A
chamada delação premiada é uma técnica de investigação e consiste em benefícios
ofertados pelo Estado àquele que confessar e prestar informações sobre o
esclarecimento de delitos. Esse
instituto traz grandes benefícios às investigações criminais, trata-se de um meio excepcional de obtenção de prova e efetiva-se
por meio de um acordo que é realizado entre o acusado e o Ministério Público.
O infrator fornece informações cabíveis à autoridade
competente, e, em troca recebe uma vantagem. O acusado no
decorrer do interrogatório além de confessar a sua autoria no crime revela o
nome de outros comparsas. Há quem opine que, dessa maneira, o delator abriria
mão do princípio da ampla-defesa, um direito constitucionalmente garantido,
entretanto, há também quem afirme exatamente o contrário: partindo da premissa
que ao cogitar a possibilidade da delação, o acusado já tem um suficiente lastro
probatório contra si, o uso desse método apenas o beneficia. De qualquer
maneira, cabe uma análise mais profunda sobre a legalidade do tema e as suas
consequências.
A
delação premiada ganhou notoriedade mundial ao ser usada pelo magistrado
italiano Giovanni Falcone para desmembrar a Cosa Nostra, uma organização
criminosa que vinha angustiando profundamente a Itália. Aqui no Brasil, no
entanto, a lei dos crimes Hediondos (Lei nº. 8.072/1990) foi a primeira lei a
usar a colaboração. Ela previu a redução de um a dois terços da pena do
participante ou associado da quadrilha voltada a efetuar crimes hediondos que
denunciasse à autoridade o grupo criminoso, permitindo o seu desmantelamento.
Posteriormente, a delação premiada passou a atuar também nas esferas de crimes
Contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei nº. 7.492/86), Contra a Ordem Tributária
(Lei nº. 8.137/1990) e crimes praticados por Organização Criminosa (Lei nº. 12.850/2013).
Nesse prisma, a colaboração destacou-se como
instituto preferido pelo Estado para combater a criminalidade organizada, com a
criação de um direito premial e a oferta de segurança para aqueles que
confessassem seus delitos e delatassem seus chefes na organização. A lei
do combate à lavagem de dinheiro (Lei nº. 9.613/1998) reforçou e deu aplicação
prática as delações premiadas. Esta lei previu prêmios estimulantes ao
colaborador (delator) com possibilidade de condenação a regimes menos gravosos,
como o aberto ou semiaberto.
Para o público brasileiro de maneira geral, as
delações premiadas passaram a ser conhecidas a partir do início da Operação
Lava-Jato que iniciou em Curitiba há aproximadamente três anos. Desde então,
não tem sido raro nos depararmos com informações fortemente amparadas pela
mídia, a fim de dar ciência a respeito dos acordos celebrados entre os acusados
por essa grande operação.
Recentemente, no dia 28 de junho de 2017, o ministro
do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes fez críticas ao acordo de colaboração
premiada firmado entre a Procuradoria Geral da República e os irmãos Joesley e
Wesley Batista, executivos da holding que inclui a JBS e premiados com o não
oferecimento de denúncia em face da colaboração. Gilmar Mendes questionou
nestes termos: “O Ministério Público acaba de isentar os delatores de
responderem a processo.
Que tipo de investigação usará para provar o contrário? Repito, como se pretende avaliar se Joesley é líder da organização criminosa? ” — A falta de controle custará caro para todo o sistema jurídico — completou o ministro.
Que tipo de investigação usará para provar o contrário? Repito, como se pretende avaliar se Joesley é líder da organização criminosa? ” — A falta de controle custará caro para todo o sistema jurídico — completou o ministro.
Tendo todos esses conceitos e problemáticas em
vista, é inevitável questionar a moralidade do Estado, e o seu comportamento ao
enfrentar ilegalidades provenientes de certos acordos que decorrem de um
instituto sancionado por ele próprio.
Afastar
a delação premiada do sistema brasileiro é quase que impossível, diante da
grande carga que temos depositado sobre ela. Ademais, é notável que tem
auxiliado a justiça, porém, o que se questiona aqui, são os acordos que geram
uma série de crimes e ilegalidades. Como é possível que algo proveniente da
própria justiça e do ordenamento nacional possa resultar em diretos desinteresses
da União?
O
que deve-se discutir é a normatização adequada, para que, assim, se delimite ao
máximo sua aplicação, de modo a garantir sua efetividade e legalidade essencial
em todos os acordos celebrados.
João Antonio Pagliosa
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