Uso de vibradores e
outros objetos pode disseminar HPV, vírus relacionado ao câncer de colo de
útero
Dados do Instituto Nacional do Câncer
(INCA) informam que esse é o terceiro tipo de tumor mais frequente entre as
mulheres no Brasil, excetuando o câncer de pele não melanoma. No mês da
conscientização sobre a doença, a Sociedade Brasileira de Patologia (SBP)
alerta sobre a prevenção e o diagnóstico precoce.
No Brasil, segundo dados do Instituto Nacional do
Câncer (INCA), excluídos os tumores de pele não melanoma, o câncer de colo de
útero é o terceiro tipo de tumor mais frequente entre as mulheres. Para cada
ano do triênio 2023-2025, são estimados mais de 17 mil novos casos no País. O
câncer de colo uterino ocorre, principalmente, devido à infecção persistente do
Papilomavírus Humano (o HPV, da sigla em inglês) que, na maioria das vezes, é
transmitido por relação sexual.
Além disso, o que muitas pessoas desconhecem é que a transmissão
do HPV pode ocorrer também a partir do uso de objetos infectados, como
vibradores e outros objetos íntimos, explica Drª Mônica Stiepcich, médica
patologista membro da Sociedade Brasileira de Patologia (SBP) e especialista em
Patologia do Trato Genital Inferior.
“A contaminação indireta pode ocorrer através de objetos que não
foram desinfetados adequadamente. Algumas mulheres compartilham biquínis,
calcinhas, roupas de ginástica, entre outros, que não foram adequadamente
lavados com água e sabão. Também por meio de objetos sexuais, dos quais o uso
tem crescido nos últimos anos”, afirma Stiepcich.
Apenas no Brasil, segundo um levantamento feito pela Cortex
Intelligence, o número de empresas do chamado “bem-estar sexual” abertas bateu
um novo recorde em 2022, com 1.068 novos empreendimentos - uma alta de quase
35% em comparação ao ano anterior. O bem-estar sexual envolve produtos e
serviços como os ditos brinquedos eróticos, bem como cosméticos, lubrificantes,
massageadores e aplicativos, entre outros.
A especialista complementa que o HPV infecta mais facilmente pessoas imunossuprimidas ou aquelas que têm hábitos prejudiciais à saúde, como má alimentação, sono desregulado, tabagismo e consumo excessivo de álcool: “É o kit perfeito para o vírus se desenvolver. Por isso, é responsabilidade de cada mulher se cuidar, bem como dos homens, que podem pegar e transmitir o HPV”, alerta.
Desigualdades sócio-econômicas - O câncer de colo de útero é mais
frequente entre mulheres de países com baixo Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH), devido a fatores como a falta de acesso à informação sobre prevenção e a
serviços de saúde para diagnóstico e tratamento. Em países de dimensão
continental como o Brasil, dados do INCA informam que a doença é mais frequente
nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e em cidades cujo IDH é mais baixo.
“Temos diversos Brasis, com cidades onde o acesso ao sistema de
saúde é mais fácil e outras, não. De todo modo, os dados epidemiológicos para o
câncer uterino são preocupantes, pois colocam o Brasil, segundo a proporção da
população feminina com a doença, como um dos campeões de casos e dos óbitos. No
entanto, o maior número de notificações também acontece devido a termos
ampliado o acesso ao diagnóstico e ao tratamento”, analisa Stiepcich.
A especialista detalha que o câncer de colo do útero é altamente
prevenível através de relações sexuais mais seguras, com o uso da camisinha e
outros métodos preventivos e, especialmente, da vacinação contra o HPV: “Depois
de 15 anos da adoção em alguns países, vemos que a vacina para HPV reduziu
drasticamente o número de casos de câncer do colo uterino. No Brasil, a vacina
está disponível na rede pública”.
Ela esclarece que, apesar de ser a Infecção Sexualmente
Transmissível (IST) mais frequente, o HPV é traiçoeiro, pois nas mulheres cujos
exames citológicos ou moleculares evidenciam a presença do vírus, mesmo que já
tenha se desenvolvido uma lesão precursora, muitas vezes a doença não causa
sintomas. Daí a importância de se prevenir e estar em dia com o exame de
Papanicolau. Já nos casos de câncer cervical estabelecido, entre os sintomas
mais frequentes, estão dor para urinar, sangramento na relação sexual ou
eventualmente espontâneo, e corrimento com odor fétido.
Stiepcich informa, entretanto, que a grande maioria das mulheres
infectadas pelo HPV não desenvolve o câncer de colo de útero: “Cerca de 1% das
mulheres infectadas pelo vírus podem evoluir para o câncer. Assim, durante as
comemorações do Janeiro Verde, mês de conscientização e combate ao câncer de
colo uterino, é importante divulgar e disseminar o conhecimento de que a
infecção por HPV é o maior fator de risco para a doença. Por isso, é importante
prevenir e rastrear”.
Dados do Radar do Câncer analisados pelo Instituto Oncoguia
indicam que, no geral, considerando os tipos mais frequentes de câncer, em
2021, em torno de 62% dos pacientes no Brasil iniciaram o tratamento em estágio
avançado da doença. Na distribuição por gênero, 67,2% dos homens tiveram o
diagnóstico tardio, contra 59,4% das mulheres. Somente em relação ao câncer de
colo de útero, o INCA espera anualmente mais de 6 mil óbitos de mulheres.
Nesse sentido, em 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS),
lançou uma Estratégia Global para Acelerar a Eliminação do Câncer de Colo do
Útero que tem como metas audaciosas até 2030: a vacinação de 90% das meninas
até os 15 anos de idade; a realização de exames preventivos para 70% das
mulheres antes dos 35 anos e, novamente, antes dos 45 anos; e tratamento para
90% das mulheres diagnosticadas com a doença. De acordo com o órgão, a
implementação bem-sucedida poderia reduzir em 40% os novos casos da doença e
salvar 5 milhões de vidas no mundo até 2050.
Nova tecnologia na rede de saúde - Em 2024, o Ministério da Saúde
incorporou ao Sistema Único de Saúde (SUS) a testagem molecular para detecção
do vírus HPV e rastreamento do câncer do colo do útero. O objetivo é apoiar um
diagnóstico mais rápido e preciso. Entretanto, a tecnologia ainda não está
disponível em toda a rede de saúde e deve ser gradativamente implementada.
Atualmente, o exame mais difundido para prevenção e rastreamento
do câncer de colo uterino é o exame citológico, conhecido como Papanicolau,
disponível no SUS há várias décadas. Outros exames podem ser solicitados pelo
médico ginecologista e realizados, como a colposcopia e exames de imagem. Cabe
ao patologista a análise dos exames citológicos, bem como de amostras de tecido
(as biópsias) coletadas do colo uterino e a indicação do exame para detecção e
genotipagem do HPV, lesões precursoras ou o próprio câncer. Neste caso, o
patologista avalia o grau de agressividade e marcadores que predizem resposta a
determinados medicamentos, aspectos que irão orientar os ginecologistas e os
oncologistas a determinar o tratamento adequado.
O tratamento do câncer do colo uterino pode incluir cirurgia,
radioterapia, quimioterapia, terapia alvo e imunoterapia, realizadas
isoladamente ou combinadas, dependendo do estágio da doença, isto é, se o
câncer está localizado apenas no colo uterino, se atingiu outros órgãos ou se
desenvolveu metástases à distância.
“No Brasil o rastreamento molecular demorou a ser adotado, mas,
afinal, chegou. Em outros países a testagem molecular já é realidade há mais de
15 anos. A tecnologia irá complementar o rastreamento da infecção, com uma
triagem inicial mais segura e rápida, direcionando para os exames de
colposcopia casos com maior risco de terem lesões precursoras, ou mesmo o
câncer. Nessas avaliações, o médico patologista continua com papel fundamental
na análise dos materiais.”, conclui Stiepcich.
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