No Brasil, os planos de saúde desempenham um papel crucial no acesso a tratamento para pessoas com TEA - Transtorno do Espectro Autista. Infelizmente, muitas famílias enfrentam obstáculos com negativas de cobertura e o exercício limitado de coparticipação abusivas que impedem o tratamento por conta do alto custo. Felizmente, a lei também está no lado dos pacientes, e nos últimos casos, decisões judiciais têm reforçado o direito à terapia sem prender os pacientes a fardos financeiros secundários.
Recente estudo inédito do Insper - Instituto de Ensino e Pesquisa -, que analisou sentenças do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, revelou que cerca de nove em cada dez ações judiciais (92%) contra planos de saúde que pedem tratamentos para crianças e adolescentes com TEA têm decisões favoráveis ao beneficiário.
O levantamento também demonstrou que os pedidos com maiores índices de sucesso foram para tratamentos de fonoaudiologia, terapia ocupacional, psicologia, psicoterapia e equoterapia (acima de 94% de sucesso). Já os pedidos para acompanhante terapêutico (70,6%), psicopedagogia (76,7%), nutricionista (80%), medicamentos a base de canabidiol (81,8%), musicoterapia (83,3%) e hidroterapia (87,5%), também tiveram razoável sucesso.
De acordo com o Insper, em 66% dos casos houve solicitação para que fosse usada a ABA (Applied Behavior Analysis, na sigla em inglês), uma técnica baseada na ciência do comportamento que foi alvo recente de controvérsia sobre a falta de evidências científicas que atestem a sua eficácia e/ou a superioridade em comparação a outros métodos.
O Transtorno do Espectro Autista é uma doença neurológica caracterizada por desafios na comunicação, interação social e padrões comportamentais repetitivos. No entanto, com base no DSM-5, Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, alguns indivíduos dentro do espectro podem exibir comprometimento em escalas variáveis, exigindo intervenções multidisciplinares regulares para promover sua qualidade de vida e desenvolvimento adequado. Entre elas, estão incluídas a psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional, como também a técnica de ABA, que é essencial para estimular o desenvolvimento de habilidades cognitivas, motoras e sociais.
A legislação brasileira, especialmente a Lei nº 12.764/2012, também conhecida como ‘Lei Berenice Piana’, estabelece que as pessoas com TEA têm direito a um tratamento completo, e os planos de saúde têm a obrigação de cobrir estas terapias. Além disso, a Agência Nacional de Saúde Suplementar ANS ou rol assegura a cobertura desta terapêutica, acrescentando que as operadoras não podem cobrar coparticipação ou franquias nestes procedimentos. No entanto, muitas famílias ainda enfrentam desafios, quer seja devido à recusa de cobertura ou à coparticipação excessiva.
Outro ponto de grande controvérsia e judicialização, a
coparticipação em tratamentos para TEA. Embora o plano de saúde possa cobrar do
beneficiário uma taxa por cada procedimento realizado, a cobrança nesses moldes
possui limites éticos e legais. Na prática, contudo, algumas operadoras cobram
taxas exorbitantes, tornando o tratamento inacessível para muitas famílias.
Para coibir abusos, tribunais em todo o país instituem um teto máximo de 10% do
valor total de todas as terapias executadas, protegendo assim os pacientes e
garantindo que eles possam continuar o tratamento sem se endividar.
Importante destacar que no caso de negativas de cobertura ou
cobranças abusivas as famílias podem ajuizar uma ação de obrigação de fazer
para que o plano de saúde atenda sua obrigação contratual. Para tanto, é
necessário reunir documentos como contrato do plano de saúde, comprovantes de
pagamento, laudos médicos detalhados, faturas das cobranças realizadas,
negativas de cobertura, se houver, e o Rol de Procedimentos da ANS que comprove
o tratamento do plano de saúde. Com essa documentação, é possível pleitear
amparo judicial, por meio dessa ação, para que sejam revertidas cobranças
indevidas e seja garantido o tratamento prescrito.
A luta pelo direito a um tratamento adequado para pessoas
com TEA é uma batalha que ainda está em andamento, mas a legislação e a
jurisprudência estão criando caminhos firmes para assegurar que esses pacientes
recebam o cuidado que merecem. A saúde não deve ser um privilégio, mas sim um
direito garantido por lei. Se porventura o paciente tiver dificuldades para
conseguir a cobertura adequada do plano de saúde, é importante lutar pelos seus
direitos e, se necessário, buscar justiça. Garantir um tratamento digno e
acessível para pessoas com TEA é uma questão de equidade, inclusão e respeito à
dignidade humana.
José Santana Júnior - advogado especialista em Direito Empresarial e da Saúde e sócio do escritório Mariano Santana Sociedade de Advogados.
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