Mudar de carreira
depois de anos consolidando experiências e construindo uma trajetória
bem-sucedida não é uma decisão fácil. Para quem esteve por mais de 35 anos no
mercado financeiro, a transição para uma consultoria de tecnologia pode ser uma
oportunidade de continuidade, mas também pode ser um salto no escuro. O que
poucos percebem é que essa troca, apesar dos desafios, pode ser a oportunidade
de alinhar sua experiência, seu networking e a paixão por esta
indústria, viva e contribuindo de uma forma transformadora. Ao longo da minha
jornada de transição, percebi que muitos profissionais compartilham do mesmo
dilema e curiosidade: como dar esse passo e, ao mesmo tempo, encontrar valor?
A mudança de
carreira, especialmente a “esta altura do campeonato”, no bloco dos 50+, pode
gerar receios e inseguranças. Afinal, estamos abandonando a zona de conforto e
nos aventurando em um território “desconhecido”. Entretanto, acredito que a
experiência acumulada ao longo dos anos é um ativo valioso, capaz de abrir
portas e impulsionar o crescimento em diferentes áreas. No meu caso, o
conhecimento profundo do mercado financeiro, aliado à expertise em processos e
à capacidade de comunicação, se mostraram ferramentas essenciais para a atuação
na minha nova jornada em uma consultoria de tecnologia.
Uma das grandes
diferenças que percebi ao sair do banco foi a cadência do dia a dia. No mercado
financeiro, a agenda é intensa, as tomadas de decisão são rápidas e sucessivas
e a demanda por previsibilidade é muito alta. Meus últimos desafios nos bancos
foram associados à liderança de grandes equipes de otimização de processos em
nível corporativo e gestão de projetos com altos budgets de
transformação tecnológica. Uma cadência diária com uma agenda repleta de
reuniões sucessivas e demandas constantes em torno destes temas. A navegando
entre áreas comerciais, operacionais e tecnológicas, me forneceram um amplo
conhecimento sobre o funcionamento bancário, algo que se tornaria meu maior
diferencial competitivo na nova jornada.
Já na consultoria,
a programação também é bem movimentada, ainda mais que além de mudar de
indústria, também mudei minha carreira para uma experiência comercial e isto
realmente era diferente. Agora o espaço para negociações tinha uma abordagem
diferente, onde a empatia e entendimento do que se precisa do outro lado, abre
um imenso caminho para aplicação de minhas competências.
A dinâmica
comercial exige um novo tipo de paciência. O ritmo ou cadência é completamente
diferente e tem dias que realmente a agenda é cumprida e ponto. Isto traz a
flexibilidade que substituiu a rigidez, e a esta dinâmica oferece novos
desafios. Outra coisa interessante foi a mudança de modelo. Nos Bancos em
geral, planejamentos feitos e budgets destinados, você normalmente tem as
pessoas para realização de seus projetos por exemplo. Já na consultoria, você
trabalha para ter os projetos e aí sim, buscar as pessoas certas para os
desafios e isto causa uma certa estranheza para quem chega neste novo mundo.
Diante desta nova
realidade cheia de variações, sim, cheguei a me questionar: "O que eu vim
fazer aqui?" Mas logo percebi que essa mudança era um reflexo da dinâmica
mais flexível e inovadora do setor de tecnologia e estava alimentando aspectos
da minha carreira que permaneceram adormecidos por anos. A transição foi um
choque, mas também uma revelação sobre o que realmente me motivava
profissionalmente. Por isso, adaptar-se às novas regras do jogo foi essencial
para fazer dessa transição um sucesso, e confesso, manter a conexão com esta
indústria que sempre fui apaixonado, me fez sentir realizado e feliz na nova
jornada.
Acredito que a
chave para uma transição de carreira bem-sucedida reside na clareza dos
objetivos e na disposição para aprender e se adaptar. É fundamental identificar
as habilidades e competências que podem ser transferidas para a nova área, bem
como as lacunas que precisam ser preenchidas. A busca por conhecimento e o networking
são aliados importantes nesse processo. Além disso, é preciso ter paciência e
persistência, pois o processo pode exigir tempo e dedicação.
A nossa rede de
contatos torna-se determinante para o nosso crescimento. Quando cheguei à
consultoria, percebi que os clientes que atendia antes continuavam sendo parte
essencial do meu dia a dia. As relações profissionais construídas ao longo dos
anos se transformaram em oportunidades comerciais, mas sempre associado a um
valor agregado que surgia a cada conversa dada toda experiência acumulada
anteriormente. No final das contas, a confiança e a credibilidade que construí
no mercado financeiro se tornaram meu grande aliado e um diferencial
competitivo na consultoria.
Olhando para trás,
vejo que o sucesso da transição não veio apenas do conhecimento técnico, mas da
capacidade de reconhecer o que sempre me motivou. Durante toda minha carreira,
fui um solucionador de problemas e um facilitador de processos. No banco,
trabalhava otimizando operações e aumentando a eficiência. Na consultoria, faço
exatamente o mesmo, mas de um novo ponto de vista, com novas ferramentas e
desafios.
Se pudesse deixar
um conselho para quem está pensando em mudar de carreira, seria este: a paixão
pelo que você faz não precisa ser limitada por um setor ou cargo específico.
Durante anos, estive tão imerso no mundo bancário que nunca me permiti olhar
para fora. Quando finalmente tive oportunidade ou até coragem de mudar, percebi
que minha experiência podia ser valiosa em outro ambiente. E isso é algo que
qualquer profissional pode descobrir, independentemente da área de atuação.
Tenho observado
como as diferentes gerações encaram os rumos profissionais. No ambiente
corporativo atual, convivem profissionais de 50, 35 e 20 anos, cada um com sua
perspectiva sobre permanência, mudança e valor. A geração atual tem um ritmo
diferente, uma urgência por crescimento e reconhecimento que muitas vezes não
se alinha ao tempo de amadurecimento profissional. Eles não querem
"ficar", querem "estar" e ser reconhecidos rapidamente. Ou
seja, me parece claro que os mais jovens em geral, raramente desenvolvem a
paixão que minha geração cultivou pelas empresas em que trabalhavam. Ao mesmo
tempo, muitos profissionais experientes, como eu fui por anos, tornam-se
"avestruzes" - tão imersos em suas rotinas que nunca levantam a
cabeça para ver o mundo de possibilidades ao redor.
Aprendi, no entanto,
que a pressa não pode substituir a consistência. Não se trata apenas de mudar
por mudar, mas de saber como sua bagagem pode se encaixar em um novo cenário.
Se houver clareza, planejamento e uma dose de coragem, a transição pode ser um
dos momentos mais enriquecedores da carreira. Ao final dessa jornada, percebo
que não deixei de lado a minha paixão pelo mercado financeiro, mas a
transformei. Encontrei um novo papel em um ecossistema que sempre admirei, e
hoje posso contribuir de uma maneira diferente, mais alinhada ao que busco para
minha vida profissional.
Mudar pode ser
“assustador”, porém também pode ser incrivelmente libertador. Para aqueles que
temem a mudança, deixo um incentivo: olhe para o que você construiu até aqui e
descubra como isso pode te levar ainda mais longe. Acredite no seu potencial e
na sua capacidade de se reinventar. A vida é uma jornada de aprendizado
contínuo, e este pode ser o primeiro passo para uma nova fase de sucesso e
realização. Mas se você está feliz onde está siga, a felicidade é um componente
estrutural de nossas vidas.
No meu caso, um antigo colega do banco me fez uma pergunta recentemente: "Você se arrepende?" Minha resposta foi sincera: "... passado este tempo, posso até dizer que só me arrependo de não ter feito antes."
Saulo Santos - Business Vice President no Brasil da GFT Technologies
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