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| Reprodução do @greengodictionary |
Mostra investiga
os memes como forma de linguagem, crítica, afeto coletivo e produção estética.
De virais históricos como o “Sanduíche-iche-iche” à profusão das carretas e
trenzinhos da alegria, a exposição mergulha na cultura digital brasileira e na
potência política do humor, passando por São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e
Rio de Janeiro.
O Brasil é
um dos maiores produtores e consumidores de memes do mundo — e agora também é o
primeiro país a conceber uma exposição de grandes proporções dedicada a esse
fenômeno. Com estreia marcada para 27 de agosto de 2025 no Centro Cultural
Banco do Brasil São Paulo (CCBB SP), “MEME: no Br@sil da memeficação”
explora arte contemporânea, cultura digital e crítica social em uma experiência
curatorial inédita. A mostra fica em São Paulo até 03 de novembro e depois
segue em itinerância por Brasília, Belo Horizonte e Rio de Janeiro.
A curadoria
de Clarissa Diniz e Ismael Monticelli, com a
colaboração do perfil de Instagram @newmemeseum, convida o público a explorar a
memeficação como um dos modos mais potentes — e irônicos — de narrar o Brasil
contemporâneo.
“Memes não
são só piadas. Eles são ferramentas políticas, culturais e afetivas. São como o
Brasil elabora, disputa e negocia suas diferenças — sociais, raciais, de
gênero, estéticas — em tempo real”, afirma Clarissa. “A exposição parte do
humor e provoca reflexões sobre como estamos diariamente refazendo o país por
meio de suas imagens mais debochadas e, claro, críticas”.
“Pensar o
Brasil de hoje sem considerar a sua intensa produção de memes é adotar uma
perspectiva que ignora uma camada significativa da experiência do país” diz
Ismael Monticelli. “Eles não apenas refletem a realidade, mas atuam sobre ela:
produzem memória, disputam narrativas, elaboram ficções, geram pertencimento.
Enquanto fazemos memes, os memes refazem o Brasil.”
A proposta
curatorial rompe barreiras entre diferentes linguagens e repertórios culturais,
reunindo nomes consagrados da arte contemporânea brasileira, como Anna
Maria Maiolino, Gretta Sarfaty, Nelson Leirner e Claudio
Tozzi, ao lado de criadores de conteúdo como Porta dos
Fundos, Alessandra Araújo, Melted Vídeos, John Drops e Greengo
Dictionary.
O meme antes do meme
Organizada
em seis núcleos temáticos — Ao pé da letra, A hora
dos amadores, Da versão à inversão, O eu
proliferado, Combater ficção com ficção, Memes: o
que são? Onde vivem? Do que se alimentam? — a rica cenografia
imersiva ocupa todos os andares do CCBB São Paulo com vídeos, neons,
esculturas, figurinos, quadrinhos, pinturas, objetos, backlights, instalações
sonoras e experiências interativas.
“A exposição
parte da compreensão dos memes como uma linguagem viva, que afeta diretamente
nossas formas de pensar, sentir e agir — transbordando os limites da internet”,
afirma Ismael Monticelli. “Não temos a ambição de ser um inventário do humor
nacional”, destaca.
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| Reprodução do perfil @galinhas.inseguras |
“Queremos
provocar reflexões”, explica Clarissa. “Será que a vocação memética do Brasil
começou mesmo com os memes digitais? Ou será que ela já se anunciava no
Carnaval, nos bordões da TV, nas pichações e nos outdoors? O que acontece
quando política, publicidade e arte se dobram aos formatos da zoeira?”,
questiona.
Além da
ocupação física no CCBB, o projeto se estende ao ambiente digital com ativações
especialmente desenvolvidas para as redes sociais. Em parceria com o perfil de
memes @newmemeseum, curadorias de conteúdos exclusivos serão compartilhadas
online, ampliando o alcance da exposição e promovendo o acesso ao debate com
públicos diversos — muito além das paredes do museu.
Ao receber
este projeto, o Centro Cultural Banco do Brasil reafirma seu papel como um
espaço vivo de diálogo com as linguagens contemporâneas, valorizando a potência
crítica, afetiva e estética que surge tanto das redes quanto das ruas. A mostra
também reforça o compromisso do CCBB com a valorização da cultura brasileira em
toda a sua diversidade — incluindo as expressões que nascem, se desenvolvem e
se reinventam no ambiente digital. “É uma mostra que olha para o presente com
inteligência e humor, revelando como o Brasil se narra e se reinventa a partir
da criatividade coletiva”, destaca Cláudio Mattos, Gerente Geral do CCBB São
Paulo.
Percurso da mostra
- Alisa meu pelo
No átrio do
CCBB São Paulo, onças de diferentes formatos e materiais recebem o público numa
cena que remonta ao meme “alisa meu pelo", cujo ápice ocorreu em 2023,
tornando-se especialmente popular entre os adolescentes. Desenvolvido como
recurso multissensorial e integrado às políticas de acessibilidade do CCBB, as
onças da instalação reúnem recursos táteis, visuais e sonoros, convidando os
públicos a se relacionarem desde a diversidade de seus corpos.
- Ao pé da letra
No primeiro
núcleo da exposição, o foco recai sobre os jogos semânticos e os descompassos
entre texto e imagem que tornam os memes tão eficazes em gerar riso, crítica e
estranhamento. Em vez de explicarem um ao outro, palavras e figuras se combinam
para formar sentidos inesperados — ou se colam literalmente, desnaturalizando
expressões e convenções sociais.
O núcleo
revela ainda como invenções linguísticas produzem deslocamentos de sentido e
potência crítica, abordando práticas como o uso de emojis, narrações e
dublagens cômicas, além de línguas como o tiopês, o pajubá e estruturas como o snowclone.
No Brasil,
um dos exemplos mais populares de snowclone é o meme “Você pode
substituir X por Y”, inspirado na apresentadora Bela Gil. A frase, usada
originalmente para sugerir alternativas alimentares, foi rapidamente adaptada
pela internet em versões humorísticas como “você pode substituir o WhatsApp por
um pombo correio, por exemplo".
A
investigação também explora como parte da produção visual no mundo digital é
frequentemente rotulada como “feia”, “mal feita” ou “amadora”. Esses
julgamentos estéticos, além de refletirem preconceitos antigos, ignoram um
aspecto central: a “feiúra” é muitas vezes uma escolha deliberada. Trata-se de
uma estética que rompe com os padrões tradicionais de beleza, valorizando o
improviso, o erro e a imperfeição como recursos expressivos.
Alguns criadores presentes no núcleo são: Amanda Magalhães (@amandzmagalhaes),
Daniel Santiago, Frimes (@frimes), Greengo Dictionary (@greengodictionary),
Guto TV (@gutotvreal), Leandra Espírito Santo, Melted Vídeos (@meltedvideos),
Nelson Leirner, Pamella Anderson, Panos Subversivos (@panossubversivos), Rafael
Portugal (@rafaelportugal), Raquel Real (@raquelrealoficial), Roxinha e Ruth
Lemos.
- A hora dos amadores
Inspirado
pela célebre capa da revista Time de 2006 — que elegeu
"você" como a personalidade do ano —, o núcleo aborda a virada
provocada pela internet e pelas redes sociais, que deram visibilidade inédita
às “pessoas comuns”. Os memes, nesse contexto, aparecem como uma tecnologia
social de protagonismo, permitindo que vozes antes apagadas ou silenciadas
ocupem o centro da cena.
Em países
como o Brasil, marcados por fortes desigualdades, os memes se tornaram um
território fértil para narrativas insurgentes: do humor que revela a
precariedade cotidiana à crítica social feita com poucos recursos e muita
sagacidade. Este núcleo sublinha essa potência do amadorismo como desvio
criativo e força política.
Entre os
destaques está a retomada do Concurso Mundial do Mickey Feio,
realizado em 2001 por Daniela Brilhante e Lourival Cuquinha, que formam a dupla
Valdisnei, um trocadilho com o nome Walt Disney. A proposta convida o público a
criar versões “feias” do personagem da Disney, em uma crítica bem-humorada ao
imperialismo cultural. Essa nova edição da iniciativa será realizada em
parceria com o Educativo do CCBB SP, num incentivo à participação do público.
Os educadores
do CCBB oferecerão oficinas de criação de Mickeys Feios, abertas a todos que se
interessarem em participar. As atividades ocorrem a cada 30 minutos, de quarta
a segunda-feira, das 12h às 19h. As criações do público passarão a integrar a
exposição.
Alguns criadores presentes no núcleo são: Alessandra Araújo
(@alessandraraujooficial), Vadisnei (Lourival Cuquinha e Daniela Brilhante),
Malfeitona (@malfeitona), O Brasil que deu certo (@obrasilquedeucerto), Felipe
Neto (@felipeneto) e Raphael Vicente (@raphaelvicente).
- Da versão à inversão
A imitação é
uma das bases da linguagem memética, e por isso aqui ela é investigada não como
gesto de repetição, mas como uma atividade crítica e criativa. Esse núcleo
mostra como memes transformam cópias em versões que subvertem e desmontam o
original, produzindo humor, paródia e comentário social.
A exposição
apresenta desde pequenas alterações — como trocar uma palavra ou fazer um
recorte específico de imagem — até inversões radicais: mulheres imitando
homens, estéticas que embaralham as fronteiras entre identidade e
representação. “Como no Carnaval, o riso vem da inversão — e nela, uma crítica
se insinua”, resumem os curadores.
Com humor
ácido, neste núcleo o público acompanha, por exemplo, uma versão paródica dos tradicionais
“Museus do Homem", instituições etnográficas que historicamente atribuíam,
ao homem branco europeu, um modelo civilizatório supostamente válido para toda
a humanidade. Desse modo, a exposição verte esses museus etnográficos num
debochado “Museu do Homem da Internet", no qual figuram vitrines que
apresentam quatro estereótipos masculinos: o heterotop, conservador que exalta os
valores da masculinidade; o esquerdo macho, progressista apenas
no discurso; o Faria Limer, defensor do mérito neoliberal; e o red pill,
adepto de visões antifeministas. Ao reunir essas figuras, os memes ironizam
discursos de falsa opressão e expõem os privilégios masculinos que seguem
operando sob novas roupagens.
Alguns criadores presentes no núcleo são: A vida de Tina (@avidadetina),
Denilson Baniwa, Alexandre Mury, John Drops (@johndrops), Hand-painted Brazil
(@handpaintedbrazil), Festa da Firma (@festadafirma), Juvi Chagas
(@ajuvichagas), Lara Santana (@larasantana), Malhassaum (@malhassaum), Porta
dos Fundos (@portadosfundos), Renata Felinto, Rafaela Azevedo (com a personagem
Fran, @fran.wt1) e Victor Arruda.
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| Pamella Anderson "Blogueirinha", 2019. Foto: Marcos Paim |
O eu proliferado
A explosão
do “eu” nas redes sociais e a forma como a vida privada se tornou espetáculo
são destaques neste núcleo. A internet deixou de ser apenas um espaço de
compartilhamento para se tornar um palco de auto performance. A construção de
si — por meio de selfies, dancinhas, relatos, confissões e personagens —
tornou-se prática cotidiana, revelando tanto o desejo de existir publicamente
quanto os efeitos dessa superexposição.
O núcleo
aborda a dramaturgia do “eu” como potência e armadilha. Se, por um lado,
possibilita a afirmação de identidades historicamente apagadas, por outro, evidencia
o impacto subjetivo da lógica neoliberal, que transforma a autoestima em
mercadoria e precariza o bem-estar e a saúde mental.
A mostra
inclui um estúdio de podcast que convida o público a acompanhar uma conversa
ficcional entre personagens que parodiam o universo da autoajuda e do coaching
nas redes sociais. Com telas acopladas a cadeiras, a instalação recria a
atmosfera de um bate-papo midiatizado, no qual o visitante experimenta, com
doses de humor e crítica, a sensação de estar diante de um diálogo entre a
motivação e o fracasso em tempos de disforia social.
Alguns criadores presentes no núcleo são: Coach de Fracassos
(@coachdefracassos), Frases Pra Você (@frasespravoce), Galinhas Inseguras
(@galinhasinseguras), Gretta Sarfaty, Jacira Doce (@jaciradoce), Fábio Cruz
(com o personagem Fabão, @eusoufabao), Lenora de Barros, Nathalia Cruz
(@nathaliapontocruz), Panmela Castro, Pedro Vinicio (@pedrovinicio80), Regina
Vater, Telma Saraiva, Monica Piloni, Valentina Bandeira (@valentinabandeira),
Valeska Soares.
- Combater ficção com
ficção
A
polarização política e a radicalização do discurso público são temas centrais
do núcleo, que examina o papel dos memes na disputa simbólica do presente. Ao
mesmo tempo em que são ferramentas de leitura e resistência política, os memes
podem também ser veículos de desinformação, exclusão e violência. A curadoria
propõe aqui uma reflexão sobre os usos éticos do riso, compreendendo o humor
como forma sofisticada de diplomacia, mas também como instrumento perigoso nas
mãos do autoritarismo. Entre a memecracia e a crítica, este núcleo convida a
pensar: como rir sem reforçar os estigmas que queremos combater?
As figuras
dos políticos que, desde os anos 1980, vêm sendo parodiadas por programas como TV Pirata
e, mais recentemente, em esquetes do Porta dos Fundos, não poderiam ficar
de fora. A sátira política se articula com uma crítica à militância digital e o
ativismo de sofá que escancara, com humor, os absurdos e contradições do
discurso nas redes.
Alguns criadores presentes no núcleo são: Augusto de Campos,
Claudio Tozzi, Dolangue News (@dolangue.news), Dora Longo Bahia, História no
Paint (@historianopaint), Juju dos Teclados (@jujudosteclados), Marcelo Tas
(@marcelotas), Paulo Gustavo, O Pasquim, Porta dos Fundos (@portadosfundos),
Regina Silveira, Saquinho de Lixo (@saquinhodelixo), Sensacionalista
(@jornaldosensacionalista).
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| Olimpíadas, 2017. Dora Longo Bahia. Cortesia da Galeria Vermelho Foto: Edouard Fraipont |
- Memes: o que são? Onde
vivem? Do que se alimentam?
Encerrando o
percurso, esse núcleo abraça a impossibilidade de definir os memes de forma
única. Ao invés de uma resposta fixa, a curadoria propõe uma provocação
coletiva: como cada pessoa compreende o que é um meme? O que eles significam
hoje?
São apresentadas
10 entrevistas inéditas com criadores brasileiros que responderam, em vídeo,
essa indagação existencial, desdobrando-as em reflexões sobre humor e
memeficação. Aqui, o meme é entendido como forma fluida e mutante — uma
expressão que habita os interstícios da linguagem, circula entre mídias e
revela, no improviso, a imaginação crítica do nosso tempo.
Este núcleo
foi elaborado em parceria com o Museu de Memes (https://museudememes.com.br),
projeto da Universidade Federal Fluminense (UFF) sob a coordenação do professor
e pesquisador Viktor Chagas, um dos maiores pesquisadores sobre a linguagem dos
memes no Brasil.
"MEME: NO BR@SIL DA MEMEFICAÇÃO" é uma produção da
Patuá Produções, com patrocínio do Banco do Brasil. Depois de São Paulo, a
exposição será apresentada em Brasília (novembro de 2025 a março de 2026), Belo
Horizonte (março a junho de 2026) e Rio de Janeiro (agosto a novembro de 2026).
Serviço:
Exposição "MEME:
NO BR@SIL DA MEMEFICAÇÃO”
Período: 27
de agosto a 03 de novembro de 2025
Horário:
Todos os dias, das 9h às 20h (exceto às terças)
Local:
Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo
Endereço:
Rua Álvares Penteado, 112 – Centro Histórico – SP




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