Com alta de mais
de 70% nos primeiros seis meses de 2024, a recuperação judicial se torna uma
saída cada vez mais comum para empresas em crise. Especialistas alertam para a
importância da reestruturação preventiva e gestão financeira eficiente.
Os pedidos de recuperação judicial no Brasil
alcançaram um nível histórico no primeiro semestre de 2024, representando um
aumento de mais de 70% em comparação ao mesmo período do ano anterior, conforme
apontado por dados de uma consultoria especializada. Este fenômeno levanta
questionamentos sobre a viabilidade da recuperação judicial como solução para
empresas em crise. Para muitos negócios, este pode ser o último recurso antes
da falência, mas será sempre a melhor escolha?
O crescimento dos pedidos de
recuperação judicial
Em um cenário de instabilidade econômica, diversos setores têm sido atingidos por desafios estruturais que fragilizam sua saúde financeira. De acordo com especialistas, o número crescente de pedidos de recuperação judicial reflete a incapacidade de muitas empresas em arcar com suas obrigações financeiras, especialmente em setores como o comércio e a indústria, que sofreram diretamente com os efeitos da pandemia e das crises subsequentes.
"Vivemos o que eu chamo de terceira onda de
pedidos de recuperação judicial no Brasil", afirma Jéssica Farias,
administradora judicial e advogada especialista em reestruturação empresarial.
Ela destaca que, desde a implementação da Lei nº 11.101 em 2005, que rege a
recuperação judicial e a falência no Brasil, o país enfrentou três grandes
picos: o primeiro em 2009, após a crise financeira global; o segundo em 2016,
com o impacto da Operação Lava Jato; e agora, a ressaca da pandemia, que afeta
especialmente pequenas e médias empresas.
Recuperação judicial: solução
ou sintoma de uma crise?
A recuperação judicial é um processo legal que visa
reestruturar as finanças de uma empresa em dificuldades, permitindo que ela
continue suas operações enquanto negocia suas dívidas com credores. "Ela
tem como principal objetivo evitar a falência, preservando a função social da
empresa, como empregos, recolhimento de impostos e a circulação de produtos e
serviços", explica Farias. No entanto, ela alerta que, embora possa ser
uma solução viável, não é isenta de desafios.
Para Jéssica Farias, "a recuperação judicial
pode ser vista como uma solução de última hora para empresas que, muitas vezes,
demoram a reconhecer seus problemas financeiros". A especialista
acrescenta que a falta de uma gestão preventiva é um dos maiores problemas
enfrentados pelas empresas brasileiras, que acabam por recorrer à recuperação
judicial já em um estágio avançado com problemas de fluxo de caixa.
Setores mais afetados
Alguns setores da economia brasileira têm sido mais
impactados pelo aumento dos pedidos de recuperação judicial. Farias aponta o
comércio varejista, a construção civil e o setor de serviços como os mais
vulneráveis. "Esses setores dependem muito do fluxo de caixa e, com a alta
dos juros e a retração do consumo, muitas empresas enfrentam dificuldades para
manter suas operações", explica.
Dados da Serasa Experian mostram que as micro e
pequenas empresas foram as mais afetadas, correspondendo a 81% dos pedidos de
recuperação judicial no primeiro semestre de 2024. "Essas empresas são as
que menos têm capacidade de absorver choques econômicos prolongados e, por
isso, acabam mais suscetíveis ao endividamento excessivo", acrescenta
Farias.
Alternativas à recuperação
judicial
Apesar de ser uma ferramenta importante, a
recuperação judicial nem sempre é a melhor saída. Segundo Jéssica Farias,
existem outras alternativas, como o *early turnaround*, que consiste em uma
reestruturação preventiva. "Quanto mais cedo a empresa identificar sinais
de dificuldades e agir para corrigi-los, menores serão as chances de ela chegar
ao ponto de precisar de uma recuperação judicial", afirma.
Farias ressalta que a gestão preventiva e o
planejamento financeiro adequado são fundamentais para evitar crises mais
profundas. A implementação de mecanismos de controle financeiro, como
auditorias periódicas e a revisão constante de planos de negócios, pode
permitir que as empresas mantenham suas operações em equilíbrio e evitem a
necessidade de recorrer a processos de recuperação.
Com o aumento expressivo dos pedidos de recuperação
judicial no Brasil, surge a necessidade de discutir estratégias de prevenção e
gestão mais eficazes. A recuperação judicial, embora seja um recurso válido
para empresas em crise, não deve ser encarada como a única solução. "As
empresas precisam estar atentas aos sinais de dificuldade e agir rapidamente
para evitar que a situação se deteriore a ponto de não haver mais saída",
conclui Jéssica Farias.
Assim, a recuperação judicial é uma ferramenta que
pode ser bem-sucedida quando utilizada de forma consciente e estratégica, mas
deve vir acompanhada de uma reflexão profunda sobre a gestão e os rumos da
empresa.
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