Onde existir, mundo afora (e onde não
existe?), um grupo de esquerdistas brasileiros, se alguém falar “Brasil”,
imediatamente aparecerá a cobrança de esclarecimento sobre o homicídio de
Marielle Franco, vereadora negra, favelada, homossexual. Como todos eles, eu quero
esse crime esclarecido, mas não posso deixar de reconhecer imensa hipocrisia na
maior parte dessas manifestações.
Em Berlim, Madrid, Nova Iorque, berrando
“Fascista!” a quem divirja de sua “amorosa e cordial” posição política, tais
militantes sustentam que no Brasil se prende demais e que nossa polícia é
violenta. Eles se opõem à majoração das penas e à redução da maioridade penal.
Defendem ardorosamente a manutenção do semiaberto e a indiscriminada progressão
de regime. São os mesmos que, pelo viés oposto, querem criminalizar o que
denominam homofobia (uma demasia, visto que todos os crimes praticados contra
homossexuais já são tipificados no Código Penal).
São
os mesmos, também, que defendem o desencarceramento e o desarmamento. Querem
Lula livre, são contra a Lava Jato, odeiam Sérgio Moro. Se opõem à prisão após
condenação em segunda instância, detestam policiais por princípio e são a favor
da desmilitarização das polícias militares. Entendem que incendiar ônibus para
intimidar os poderes públicos não é terrorismo. São os mesmos, por fim, que,
tendo apoiado os governos de esquerda no país, ao longo das últimas três
décadas, contribuíram com militância e voto para chegarmos aos 63 mil
homicídios anuais e aos níveis de insegurança com que fomos constrangidos a
conviver.
É quase impossível, lido os parágrafos
acima, não ver entre os paladinos de Marielle promotores do caldo de cultura em
que ocorreu sua execução: impunidade geral, desrespeito à ordem, estímulo aos
conflitos sociais e combate sistemático às bases da civilização ocidental. Para
completar o quadro caótico, desfilam pela maconha, querem liberação das drogas
e rejeitam qualquer um que, tendo autoridade, a exerça no cumprimento de seu
dever.
Haveria
muito menos bandidos em ação no Brasil se, nos últimos trinta anos, sob
governos de esquerda, nosso país tivesse adotado contra o crime políticas
rigorosas que agora essa mesma esquerda quer ver vigentes apenas para os
delitos de seu especial repúdio.
No Rio de Janeiro, segundo a Lupa
(agência de fact checking) de cada
cem homicídios ocorridos em 2016, apenas
6,5% foram esclarecidos. Esse número não é
diferente da média nacional, estimada em 6%.
Assim, para cada Marielle Franco,
Anderson Silva (seu motorista) e Juliane dos Santos Duarte (negra, gay,
favelada, policial e, talvez por isso, ignorada) cujos homicídios não foram
esclarecidos, outras 16 vítimas são jogadas na mesma vala comum dos casos não
elucidados. É contra isso que deveria estar protestando o verdadeiro anseio por
justiça! Só a não solução do crime contra Marielle, no entanto, ganha destaque
num país onde o próprio presidente da República, há seis meses, se recupera de
uma tentativa de homicídio não elucidado!
Muitos
daqueles que apontam a desgraça dessa sementeira de impunidade geral, são
dedicados membros do Ministério Público, policiais civis e militares. Mais raramente, são esforçados
professores de Direito. Remam contra a maré nesse ambiente onde se
processa a inversão essencial que transforma o criminoso em oprimido e sua
vítima em réu de ancestrais ou atuais culpas sociológicas.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense
de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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