Data instituída em 1992, pela
Organização das Nações Unidas (ONU), é um lembrete de que toda forma de vida
tem valor e merece ser preservada
Biodiversidade é o nome que se dá à variedade de seres vivos que
ocupam determinada área, como uma cidade, um estado, um bioma ou o planeta
todo. Essa diversidade é composta de microrganismos, plantas e animais, dos
menores insetos aos maiores mamíferos – incluindo nós, seres humanos. O Dia
Internacional da Biodiversidade, celebrado em 22 de maio, foi escolhido pela
ONU como uma forma de nos fazer lembrar da importância de preservarmos as
diferentes formas de vida, que merecem ter seu espaço garantido em nosso
planeta. A data também nos convida a refletir sobre o quanto somos dependentes
de um meio ambiente equilibrado e a valorizar as contribuições práticas que as
outras espécies nos trazem, como na polinização das lavouras, enquanto fonte de
alimentos e remédios e na manutenção do clima e dos processos naturais.
Sabendo da importância da biodiversidade para todos nós, os
Institutos de Pesquisa da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios
(Apta), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de SP, realizam
diversas pesquisas que buscam aliar a produção com a conservação da fauna e
flora.
Entendendo e cuidando da vida nas águas brasileiras
Instituição da Apta voltada aos rios, mares, lagos e reservatórios, o Instituto de Pesca (IP-Apta) dedica atenção especial ao tema da biodiversidade nos ambientes aquáticos. Além de levantar informações sobre a riqueza de espécies de peixes e demais organismos presentes nas águas, as pesquisas buscam entender de que forma alterações nos ecossistemas podem impactar atividades produtivas, como a pesca.
“Temos realizado estudos em diversos tipos de rios de pequeno porte, onde se concentra 70% da diversidade de peixes brasileira. Muitos destes ambientes ainda são pouco conhecidos e já estão sujeitos a diferentes impactos ambientais, como assoreamento, lançamento de esgotos e uso do solo inadequado”, preocupa-se a pesquisadora do IP Katharina Eichbaum Esteves. Em sua pesquisa são feitos levantamentos da fauna de peixes, procurando correlacionar sua diversidade a diferentes características ambientais, como presença de vegetação ripária, tipo de substrato e qualidade da água. “Estas informações são importantes para identificar quais fatores ambientais favorecem a presença de uma determinada comunidade naquele ecossistema”, desenvolve.
Também pesquisadora do Instituto, Cacilda Thais Janson Mercante estuda a qualidade da água de ambientes aquáticos, visando caracterizar as relações entre os organismos e os chamados fatores abióticos (variações de temperatura, oxigênio, pH, entre outros). “Os organismos que eu estudo compõem a comunidade fitoplanctônica, comumente conhecidos como algas, grupos de microrganismos que possuem uma característica muito importante, pois realizam o processo de fotossíntese”, pormenoriza a especialista. Segundo Cacilda Thais, esse processo faz com que, por meio da luz solar, as algas produzam seu próprio alimento, ao mesmo tempo que geram oxigênio, que é liberado na água e pode ser utilizado pelos peixes. “Com relação à biodiversidade, temos muitas espécies de algas vivendo nos ambientes aquáticos e que são alimento para diversas espécies de peixes. Estudar e buscar manter a boa qualidade das águas significa preservar a biodiversidade aquática”, enfatiza.
As duas pesquisadoras alertam sobre o delicado equilíbrio dos
ecossistemas aquáticos e como muitas atividades humanas trazem impactos à
biodiversidade e podem interferir inclusive nos ciclos de pesca. “A poluição
aquática afeta diretamente a biodiversidade dos mais diferentes grupos de
organismos aquáticos. As algas são os principais indicadores de alteração na
qualidade das águas, sendo que sua biodiversidade diminui drasticamente com a
poluição”, exemplifica Cacilda Thais. “Outra questão é o desmatamento das matas
ciliares, que têm diversas funções ecológicas, como diminuir a erosão do solo e
manter a qualidade das águas dos rios e lagos que sustentam toda a vida
aquática”, acrescenta. No que diz respeito à pesca, Katharina sinaliza que os
impactos se dão de diferentes formas. “Existem interações entre predadores e
presas, ou seja, se uma determinada espécie é eliminada, há um efeito que pode
se propagar através de toda a cadeia alimentar”, destaca. “Estes impactos podem
ser causados pela introdução de espécies exóticas, poluição, desmatamento ou má
qualidade da água, entre outros fatores”, finaliza.
Sistemas Agroflorestais buscam perspectiva integral de
sustentabilidade
Partindo de um olhar abrangente da biodiversidade e sua
importância para nossa vida, a Apta Regional promove pesquisas e ações com foco
na agroecologia, integrando os aspectos ambientais, sociais e econômicos da
produção de alimentos. Ao lado de grupos de produtores, coletores de sementes e
coletivos populares, a Instituição criou, em 2022, a Rede Agroecológica
Regional (RAR), para reunir projetos de pesquisa e iniciativas que busquem
fomentar a produção de alimentos de base agroecológica, tendo como um de seus
eixos centrais a manutenção e resgate da biodiversidade. A RAR abrange tópicos
como produção orgânica, plantas medicinais e aromáticas nativas, o uso de óleos
essenciais e hidrolatos para insumos agropecuários, controle biológico e as
Plantas Alimentícias Não-Convencionais (Panc).
Nesse âmbito, um tema que recebe crescente atenção são os Sistemas
Agroflorestais (SAF), que aliam produção e preservação. “Os SAF contribuem com
a biodiversidade ao produzir simultaneamente em consórcio, ou em sequência
temporal, diversidade de plantas distribuídas na mesma área, inclusive podendo
resultar em ganhos significativos para a conservação das espécies”, explica o
pesquisador da Apta Regional de Pindamonhangaba Antonio Carlos Devide. “Há uma
diversidade de SAF, que podem focar desde a restauração ecológica de uma área
por meio do plantio de uma floresta com SAF biodiverso sucessional, até em
sistemas de produção intensiva alinhados com o mercado, como na agricultura
sintrópica, para obter diversidade de alimentos e produtos no curto espaço de
tempo”, complementa.
A ideia por trás do conceito é que o sistema se retroalimenta, com
as espécies presentes contribuindo para a manutenção de energia e nutrientes.
“Nos SAF a reciclagem de energia é circular e beneficia todos os organismos
vivos que atuam na cadeia alimentar em equilíbrio dinâmico, minimizando as
perdas”, detalha Devide. O uso das podas de algumas espécies de plantas como
adubos verdes para beneficiar outras de interesse econômico é um exemplo de
como essas inter-relações funcionam. “Do micro ao macrocosmo todos os seres se
beneficiam com a poda na agrofloresta. Os benefícios são visíveis, com o
crescimento de organismos decompositores que degradam a matéria orgânica e das
plantas que se beneficiam dos nutrientes reciclados, além do fluxo de animais
que buscam abrigo nos SAF”, diz o especialista, agregando que esses são
sistemas produtivos bastante resilientes, que suportam melhor eventos
climáticos extremos e outras adversidades.
O pesquisador da Apta Regional ressalta que a promoção da
biodiversidade é a chave para a agrofloresta, que, por sua vez, pode ser um
norte para atingirmos uma sociedade sustentável. “Proteger a biodiversidade é a
única via para se alcançar o equilíbrio biológico e, por isso, os SAF devem se
tornar a cada dia um caminho para uma melhor organização social, política,
econômica, ambiental e cultural”, conclui.
Controle biológico para agroecossistemas equilibrados
Os insetos e demais invertebrados não estão presentes nas lavouras apenas para causar danos. Eles fazem parte da biodiversidade em um agroecossistema e só passam a ser um problema quando este está desequilibrado. Pesquisas desenvolvidas pelo Instituto Biológico (IB-Apta) propõem uma forma bastante eficiente de usar recursos presentes na própria natureza para controlar as pragas e doenças dos cultivos, possibilitando que esse equilíbrio volte a ocorrer. “Nos ecossistemas agrícolas é possível as pragas serem controladas pelos inimigos naturais. Trata-se de uma tecnologia sustentável, conhecida por controle biológico, que tem insetos predadores, parasitoides e entomopatógenos como agentes de controle que atuam diminuindo sua densidade populacional”, aponta a pesquisadora do IB Terezinha Monteiro Cividanes.
A especialista cita como exemplos as joaninhas, as tesourinhas, que comem ovos da lagarta do cartucho do milho, e algumas espécies de percevejo, que predam lagartas desfolhadoras. Principal foco de pesquisa de seu trabalho, as joaninhas são importantes insetos predadores que, além de pulgões, consomem ácaros, cochonilhas, moscas-brancas entre outros. “Elas são extremamente vorazes e eficazes no controle de pragas, diminuindo os danos e os prejuízos econômicos ocasionados por esses organismos nas culturas agrícolas”, afirma Terezinha. Em consequência disso, a produção de alimentos é incrementada em termos de qualidade e quantidade.
A pesquisadora do IB acrescenta que, pelo fato de as joaninhas ocorrerem espontaneamente no ambiente, torna-se importante conhecer suas fases de desenvolvimento e hábitos de vida para preservá-las no sistema produtivo. “Em um ambiente agrícola, a diversidade de espécies de plantas é recomendável, pois assim a biodiversidade será maior. Nesse tipo de ambiente, a incidência de insetos benéficos, como os predadores, é incrementada”, elucida.
Terezinha lembra ainda que, dentro do contexto do equilíbrio
ecológico, inimigos naturais como as joaninhas são altamente sensíveis aos
defensivos químicos. Por isso, atenta para a importância de empregar esses
produtos somente quando realmente necessário e com orientação profissional. “Um
ambiente em equilíbrio, ou seja, onde as populações de pragas e de inimigos
naturais são mais ou menos constantes, proporciona sustentabilidade na produção
de alimentos, características que beneficiam o agricultor, o consumidor e o
meio ambiente”, encerra.
Guardião do patrimônio genético
Preocupado com o desenvolvimento sustentável, o Instituto de Zootecnia (IZ-Apta) possui um Banco Ativo de Germoplasma de Plantas Forrageiras (IZ-FOR) que estuda e preserva grande diversidade de espécies forrageiras tropicais. O banco reúne cerca de 286 acessos de gramíneas e 1585 acessos de leguminosas forrageiras, sendo considerado o maior da América do Sul. Cada acesso é composto por uma porção de sementes viáveis que contêm o material genético de determinada espécie, que assim é conservada para a posteridade.
A coleção teve início na década de 70, através de intercâmbios com outras instituições de pesquisa do Brasil e do exterior, e por meio de coleta. O principal objetivo é conservar os recursos genéticos dessas plantas forrageiras, preservando e fornecendo material biológico e informações associadas para pesquisa e desenvolvimento científico na área de zootecnia e garantindo que não serão eventualmente extintas. A seleção e o melhoramento dos acessos contidos no Banco Ativo de Germoplasma possibilitam o desenvolvimento de materiais economicamente viáveis e que atendam ao setor pecuário, que é destaque na economia nacional.
De acordo com a pesquisadora Luciana Gerdes, diretora do Centro de
Pesquisa e Desenvolvimento de Pastagem e Alimentação Animal do IZ, atualmente o
Instituto ampliou estudos para o lançamento de materiais genéticos de gramíneas
e leguminosas forrageiras em parceria com a iniciativa privada. “Buscamos
disponibilizar para pecuária nacional novos cultivares que atendam as
necessidades de mercado com relação ao aumento da produção eficiente de
alimentos, adaptabilidade às mudanças climáticas e eventos extremos e para uso
nos sistemas integrados de produção agropecuário”, relata.
Gustavo
Steffen de Almeida e Alexandra Cordeiro
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