A Organização Mundial de Saúde (OMS) define infertilidade como a incapacidade em conceber após um ano de atividade sexual regular, mas o tempo de espera pode ser encurtado para seis meses se a mulher tiver mais de 35 anos de idade. A recomendação reflete a queda significativa da capacidade reprodutiva feminina a partir dos 35 anos de idade que, apesar dos avanços da ciência, ainda não há como interromper nem reverter tal fenômeno. Junho é o mês dedicado à conscientização sobre infertilidade e tem o objetivo de alertar a população para o problema.
Os avanços científicos dos últimos 50 anos deram às
mulheres a possibilidade de controlar seu ciclo reprodutivo e escolher ou não a
maternidade, o número de filhos e de quando tê-los. Tal mudança de perspectiva
feminina aliada às mudanças socioeconômicas e culturais fez surgir um novo
padrão: o adiamento da maternidade. Infelizmente, o declínio da fertilidade já
começa naturalmente por volta dos 25-30 anos de idade, e segue acelerado após
os 35 anos, de forma que aos 41 anos as chances de infertilidade podem chegar a
50% aos 41 anos e 90% aos 45. Na verdade, as mulheres têm cerca de 400 dias ao
longo da vida para tentar engravidar.
A percepção das mulheres em relação à maternidade
também vem mudando em todo o mundo assim como no Brasil. Pesquisa recente,
feita pela farmacêutica Bayer, com apoio da Federação Brasileira das Associações
de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) revelou que, em nosso país, 37% das
mulheres não querem ser mães e, na União Europeia, o número pode chegar a 70%.
Por outro lado, muitas mulheres só se sentem prontas para encara o desafio da
maternidade quando se estabilizam no trabalho, o que em geral ocorre após os 35
anos de idade. Outra dificuldade é o acesso ao diagnóstico e tratamento
adequados quando há infertilidade. Estudos revelam que até 50% das pessoas com
infertilidade não chegam a buscar avaliação médica e até 25% desistem dos
tratamentos devido ao estresse. Entre os vários obstáculos, além do custo dos
tratamentos, é preciso conciliar os compromissos profissionais com a realização
de exames e procedimentos. Infelizmente, nem sempre as empresas têm programas
para apoiar seus funcionários nesta difícil jornada. Dados da literatura médica
revelam que a infertilidade é um problema vivido pela maioria das pessoas em um
silêncio solitário e profundamente doloroso.
Segundo a OMS, cerca de uma em cada seis pessoas
enfrentam dificuldades para engravidar em todo o mundo, portanto é provável que
na mesa de trabalho ao lado esteja alguém caminhado sozinho nesta longa jornada
em busca da construção da própria família. É preciso considerar ainda que o
desenvolvimento das técnicas de reprodução assistida abriu oportunidades de
maternidade e paternidade para casais homoafetivos, bem como para solteiros por
meio do uso da doação de sêmen e óvulos e até do útero de substituição
(“barriga de aluguel”). Assim, a jornada em busca do sonho da formação da sua
própria família envolve outras milhões de pessoas além dos que sofrem com a
infertilidade.
Investir no cuidado das pessoas que precisam buscar
tratamentos para alcançar a maternidade/paternidade traz benefícios inegáveis
para colaboradores e empregadores tais como redução do estresse no ambiente de
trabalho e retenção de talentos. Além disso, o acesso a informações sobre a
saúde reprodutiva é um direito humano fundamental estabelecido pela Declaração
Universal dos Direitos Humanos. Assim, é essencial orientar os jovens que assim
como planejam sua educação e suas carreiras, precisam aprender a cuidar da sua
saúde reprodutiva e, caso queiram, podem buscar ajuda especializada para
planejar a construção de suas famílias. Estabelecer uma linha de cuidados que
cubra não apenas o diagnóstico e o tratamento, mas que inclua medidas
preventivas é um passo primordial. Tabagismo, obesidade e dieta inadequada são
hábitos afetam adversamente a fertilidade. Por fim, a infertilidade não deve
ser vivida estoicamente em silêncio. Embora Sêneca nos ensine que “Os desgostos
da vida ensinam a arte do silêncio”, quando ao assunto é infertilidade, é
preciso romper o silêncio e buscar ajuda.
Márcia Mendonça Carneiro - Diretora científica Clínica Origen, Professora Titular-
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia – Faculdade de Medicina da UFMG
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