Opinião
Com a promessa de promover a justiça social e de
redistribuir a riqueza, em 1999 o tenente-coronel Hugo Chávez assumiu a
presidência da Venezuela. Chávez fundou o Partido Socialista Unido da Venezuela
(PSUV) e iniciou uma série de reformas políticas e econômicas, incluindo a
nacionalização de indústrias-chave como petróleo, telecomunicações e energia
elétrica. Seu governo também tentou expandir programas sociais, utilizando a
renda do petróleo para financiar iniciativas de saúde, educação e habitação.
Com a estatização dessas indústrias, os recursos escassearam e o país iniciou
um declínio econômico que permanece até hoje.
Chávez governou até sua morte, em 2013, durante um
período em que o crescimento econômico da Venezuela dependia das altas globais
no preço do petróleo. O período chavista também se caracterizou pela erosão das
instituições democráticas, concentração de poder e restrições à liberdade de
imprensa. Após a morte de Chávez, Nicolás Maduro, seu vice-presidente e sucessor
designado, continuou com as políticas bolivarianas, mas enfrentou um cenário
econômico muito mais desafiador devido à queda dos preços do petróleo, má
gestão econômica e corrupção endêmica. A crise econômica resultou em
hiperinflação, escassez de alimentos e medicamentos e uma grave crise
humanitária que levou milhões de venezuelanos a emigrar. Atualmente, estima-se
que entre um quarto e um terço da população do país tenha buscado outras nações
para viver – e o êxodo de venezuelanos é considerado uma das maiores crises
migratórias da região.
A combinação de políticas econômicas mal
planejadas, corrupção e um ambiente político repressivo resultou, como se pode
perceber, num profundo empobrecimento do país e de sua população. Apenas no
período Maduro, o PIB do país contraiu mais de 80%, a inflação atingiu níveis
astronômicos e os serviços básicos entraram em colapso. Boa parte da população
depende de ajuda humanitária. Mais de 90% dos venezuelanos estão em situação de
absoluta miséria.
É nesse contexto de empobrecimento e bolivarianismo
que ocorreu a eleição venezuelana deste final de semana. Embora o pleito tenha
ocorrido no domingo, 28 de julho – data escolhida por ser o aniversário de Hugo
Chávez –, a perseguição aos opositores, característica do país desde
1999, começou muito antes, com a habitual desqualificação dos candidatos de
oposição.
Maria Corina Machado, uma das figuras mais
proeminentes da oposição, foi impedida de concorrer por uma decisão do Tribunal
Supremo de Justiça, que a acusou de envolvimento em uma conspiração para
desviar ativos estatais. Com a desqualificação de Maria Corina, o candidato
oposicionista Edmundo González Urrutia emergiu como o principal adversário de
Maduro. González, um diplomata e acadêmico, capitalizou a frustração generalizada
entre os venezuelanos devido à crise econômica e à deterioração das condições
de vida sob o governo de Maduro.
As eleições presidenciais na Venezuela são regidas
por um conjunto de normas e procedimentos estabelecidos na Constituição da
República Bolivariana da Venezuela e supervisionadas pelo Conselho Nacional
Eleitoral (CNE). As eleições presidenciais são realizadas a cada seis anos, e o
CNE é responsável por convocar as eleições, definir o calendário eleitoral e
assegurar a logística necessária para a realização do pleito. A Venezuela
utiliza um sistema de votação eletrônica com a impressão do voto dado pelo
eleitor. Após o encerramento da votação, as urnas eletrônicas enviam os
resultados para um centro de totalização, e o CNE é responsável por anunciar os
resultados oficiais. Em teoria, os resultados devem ser divulgados de forma
rápida e transparente. Não foi o que ocorreu.
Às vésperas do pleito, as pesquisas indicavam uma
vantagem de mais de 40% para González – que tinha 59% das intenções de voto
contra pouco mais de 14% de Nicolás Maduro. Tanto as pesquisas eleitorais
quanto o acordo de Barbados – assinado entre governo e oposição da Venezuela, e
que trazia o comprometimento de eleições livres, justas e abertas – foram pelo
ralo.
Diversas seções eleitorais foram fechadas
antecipadamente, o que impediu muitos eleitores de exercerem seu direito ao
voto. Esse fechamento antecipado foi criticado por observadores internacionais
e organizações de direitos humanos, que alegaram que tal ação poderia ter sido
uma manobra para reduzir a participação dos eleitores oposicionistas,
especialmente nas áreas urbanas onde a oposição é mais forte.
Após o fechamento das urnas, houve um atraso
significativo na divulgação dos resultados. A Comissão Nacional Eleitoral (CNE)
não divulgou os votos por mesa e seção eleitoral, alimentando suspeitas de
fraude e manipulação dos resultados eleitorais. Apesar das pesquisas, os
resultados oficiais declararam Nicolás Maduro como vencedor com mais de 51% dos
votos. Estados Unidos, Chile e Peru contestaram os dados oficiais. Em apoio a
Maduro, Rússia, Nicarágua e Cuba celebraram sua vitória. No ano em que mais de
2 bilhões de pessoas vão às urnas pelo mundo, é cada vez mais claro como o
termo e a ideia da democracia são utilizados para legitimar eleições
fraudulentas e líderes totalitários.
Nenhum comentário:
Postar um comentário