Notas fiscais de compra de produtos e
documentos que comprovam vendas diárias são essenciais para reclamar com a Enel
e recorrer à Justiça. Há sentenças favoráveis às lojas
IMAGEM: Paulo Pinto/Agência Brasil
O tempo das chuvas em São Paulo
sequer começou para valer e já deu para sentir que, além dos consumidores,
donos de lojas, bares, restaurantes vão ter um problema a mais para enfrentar
neste final de ano: as interrupções no fornecimento de energia elétrica.
As perdas do varejo na Grande
São Paulo já estão na casa dos milhões de reais. Somente as fortes chuvas do
dia 11 de outubro, e a consequente falta de luz, resultaram num prejuízo de
quase R$ 100 milhões às lojas, de acordo com a Associação Comercial de São
Paulo (ACSP).
Essa estimativa levou em conta
o volume diário de vendas do comércio na região. Outras interrupções de
eletricidade ocorreram na cidade e até hoje há residências e estabelecimentos
enfrentando o apagão. Os prejuízos dos comerciantes, portanto, são ainda
maiores.
As perguntas que ficam diante
deste problema são o que os proprietários de restaurantes, lojas de roupas,
calçados devem fazer para serem ressarcidos e se há alguma legislação que os
proteja, já que está se tornando comum ter de fechar o estabelecimento por
falta de luz.
A relação entre a
concessionária de energia elétrica, no caso a Enel Distribuição São Paulo, e o
cliente é regulamentada pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) que,
em seu artigo 22, dispõe sobre os diretos dos consumidores, especialmente a
indenização e o ressarcimento de danos em caso de falhas na prestação de
serviços.
Existe também uma Resolução da
Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), de número 1.000/21, determinando
que a distribuidora, no caso, a Enel, deve restabelecer o fornecimento de
energia em até quatro horas, sem qualquer ônus para o cliente, devendo também
ser creditada a compensação pela falta do serviço não entregue no período.
“Tem-se, portanto, que a
responsabilidade da concessionária é objetiva, obrigando-a a responder pelos
danos que decorrem da falha na prestação do serviço, não sendo possível alegar
caso fortuito para se eximir de qualquer responsabilidade”, afirma Talita
Veloso Dias, advogada do escritório Cerveira & Associados.
NOTAS
FISCAIS
A dica que ela dá para os
comerciantes é guardar todas as notas fiscais de compras de produtos e também
manter organizado o fluxo de caixa, entrada e saída de dinheiro da loja.
É a partir desses dados que os
juízes conseguem calcular o quanto a loja deixou de faturar no momento em que
ficou sem eletricidade.
“Sem as notas fiscais dos
produtos adquiridos, as comprovações das vendas e os números de protocolos de
contatos feitos com a Enel, os empresários não conseguem ser atendidos. A
empresa vai dificultar ao máximo para fazer qualquer ressarcimento”, afirma.
LOJA GANHA
AÇÃO
A UV.LINE Comércio e Serviços
de Artigos de Proteção Solar, localizada em Moema, decidiu ir à Justiça contra
a Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A (razão social da Enel
Distribuição São Paulo) por danos materiais e morais causados no final de 2023.
A loja alega que ficou sem
energia elétrica do dia 3 ao dia 8 de novembro do ano passado, o que lhe causou
um prejuízo de R$ 36 mil, valor que pede de ressarcimento, já que fatura, em
média, R$ 6 mil por dia, além de uma indenização de R$ 10 mil por danos morais.
No último dia 15 de outubro
veio a decisão da Justiça. A juíza Marina Balester Mello de Godoy, da 14ª Vara
Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, julgou procedente a ação.
A Enel foi condenada a pagar à
UV.LINE R$ 30 mil por danos materiais e R$ 10 mil por danos morais, com
correção monetária e juros, desde a data da citação (20/08/24). A Enel tem
prazo de 15 dias para recorrer.
Em defesa da loja, a juíza cita
que a “ré é concessionária de serviço público federal de fornecimento de
energia elétrica e, nessa condição, submete-se também à normal do artigo 37,
parágrafo 6º da Constituição Federal, sendo-lhe aplicada a teoria da responsabilidade
objetiva da administração.”
Em caso de atuação que cause
danos a terceiros, diz ela, as pessoas jurídicas de direito público ou privado
respondem por eles, ficando obrigadas aos reparos.
A demora na solução, afirma a
juíza, caracteriza falha na prestação do serviço, uma vez que medidas mais
eficazes poderiam ter sido adotadas para minimizar os danos à consumidora.
“Importa salientar que, em que
pese a ré afirmar que destina investimentos para a realização de podas e
manutenção de árvores, reformar da rede de fiação elétrica, é certo que ainda é
insuficiente, sendo certo que, a cada evento climático que ocorre na cidade, o
cenário, quase sempre, é o mesmo: diversos pontos da cidade sem energia elétrica
por dias, acarretando incontáveis prejuízos aos consumidores.”
Lyonel Pellegrino, dono da
UV.LINE, com 18 lojas próprias e 12 franquias espalhadas pelo país, diz que
lojas em São Paulo enfrentam há algum tempo a falta de energia, mas não por
período tão longo como aconteceu no ano passado com a loja de Moema.
“A nossa preocupação agora é
com o final de ano, pois, qualquer dia que se perde de venda não se recupera, é
prejuízo. Neste ano até demos sorte, não ficamos tanto tempo sem luz.”
Antes de recorrer à Justiça,
diz, a loja tentou contato com a Enel. “Mas eles não deram abertura para um
acordo. Faltou sensibilidade comercial”, afirma.
No ano passado, a Justiça
também foi favorável ao açougue Frigo Lenga Comércio de Alimentos Eireli, com
base em uma ação de abril de 2022. Mais de um ano depois, em novembro de 2023,
a Enel teve de pagar ao comerciante R$ 78.923,74 por danos materiais.
“Cada vez mais os tribunais
estão favoráveis ao reembolso, com proteção às pessoas físicas e jurídicas. Mas
tem de comprovar, por isso a importância de ter toda a documentação necessária
para mostrar o prejuízo”, afirma Talita, do Cerveira Advogados.
Quem está no momento de reunir
a documentação é Robson Motta, proprietário de uma área de 6 mil metros
quadrados, na Vila Liviero, para locação de quadras de futebol e eventos e que
também conta com uma loja de material esportivo e uma lanchonete.
O espaço ficou fechado de 11 a
14 de outubro por falta de energia, justamente o período de maior faturamento
do empresário. O prejuízo em locação e vendas, diz Motta, foi da ordem de R$ 30
mil e mais R$ 10 mil em produtos que estavam em geladeiras e freezers.
“Nos últimos 20 anos, só faltou
energia umas duas vezes, e voltou rapidamente. Desde 2020, estamos tendo muito
problema com interrupções, que estão se agravando”, diz ele.
O final de ano é um dos
melhores períodos de faturamento de Motta, justamente por conta de eventos e
férias escolares.
Para não correr mais o risco de
ficar sem funcionar, o empresário deverá alugar geradores para o período de
novembro a janeiro, o que deverá obrigá-lo também a mexer em fiações elétricas.
“Vou cobrar tudo isso da Enel,
uns R$ 15 mil de produtos que estragaram, R$ 35 mil que deixei de receber de
locação e mais R$ 18 mil de aluguel de geradores, fora o valor do combustível.”
Talita diz que a demanda de lojistas para saber o que fazer para ter ressarcimento por prejuízos causados pela falta de luz está crescendo, e de todos os setores, não somente de alimentação.
Fátima Fernandes
https://dcomercio.com.br/publicacao/s/veja-o-que-e-preciso-para-ir-a-justica-e-cobrar-por-danos-do-apagao
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