publicado na revista Science descreve uma técnica que pode facilitar descobertas relacionadas tanto a mecanismos de doenças quanto a possíveis tratamentos.
Batizada
de MIDAS (sigla em inglês para diálise acoplada a espectrometria de massas para
a descoberta alostérica sistemática), a metodologia permitiu detectar 830
interações consideradas de baixa afinidade entre proteínas e metabólitos
(produtos do metabolismo das células), que dificilmente poderiam ser
descobertas pelos métodos até então existentes.
“As diferentes vias metabólicas trocam informações entre si e se
regulam, o que é muito importante para o metabolismo. No entanto, essas
interações são de baixa afinidade, muito difíceis de se detectar com as
técnicas usadas atualmente. É uma conversa muito sutil, como um cochicho”,
ilustra Maria Cristina Nonato,
professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo (FCFRP-USP) e coautora do artigo.
A pesquisadora foi convidada a fazer parte do estudo por conta do seu
trabalho – apoiado pela FAPESP – com a
fumarase, uma enzima com potencial para ser alvo farmacológico contra parasitas
como Leishmania e Trypanosoma<trypanossoma<
i="" style="margin: 0px; padding: 0px; border: none;">.
A proteína também tem relação com alguns tipos de câncer e doenças genéticas (leia mais em: agencia.fapesp.br/24367/).</trypanossoma<>
Segundo
Nonato, as técnicas atualmente usadas foram desenvolvidas para captar
interações dentro de uma mesma via metabólica, onde são muito mais evidentes ou
esperadas. A MIDAS tem uma sensibilidade maior e pode encontrar mesmo as
interações inesperadas, que passariam despercebidas por outras metodologias.
A MIDAS é baseada numa técnica bioquímica clássica conhecida como
diálise de equilíbrio, que faz medidas de afinidade de ligação para interações
entre receptores e ligantes. O grupo de Jared Rutter, professor da Universidade
de Utah e coordenador do estudo atual, publicou o primeiro piloto da
metodologia para estudo de interações entre proteínas e metabólitos em 2012.
A
plataforma publicada agora tem uma série de melhorias, que permitiram
identificar sistematicamente interações de metabólitos com mais de 200
proteínas humanas em um tempo relativamente curto.
Caminho
promissor
Para Kevin
Hicks, primeiro autor do estudo e pesquisador da Escola de Medicina da
Universidade de Utah, nos Estados Unidos, o trabalho, junto com outros
realizados recentemente por outros grupos, demonstra que existe uma profunda e
até então pouco valorizada rede conectando o metabolismo de pequenas moléculas
e proteínas funcionais.
“À medida que aprendemos mais sobre essa rede de interações, obtemos uma
nova compreensão de como as células respondem ao seu estado metabólico. Essas
interações, até então desconhecidas, vão proporcionar uma profunda compreensão
sobre o que é saúde e doença, além de contribuir para a descoberta de novos
tratamentos”, afirma à Agência FAPESP.
No
trabalho publicado agora, os pesquisadores focaram no metabolismo de
carboidratos, importante para a obtenção de energia por todos os seres vivos.
No entanto, a ferramenta tem potencial para o estudo do metabolismo de modo
geral.
“Uma das
estratégias para a busca de novos tratamentos se baseia na modulação da
atividade de proteínas e enzimas pela interação com pequenas moléculas. Essa é
uma busca constante da ciência que pode ser facilitada com esses estudos, uma
vez que revela não somente novas interações, mas novos mecanismos de modular a
ação de proteínas. Isso pode ser explorado desde já com os resultados obtidos,
mas ainda há muito espaço para ser ampliado”, explica Nonato.
Entre
todas as proteínas analisadas no estudo, em apenas duas delas foi possível
determinar a estrutura tridimensional, um passo importante para descobrir
possíveis moléculas que possam regulá-las. Uma delas foi justamente a fumarase
humana, para a qual foi descoberta e caracterizada a interação com o metabólito
AP-3, um componente do metabolismo de fosfonato.
Para a
determinação da estrutura 3D, foi utilizada a linha de luz Manacá, da nova
fonte de luz síncrotron brasileira do Sirius, localizada no Centro Nacional de
Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas.
Com o
trabalho, não apenas o grupo de Nonato pode seguir num caminho promissor para o
estudo de doenças causadas por parasitas, como outras equipes terão a
possibilidade de usar a biblioteca de interações resultante do estudo.
Pesquisadores podem ainda usar a MIDAS para encontrar novas interações no
metabolismo das células tanto em condições normais quanto frente a diferentes
patologias.
O artigo Protein-metabolite interactomics of
carbohydrate metabolism reveal regulation of lactate dehydrogenase pode
ser lido em: www.science.org/doi/10.1126/science.abm3452.
André Julião
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/nova-tecnica-pode-facilitar-a-descoberta-de-alvos-terapeuticos-e-mecanismos-de-doencas/41572/