As internações hospitalares sempre são
motivo de atenção para pacientes, médicos e familiares. Com a chegada da
Covid-19, o assunto está cada vez mais em evidência, e novas preocupações
começaram a surgir, como é o caso das infecções hospitalares, geralmente
causadas por vírus, bactérias e fungos. As infecções causadas por fungos podem
acometer principalmente os pacientes internados por tempo prolongado e com
sistema imunológico debilitado. Nessas situações um diagnóstico tardio ou até
mesmo a falta dele, chegam a levar muitos pacientes ao óbito.
O médico especialista Marcello Mihailenko Chaves Magri, infectologista do
Hospital das Clínicas da FMUSP, responde às principais dúvidas sobre o assunto,
confira:
Quais as principais infecções que podem ser adquiridas durante uma internação
hospitalar?
R: Vários microrganismos podem ser transmitidos dentro do ambiente hospitalar,
entre os quais, destacam-se as bactérias e os fungos. As infecções bacterianas
e as fúngicas podem apresentar altas taxas de morbidade e mortalidade. Outro
aspecto que merece destaque é que, muitas vezes, esses microrganismos podem
apresentar diferentes padrões de sensibilidade aos antimicrobianos.
O que são infecções fúngicas?
R: Os fungos são organismos eucarióticos, unicelulares ou multicelulares que
pertencem ao Reino Fungi. Se apresentam nas formas de leveduras, bolores ou
ainda podem ser dimórficos (bolores na temperatura ambiente ou leveduras dentro
do ser humano). Podem causar vários tipos de infecções nos seres humanos, desde
infecções superficiais (unhas, pele, cabelos e etc…) até infecções invasivas,
disseminadas.
Quais são as principais infecções fúngicas invasivas hospitalares e aquelas que
acometem pacientes imunodeprimidos?
R: O principal fungo que causa infecções fúngicas invasivas hospitalares é a
levedura do gênero Candida. Nos pacientes imunodeprimidos, especialmente nos
pacientes neutropênicos, com câncer hematológico e transplantados de células
tronco hematopiéticas, além de Candida, os fungos filamentosos (bolores) como
os do gênero Aspergillus e Fusarium são responsáveis por alta taxas de
letalidade. Nos pacientes com aids, em determinadas fases após o transplante de
órgãos sólidos, entre as infecções fúngicas oportunistas, destacam-se a
candidíase, a pneumocistose, a criptococose e a histoplasmose.
A mucormicose é uma infecção fúngica invasiva, rara, causada por fungos
filamentosos que, no Brasil, acometem mais frequentemente os pacientes
diabéticos descompensados.
Quais são os principais sintomas das infecções fúngicas invasivas? Quais
efeitos estas infecções causam no corpo?
R: Os sinais e sintomas das infecções fúngicas invasivas dependem de fatores do
hospedeiro e do fungo. Por exemplo, a criptococose, mais frequentemente causa
uma meningite/meningoencefalite subaguda ou crônica com ou sem acometimento
pulmonar. Pode causar febre, cefaléia, vômitos e dor na nuca. A aspergilose
pulmonar invasiva pode causar febre, queda do estado geral, tosse, falta de ar,
escarro com sangue e nos exames radiológicos de pulmão lesões pulmonares
importantes. A mucormicose pode causar mais frequentemente uma rinossinusite
grave podendo, se não diagnosticada precocemente, acometer a órbita e o
cérebro. Já a candidemia, que é a infecção por fungos do gênero Cândida, no
sangue se manifesta por quadros febris em pacientes internados nos hospitais,
especialmente após procedimentos cirúrgicos abdominais e internação prolongada
em terapia intensiva.
Qual o tipo mais grave de infecção fúngica? E o mais comum?
R: Todas as infecções fúngicas invasivas se não diagnosticadas e tratadas podem
levar o paciente ao óbito. Alguns exemplos importantes são:
Candidemia: pode se apresentar com febre e evoluir para sepse e choque séptico
se não tratada.
Aspergilose: é causada pelo fungo Aspergillus, presente no ar. No caso de
aspergilose invasiva, apresentação mais agressiva da infecção, o fungo se
espalha rapidamente pelos pulmões e, por vezes, atinge até cérebro, coração,
fígado ou rins pela corrente sanguínea.
Mucormicose: também podem causar infecções agressivas nos pulmões. Entretanto,
outras manifestações possíveis são infecções na face pelos seios nasais, no
cérebro, nos olhos e no aparelho gastrointestinal. Em casos avançados, a doença
pode ainda atingir múltiplos órgãos. Por conta disso, a mortalidade pela doença
pode evoluir de 30 a 80%, dependendo da infecção e do nível de
imunocomprometimento do paciente.
Neurocriptococose: é uma infecção fúngica extremamente grave especialmente nos
pacientes com aids, acometendo o Sistema Nervoso Central, sangue, pulmões, pele
entre outros órgãos.
Histoplasmose disseminada: essa infecção ocorre mais frequentemente nos
pacientes imunodeprimidos, especialmente nos pacientes com aids. É extremamente
grave e fatal nesses pacientes. Pode causar quadros clínicos muito semelhantes
à tuberculose disseminada. Pode causar doenças nos pulmões, fígado, baço, pele,
cérebro, medula óssea e etc.
Estas infecções costumam ser confundidas com outro tipo de diagnóstico? Quais?
R: As infecções fúngicas invasivas, dependendo do fungo e do hospedeiro, podem
apresentar quadros semelhantes às infecções por bactérias, micobactérias e
outros fungos, tumores ou doenças reumatológicas.
Qual é o sinal de alerta para o risco de uma infecção fúngica invasiva?
R: Existem micoses que são endêmicas em determinadas regiões, ou seja, muitas
pessoas daquela região poderão se infectar, embora uma minoria desenvolve a
doença. Existem vários fatores de risco que aumentam a chance de um indivíduo
adquirir uma infecção fúngica invasiva. Destacam-se os pacientes
imunodeprimidos e os pacientes hospitalizados, especialmente em terapia
intensiva.
Como podemos evitá-las?
R: Para as infecções fúngicas invasivas adquiridas no ambiente hospitalar
existem várias estratégias propostas pelas comissões de controle de infecção
hospitalar para reduzir as taxas de infecção de corrente sanguínea, campanha de
lavagem das mãos, pneumonia relacionada à ventilação mecânica entre outras.
Algumas situações específicas em pacientes imunodeprimidos está indicada
profilaxia com antifúngicos para evitar essas infecções.
Existe tratamento?
R: Os protocolos de tratamento existentes hoje compreendem medicamentos
antifúngicos e até mesmo a remoção cirúrgica dos fungos, quando necessário. No
caso da aspergilose, por exemplo, a terapia de primeira linha recomendada é
voriconazol ou isavuconazol, porém estudos comprovam que o isavuconazol
apresenta algumas vantagens farmacológicas que permitem o uso também por
pacientes criticamente enfermos no ambiente de UTI com insuficiência renal e
diálise. Existem situações onde os fungos podem ser resistentes ou o uso de
antifúngicos prévios podem selecionar cepas resistentes. Nessas situações, a
anfotericina lipossomal pode salvar o paciente com uma candidemia persistente,
por exemplo, em uso de equinocandina.
O paciente com COVID-19 está mais suscetível a pegar este tipo de infecção?
R: Os pacientes com as formas moderadas e graves da COVID-19 podem evoluir com quadros
inflamatórios importantes, fenômenos tromboembólicos, alterações nas barreiras
mucosas do trato digestório e lesões pulmonares que levam o paciente a
necessitar de oxigênio ou até ventilação mecânica e corticoide. Esses fatores
podem contribuir para um aumento do risco para desenvolver essas infecções. As
infecções fúngicas possuem uma incidência relevante, sobretudo, em pacientes
cujo sistema imunológico perdeu a efetividade no combate a doenças, em virtude
de outras condições clínicas, como é o caso de pacientes graves da Covid-19.
Figuram também nessa lista pacientes com aids, transplantados, pessoas que
passaram por cirurgias complexas, pacientes oncológicos submetidos a longos
períodos de tratamento com quimioterapia e aqueles submetidos a várias linhas
de antibioticoterapia e corticóides em ambiente de UTI.
Houve aumento de casos de infecções fúngicas após o início da pandemia de
Covid-19?
R: As infecções fúngicas invasivas mais relatadas desde o início da pandemia de
COVID-19 são candidíase invasiva, aspergilose e mucormicose. Desde 2020 vários
países têm dado destaque a essas infecções, como, por exemplo, Aspergilose na
Europa e México e mucormicose na Índia.
Recentemente, vimos notícias sobre a Mucormicose na Índia. Ele está de alguma maneira
atrelado à cepa indiana da Covid-19? Existe chances desse tipo de fungo se
desenvolver no Brasil também?
R: A mucormicose ganhou interesse mundial com o crescimento de casos de
Covid-19 na Índia, onde cerca de 15 mil casos de mucormicose foram documentados
recentemente. É uma micose invasiva envolvendo fungos filamentosos hialinos da
ordem Mucorales (Rhizopus sp, Mucor sp, Rhizomucor sp, Lichtheimia sp, entre
outros), que a imprensa vem denominando erroneamente como micose por
"fungos negros". A princípio não há nenhuma evidência que a cepa
indiana esteja relacionada aos casos de mucormicose. É Importante pontuar que
não é esperado que a mucormicose aqui no Brasil assuma a mesma proporção
que a observada na Índia. Antes do advento da Covid-19, a Índia já registrava
altas taxas de incidência de mucormicose. O elevado número de casos de
mucormicose em pacientes com Covid-19 na Índia pode estar relacionado, entre
outros fatores, com a elevada incidência de diabetes na população
desse país (muitos sem diagnóstico e tratamento), favorecendo o surto de
mucormicose nos pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e
em uso de elevadas doses de corticóides para tratamento da Covid-19.
Sobre Cresemba® (isavuconazol):
O isavuconazol é um antifúngico da classe dos azólicos, disponível nas
apresentações intravenosa e oral. É o antifúngico de primeira linha mais
completo para o tratamento da aspergilose invasiva e mucormicose. Combinação
única de eficácia, amplo espectro, formulações IV e orais intercambiáveis e
perfil de segurança. Já está disponível no Brasil, nos Estados Unidos, na
Europa, na Argentina e no Peru.
Sobre AmBisome® (anfotericina B):
A anfotericina B é um antibiótico antifúngico usado para tratar infecções graves
causadas por fungos. É usado para infecções fúngicas severas oportunistas e/ou
endêmicas e infecções fúngicas oportunistas sistêmicas.
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