas, por engano, selecionaram, na reserva,
o aeroporto de Viracopos, em Campinas, para o embarque. Por causa disso,
tiveram que comprar novas passagens de ida com embarque em Guarulhos.
Muitos
consumidores acabam adquirindo passagens aéreas de ida e volta juntas, atraídos
pelos preços promocionais, porém acabam tendo problemas se por algum motivo,
não utilizam o bilhete de ida. É prática comum das empresas áreas cancelarem a
passagem do trecho de volta do passageiro que adquiriu as passagens do tipo ida
e volta, e não ter utilizado o trecho inicial, sob o argumento de “no show”.
Ocorre que
trata-se de conduta abusiva, pratica rechaçada pelo Código de Defesa do
Consumidor (CDC), tendo em vista ser um o cancelamento automático e unilateral,
posicionamento este adotado pela Corte Superior. Com efeito, ser permitido ao
fornecedor cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja
conferido ao consumidor, configura a chamada "venda casada", pois
condiciona o fornecimento do serviço de transporte aéreo do "trecho de
volta" à utilização do "trecho de ida", o que está em desacordo
com o sistema de proteção ao consumidor.
Ademais, obrigar o
consumidor a adquirir nova passagem aérea para efetuar a viagem no mesmo trecho
e hora marcados, tendo já efetuado o pagamento, coloca o consumidor em
desvantagem exagerada, conduta também vedada pelo Código de Defesa do
Consumidor.
Não há qualquer
razão lógica para as empresas utilizarem essa prática, que não o objetivo de
incrementar o lucro empresarial. Dessa forma, mesmo
que previsto contratualmente, é abusiva a cláusula que autoriza o cancelamento
unilateral da passagem de volta em caso de não utilização da e ida, podendo,
assim, ser declarada nula judicialmente.
O que
a empresa aérea pode fazer, caso o consumidor, por qualquer motivo, não
comparecer ao embarque no
trecho de ida, é adotar as medidas cabíveis quanto à aplicação de multa ou
restrições ao valor do reembolso em relação ao respectivo bilhete. Entretanto,
não poderá ocorrer qualquer repercussão no trecho de volta, caso o consumidor
não opte pelo cancelamento.
Portanto, está
solidificado que considera-se abusiva a prática comercial consistente do
cancelamento unilateral e automático de um dos trechos da passagem aérea, sob a
justificativa de não ter o passageiro se apresentado para embarque no voo
antecedente. Essa pratica afronta direitos básicos do consumidor, tais como a
vedação ao enriquecimento ilícito, a falta de razoabilidade nas sanções
impostas e, ainda, a deficiência na informação sobre os produtos e serviços
prestados. E o consumidor pode e deve ser indenizado material e
moralmente.
Isabela Perrella - advogada do escritório Aith,
Badari e Luchin Advogados
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