Mineração de lítio, cobalto, ferro outros metais usados em baterias e estruturas provoca desmatamento, perda de biodiversidade, escassez e contaminação da água e emissão de carbono
A eletrificação da frota de veículos, considerada uma das
ações mais efetivas para diminuir as emissões de carbono e deter o aquecimento
global, está provocando um aumento da mineração, atividade que impacta
diretamente o meio ambiente.
A Dra. Anna Carolina Fornero Aguiar, pesquisadora brasileira
da Cátedra Unesco de Alfabetização em Futuros, afirma que já está em curso uma
corrida pela mineração principalmente de lítio – chamado de “ouro branco” – e
cobalto, metais necessários para a fabricação de baterias para carros elétricos
e outras formas de armazenamento de eletricidade.
O mundo vai precisar cada vez mais desses dois metais.
Segundo a bióloga, em 2050, em comparação com 2017 – quando a demanda era bem
próxima da atual –, a demanda por lítio será dez vezes maior e a por cobalto
seis vezes maior.
A transição energética demanda também o aumento da mineração
de grafite, paládio, níquel, molibdênio, cobre e manganês, além de ferro e
alumínio, necessários para as estruturas, por exemplo, de parques eólicos,
destaca Anna Aguiar, que é professora do Mestrado Profissional em Ciência da
Sustentabilidade da PUC-Rio.
“A principal reserva de lítio do mundo está no Salar de
Uyuni, o maior deserto de sal do planeta, localizado no sudoeste da Bolívia. A
mineração requer muita água e o Salar é um deserto, onde esse recurso é
escasso. Além da fragilidade hídrica, o Salar de Uyuni é patrimônio mundial da
Unesco, um santuário único da humanidade, visitado por turistas de todo o
mundo”, ressalta a bióloga.
Um dos impactos ambientais da mineração é o desmatamento.
Anna Aguiar cita o estudo Mining drives extensive deforestation in the
Brazilian Amazon (Mineração impulsiona desmatamento extenso na
Amazônia brasileira), de Laura J. Sonter, publicado em 2017, que avaliou as
perdas de áreas verdes no período de 2005 a 2015 em Carajás, que é onde está a
principal reserva de ferro do Brasil, e Porto Trombetas, a maior mina de
alumínio no país.
O trabalho demonstrou que o desmatamento foi ainda maior no
entorno do que dentro das áreas de concessões. Dentro das áreas, houve um
desmatamento de cerca de mil quilômetros quadrados. Já em um raio de 70
quilômetros a partir dos muros das empresas, o desmatamento chegou a cerca de
40 mil quilômetros quadrados, resultado da construção da infraestrutura
associada à atividade de mineração, como cidades e estradas. O estudo aponta
que a mineração foi responsável por 9% das perdas de área verde na Amazônia
entre 2005 e 2015.
Anna Aguiar alerta também para o impacto da mineração na
perda de biodiversidade. Ela cita outro estudo de Laura J. Sonter, Renewable
energy production will exacerbate mining threats to biodiversity (Produção
de energia renovável vai exacerbar as ameaças da mineração para a
biodiversidade), publicado em 2020, que identificou que 82% das áreas
continentais do planeta que têm esses minerais de extrema relevância para a
transição energética se sobrepõem às áreas importantes para a preservação da
biodiversidade, como parques e reservas.
Outro efeito ambiental negativo é o gasto de água excessivo
demandado pela atividade de mineração, que com frequência também causa a
contaminação da água por substâncias como o mercúrio, arsênio, cádmio e chumbo,
segundo a bióloga.
“Por fim, cabe salientar que a mineração tem uma pegada de
carbono alta e requer muita energia. A exploração do ferro responde, sozinha,
por entre 7% e 9% das emissões de gases de efeito estufa no mundo”, enfatiza
Anna Aguiar. “Para mim o ponto é esse: será que a gente não está trocando seis
por meia dúzia? Será que a gente não está apenas deslocando o problema?”
A entrevista completa com Anna Aguiar está na revista O Biólogo, do Conselho Regional de Biologia da 1ª Região, como parte de uma edição inteiramente dedicada a discutir a transição energética no Brasil. Link para a edição.
Salar de Uyuni, na Bolívia
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