O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou a proposta que revisa a Lei de Improbidade Administrativa (Projeto de Lei 10887/18), o texto elaborado pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP). Uma importante mudança trazida pelo projeto de lei é a que estabelece punição apenas para agentes públicos que agirem com dolo, ou seja, com intenção de lesar a administração pública.
Conforme
destacado pelo Ministro Napoleão Nunes Maia no Agravo no Recurso Especial nº
1.296.981 – SP, “A Lei de Improbidade Administrativa, como todos sabemos, nasceu com a
finalidade de combater e sancionar as condutas dos agentes de atos que afetem a
moralidade e maltratem a coisa pública; os seus comandos, todavia, são bastante
abertos, havendo, portanto, a necessidade de utilizá-la com certa prudência, a
fim de que o próprio instrumento jurídico não seja enfraquecido e se torne
impotente, vulgarizando-se pelo excesso de sua utilização ou, até mesmo, que
seja utilizado como mero mecanismo de repercussão nos elementos de disputa e
competição eleitoral, por exemplo”.
A
alteração aprovada pela Câmara dos Deputados, no que pertine a exigência da
comprovação do dolo do gestor público para ser condenado por improbidade
administrativa por ato lesivo ao erário, veio para corrigir a amplitude da
redação originária do artigo 10 da Lei de Improbidade. O texto atual é um
espaço aberto para os excessos punitivos.
O
Ministro Napoleão pontuou que “A repressão às improbidades é como a repressão aos
crimes ou a repressão à criminalidade: deve ser feita com muita energia, mas
dentro dos parâmetros da legalidade estrita, porque se trata de Direito
Sancionador; no plano teórico, pode-se dizer que a função dos julgadores é
sobranceira a propósitos punitivos: os seus empenhos são orientados por um
ideal que transcende os objetivos imediatistas da sanção a qualquer custo; e
assim é porque nenhuma lei traz em si a mesma solução dos litígios de forma cem
por cento completa, mas somente e apenas sugerida, por isso toda solução de
disputas intersubjetivas deve conter elementos próprios e insubstituíveis da
realidade moral da disputa considerada, sob pena de incorrer em abstrações,
muitas vezes errôneas e frequentemente perversas: este é o pressuposto
essencial da necessidade da permanente atuação da autoridade judicial atenta e
isenta de compromissos explícitos ou dissimulados com a literalidade das leis
escritas”.
No
mesmo sentido o Ministro Luiz Fux asseverou: “É cediço que a má-fé é
premissa do ato ilegal e ímprobo. Consectariamente, a ilegalidade só adquire o
status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios
constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-fé do
administrador. A improbidade administrativa, mais que um ato ilegal, deve
traduzir, necessariamente, a falta de boa-fé, a desonestidade, o que não restou
comprovado nos autos pelas informações disponíveis no acórdão recorrido”.
Ressalte-se
que o artigo 10 da Lei 8429/93, em vigor, descreve como ato de improbidade por
lesão ao erário “qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que
enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação
dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei”.
Dessa forma, o texto atual estabelece que o agente público que age com culpa
(negligência, imprudência ou imperícia) deve ser considerado e maculado,
indistintamente, como desonesto e sofrer as severas sanções impostas pela lei
de improbidade.
O
projeto de lei altera essa idiossincrasia legislativa ao pontuar que apenas e
tão somente as ações ou omissões dolosas, que causarem lesão ao erário, serão
punidas com as severas sanções legislativa, as quais, inclusive, foram
majoradas na proposta aprovada pela Câmara dos Deputados.
Essa
importante alteração vai ao encontro da posição no Ministro Napoleão Nunes
Maia, senão vejamos: “Em face dessa situação, não se deve admitir que a
conduta apenas culposa renda ensejo à responsabilização do agente por
improbidade administrativa; com efeito, a negligência, a imprudência ou a
imperícia, embora possam ser consideradas condutas irregulares e, portanto,
passíveis de sanção, não são suficientes para ensejar a punição por
improbidade administrativa, devendo ser sancionadas com
outras penas, até para se atender ao requisito da proporção das coisas, tão
essencial no Direito Sancionador”.
Outro
ponto importante a ser destacado na alteração é o aumento das sanções impostas
ao agente público ímprobo.
Atualmente
a lesão ao erário por ato de improbidade o agente tem as seguintes penalidades:
“na
hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores
acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda
da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito
anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor
do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de
cinco anos”
Com
a alteração a sanção passa a ser de “perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente
ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão
dos direitos políticos até doze anos, pagamento
de multa civil equivalente ao valor do dano e proibição de contratar com o
Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,
direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual
seja sócio majoritário, pelo prazo não superior a doze anos”.
Há
outras alterações, como a que traz mudanças significativas na regra de
reconhecimento da prescrição, vão causar discussões acaloradas. O texto atual
prevê a seguinte redação: “até cinco anos após o término do exercício de
mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança”. Com a
alteração aprovada a prescrição terá o seguinte regramento: “Art. 23. A
ação para a aplicação das sanções previstas nesta Lei prescreve em 8 (oito)
anos, contados a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações
permanentes, do dia em que cessou a permanência”.
O
PL 10887/18 aprovado pela Câmara dos Deputados, agora, segue para o Senado
Federal. Vamos aguardar se os senadores mantem o corajoso texto aprovado pela esmagadora
maioria dos deputados federais e as importantes alterações legislativas.
Marcelo Aith - advogado
especialista em Direito Público e professor convidado da Escola Paulista de
Direito (EPD)
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