A crise política sem precedentes na Venezuela vem
causando reflexos dramáticos em Roraima. Um estado com cerca de 500 mil
habitantes, com atividade econômica pouco intensa, que enfrenta as dificuldades
impostas pela distância, vê-se, de hora para outra, demandado por milhares de estrangeiros
em busca de refúgio.
No último dia 15, visitamos Roraima com a Caravana de
Prerrogativas da OAB. Embora nossa missão fosse debater esse tema institucional,
logo no aeroporto pudemos sentir o drama causado pela entrada repentina de
tantos refugiados – boa parte deles já a caminho do Centro Oeste e do Sudeste
brasileiros.
Nas visitas que fizemos ao Tribunal de Justiça e ao
governo estadual, percebemos grande preocupação com essa questão. Nas
audiências de custódia, os venezuelanos já representam 50% das demandas. O
sistema prisional de Roraima encontra-se em colapso: a principal unidade
prisional foi depredada durante rebelião no ano passado, não existem barreiras
de separação interna entre os aprisionados e a as facções dominam as duas
unidades prisionais da capital. O preso que entra no sistema carcerário sequer
tem como evitar a imediata filiação a um dos grupos faccionados – que, agora,
já começam a utilizar a “mão-de-obra” venezuelana na ponta do crime.
Cruzar a fronteira é visto pelos venezuelanos como uma
questão de sobrevivência. Nos abrigos, encontramos uma população esperançosa
por encontrar um caminho de alento com suas famílias. Quando perguntamos as
razões pelas quais estavam no Brasil, a primeira resposta era sempre a fome, a
miséria e a falta de perspectivas no vizinho país.
Todavia, o acolhimento que buscam esbarra em dificuldades
imensas, pois o estado de Roraima não está preparado e a precariedade na
fronteira é enorme. Inexiste um controle mínimo de imigração e tampouco se
conhecem os antecedentes de quem cruza a fronteira. Não há controle de vacinação – ouvimos
relatos em Boa Vista de doenças que antes não existiam no Brasil. Armas que
estavam em poder da população venezuelana, também segundo as informações, são
trazidas pela fronteira e caem nas mãos do crime organizado.
São relatos preocupantes, pois os ouvimos tanto de autoridades
como de populares da região.
O sentimento é de que Roraima foi esquecido pelo restante
do país e de que as autoridades fecham os olhos, confiando que esse problema
ficará confinado ao longínquo estado. Essa, porém, não é a realidade. O
problema merece a atenção de todo o País. Não podemos imaginar que um estado,
sozinho, resolverá essa situação, especialmente pelas dificuldades sociais que
já enfrenta em relação à sua população.
O que mais ouvimos dos amigos roraimenses foi um pedido
para que relatássemos a todo o país a crise humanitária e social daquele
estado, de modo a despertar nas autoridades nacionais a necessária atenção.
E é o que estamos buscando fazer, esperando que providências
sejam realmente tomadas em nome da solidariedade e do estado democrático de
direito.
Cassio
Lisandro Telles, advogado - presidente da Comissão Nacional de Defesa das
Prerrogativas e Valorização da Advocacia da OAB
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