Levantamento
do Conselho Federal de Medicina (CFM) revela a falta de condições de
funcionamento de cursos de medicina nessas localidades, que se autorizados
podem comprometer a qualidade de formação dos futuros profissionais.
No Brasil, no momento, há 294
processos de pedidos para abertura de novas escolas de medicina em andamento no
Ministério da Educação. Eles se distribuem por 182 municípios, sendo que 130
deles já sediam pelo menos um estabelecimento de ensino desse tipo. Os dados
fazem parte de levantamento realizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM)
que será apresentado nesta quarta-feira (9), em sua sede, em Brasília (DF).
Os dados serão expostos na abertura
do I Encontro das Escolas Médicas Acreditadas. Durante o evento, integrantes do
Sistema de Acreditação de Escolas Médicas (SAEME-CFM) entregarão certificados a
mais 12 escolas do País que passaram por avaliação de qualidade. No total, já
são 52 escolas certificadas.
Processos – O
levantamento feito pelo Conselho traz informações sobre as falhas na
infraestrutura de atendimento em saúde nos municípios que se candidataram a
abrigar escolas. Dentre os itens avaliados estão parâmetros considerados
essenciais para o bom funcionamento de um curso, como números insuficientes de
leitos de internação do SUS, de Equipes de Saúde da Família (ESF) e/ou presença
de hospitais de ensino.
Entre os 182 municípios candidatos a sediar novas escolas médicas, um total de 132, ou seja, 73%, apresentam déficit nestes itens. Para o CFM, o ideal é que uma cidade que sedia uma faculdade de medicina tenha pelo menos cinco leitos públicos para cada aluno; três alunos no máximo para cada equipe de saúde da família; e um hospital ensino ou unidade hospitalar “com potencial para hospital de ensino”.
Dessas 130 cidades que já sediam uma escola médica e
poderão receber novas turmas, 62% não têm nenhum hospital de ensino e 35% não têm
registro de ESF suficientes para atender os alunos que já cursam medicina. Além
disso, 53% desses municípios têm despesa total pública em saúde (verba da
União, estados e munícipios) inferior à média per capita nacional, que é de R$
1.383.
Hospital de ensino – Do restante dos municípios que estão na lista do MEC para
receber novos cursos ou escolas médicas, ou seja, 52 cidades, nenhuma
disponibiliza sequer um hospital de ensino. Cerca de 51% delas têm despesa
total pública per capita em saúde inferior à média nacional. Um dos municípios,
Cachoeirinha (TO), por exemplo, não tem nem leito de internação do SUS – e
dispõe apenas de uma equipe de saúde da família.
O levantamento do CFM aponta ainda a faixa populacional do destino
de instalação dos cursos nos 182 municípios do país. A imensa maioria está em
cidades com menos de 500 mil habitantes: 12 (7%) municípios têm até 50 mil
habitantes; 34 (19%) têm entre 50 mil e 100 mil habitantes; 93 (51%) têm entre
100 mil e 500 mil habitantes; 26 (14%) têm entre 500 mil e 1 milhão de
habitantes; e 17 (9%) têm mais de 1 milhão de habitantes.
A tabela a seguir mostra quando os pedidos para abertura de novas
vagas e escolas médicas foram protocolados no MEC:
O presidente do CFM, José Hiran Gallo,
alerta que, caso as solicitações sejam aceitas pelo MEC, o Brasil, que tem hoje
390 escolas médicas em funcionamento, passará a contar com 682. “Um número tão
absurdo que será praticamente o dobro do total de escolas existentes na Índia,
uma nação com sete vezes mais habitantes do que o Brasil”, disse.
Ele ressaltou que as estruturas de leitos, ESF e hospitais de ensino devem estar presentes nas localidades com escola médica, favorecendo a criação de um ambiente favorável à formação adequada dos futuros profissionais. “Sem essa disponibilidade, a qualidade do ensino fica comprometida. Estamos diante de uma encruzilhada colocada pelo governo que, com suas decisões, quer impor ao país uma assistência de péssima qualidade, jogando por terra a credibilidade da medicina brasileira, considerada até então como uma das melhores do mundo”, avalia Gallo.
Radiografia – O dado divulgado nesta quarta-feira não destoa do cenário atual
no ensino médico brasileiro. Em maio, a Autarquia já havia revelado que 78% dos
250 municípios que sediam as 390 escolas médicas em funcionamento no país
apresentam números insuficientes de leitos de internação, de ESF e de hospitais
de ensino.
Juntos, esses 250 municípios abrigam 288 estabelecimentos de
ensino superior de medicina, o que corresponde a 31 mil vagas (71% das 43 mil
existentes no País). Em outras palavras, das 390 escolas em funcionamento, um
total de 288 estão em áreas cuja infraestrutura não suporta sua presença. Os
dados no formato de dashboards estão disponíveis AQUI.
Decisão do STF – Os números apresentados pelo CFM ganham relevância diante de
decisão tomada em junho pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Na ocasião, a
Corte decidiu, no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC)
81 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7187, que novos cursos de
medicina só serão abertos em municípios que ofereçam os critérios estabelecidos
pela Lei do Mais Médicos, que em sua última formatação reconheceu parte dos
critérios defendidos como ideais pelo CFM e pelas entidades médicas.
Contudo, para o presidente do CFM, os ministros da Suprema Corte
deixaram uma janela aberta e autorizaram que processos que tinham sido
iniciados administrativamente antes dessa decisão pudessem ter seguimento em
sua análise.
“Desse modo, o trabalho feito pelo CFM dá a dimensão risco a que está sendo submetido o ensino médico no País. Essa decisão terá consequências imprevisíveis. Percebe-se o delineamento do caos, trazendo insegurança, inclusive para os pacientes, e ameaçando a credibilidade e a confiança dos brasileiros na medicina”, afirmou José Hiran Gallo.
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