Especialista
responde dúvidas mais comuns sobre a condição
O Alzheimer é um transtorno degenerativo comum e
incurável, com mais de 2 milhões de casos por ano apenas no Brasil. De acordo
com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a estimativa é que até 2030 o número
de pessoas afetadas pela condição possa chegar a 74 milhões de casos, e essa
projeção é ainda mais preocupante, com a possibilidade de alcançar 131 milhões
até 2050.
É mais comum em idosos, mas também pode afetar
pessoas mais jovens, como alguns casos recentes revelaram. Com a chegada do Dia da
Conscientização sobre Alzheimer, marcado para 21 de
setembro, tivemos a oportunidade de discutir os principais
aspectos do tema com o Dr. Bruno Della Ripa Rodrigues Assis, médico
neurologista e coordenador da Neurologia no Hospital Nipo-Brasileiro.
-O que é o Alzheimer e como ele age no cérebro?
R: A Doença de Alzheimer é uma doença de caráter
degenerativo e progressivo, sendo a principal representante de um grupo de
doenças denominada demências, manifestas por comprometimento das funções
cognitivas (ou seja, funções cerebrais responsáveis pelo processamento de
informações e realização de atividades complexas, apesar de cotidianas).
Especificamente para a Doença de Alzheimer, ocorre pela deposição de proteínas
anômalas dentro das células neuronais, predominantemente por placas da proteína
beta amilóide. Entre as funções cognitivas, a principal afetada é a memória,
porém com o envolvimento das demais no decurso da doença (como atenção, função
executiva, linguagem, entre outras).
-Quais são os estágios do
Alzheimer e como eles afetam progressivamente a função cognitiva e a vida
diária dos pacientes?
R: Os estágios da Doença de Alzheimer podem ser
caracterizados em Inicial/Leve, Moderado, Grave e Terminal (conforme
classificação do Ministério da Saúde), porém também frequentemente categorizada
a partir da escala CDR (Clinical Dementia Rating Scale), que acabam por se
equiparar, de certo modo. Tais classificações são algo arbitrárias, sendo a CDR
algo mais objetiva na sua avaliação. De modo geral, a classificação se dá a
partir, principalmente, do grau de acometimento da memória do indivíduo
acometido. Desse modo, no quadro inicial/leve (CDR 1), as alterações de memória
ainda são sutis e/ou não trazem prejuízos maiores ao cotidiano, apesar do
desempenho ser claramente afetado, inclusive com percepção de amigos e
familiares.
Nos quadros moderados (CDR 2), os esquecimentos
passam a ser mais frequentes, assim como o acometimento de outras capacidades
cognitivas de modo mais intenso, como problemas de função espacial e no
planejamento, dificuldades maiores na solução de problemas, tendência à maior
retração social e inabilidade na socialização, muitas vezes já demonstrando a
necessidade de supervisão de cuidados diários (atividades instrumentais de vida
diária - AIVD e básicas - ABVD). Com a evolução para os quadros graves e
terminais (CDR 3), as funções cognitivas ficam cada vez mais prejudicadas, de
modo a comprometer completamente a autonomia do indivíduo, inclusive sendo
comum encontrarmos pessoas acamadas e com internações repetidas por
complicações associadas à imobilidade e grande debilidade.
-Quais os principais sinais do
começo do Alzheimer?
R: Os sinais principais do início do quadro de
Alzheimer é o comprometimento da memória, em especial a episódica (ou seja,
para fatos ocorridos no tempo e no espaço na vida do indivíduo e do ambiente
que o cerca), principalmente quando essa manifestação passa a interferir no
cotidiano do indivíduo.
-Além da perda de memória,
quais são outros sintomas comuns que os pacientes podem experimentar à medida
que a doença progride?
R: Disfunções das habilidades visual e espacial,
comprometimento executivo (i.e., das funções necessárias para o planejamento e
gerenciamento de pensamentos e emoções), entre outros.
-Quais as principais
dificuldades dos pacientes com a condição e seus familiares?
R: As dificuldades maiores encontram-se no
envolvimento progressivo da memória, bem como na aceitação da condição enquanto
seu caráter degenerativo progressivo.
-O mal de Alzheimer é causado
apenas pela genética da pessoa ou há outros riscos?
R: A Doença de Alzheimer pode ter um componente genético
relevante, contudo tem um risco multifatorial, com fatores mutáveis e não
mutáveis, como a ocorrência de comorbidades, perda auditiva, transtorno
depressivo, insônia crônica, baixa escolaridade, entre outros.
-Existem fatores de risco
modificáveis para o desenvolvimento do Alzheimer, como estilo de vida e saúde
cardiovascular?
R: Sim, especialmente o tabagismo, hipertensão
arterial, dislipidemia, diabetes mellitus, obesidade e sedentarismo.
-Quais as principais novidades
e descobertas sobre a doença?
R: As principais novidades estão acerca de estudos
de medicamentos específicos, da classe dos anticorpos monoclonais,
especialmente o Adecanumab e Lecanumab. Tais medicações foram vistas como
tratamentos potenciais para casos iniciais/leves selecionados, ainda em estudos
quanto à sua segurança adequada para utilização em maior escala.
-Muito se fala sobre atitudes
do dia a dia que podem prevenir a doença, como por exemplo respirar lentamente,
determinados hábitos de sono. Até que ponto podemos levar isso em consideração?
R: De fato, a melhor possibilidade de prevenção da
doença é a adoção de medidas de mudanças no estilo de vida, priorizando-se a
prática habitual de atividades físicas, controle adequado de comorbidades,
higiene do sono adequada, alimentação saudável (especialmente baseada na dieta
do Mediterrâneo, composta por frutas e legumes, oleaginosas, ácidos graxos
poliinsaturados, como o azeite, além de ingestão de carnes magras como peixe e
frango e em preparo de cocção que evite frituras).
-Como é diagnosticada a
condição?
R: A condição é diagnosticada a partir de uma
história e exames clínico e neurológico minuciosos, com a aplicação de escalas,
além de exames de neuroimagem (como a ressonância magnética do encéfalo). Por
vezes, a adoção de medidas complementares, como avaliação neuropsicológica,
exames de imagem mais avançados (como PET-CT Cerebral) e uso de biomarcadores
(como o estudo de proteínas específicas no líquor) podem auxiliar na conclusão
de casos de maior dificuldade no diagnóstico assertivo.
-Com que idade seu início é
mais comum?
R: Em geral, a maioria dos quadros de Doença de
Alzheimer dá-se a partir dos 65 anos, com casos menos frequentes de início mais
precoce, por volta dos 50 anos. A depender da ocorrência intrafamiliar e idade
de início, pode ser importante a realização da investigação de causas genéticas
adicionais para o quadro, como nas heranças monogênicas, ou seja, com genes
específicos envolvidos no mecanismo da doença.
-O Alzheimer pode levar a
óbito?
R: Em geral, os desfechos de óbito nos pacientes
com doença de Alzheimer costumam ocorrer por complicações secundárias do
quadro, como pneumonias repetidas por microaspiração e infecções urinárias,
além de episódios adicionais como infarto, tromboembolismo pulmonar, arritmias
cardíacas e crises convulsivas prolongadas e não tratadas, entre outros.
Dr. Bruno Della Ripa Rodrigues Assis - médico
neurologista e coordenador da Neurologia do Hospital Nipo-Brasileiro.
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