Psicóloga diz que falar sobre o assunto com responsabilidade e cuidado não induz ou reforça os pensamentos suicidas, pelo contrário, ajuda na prevenção
A passagem do cantor canadense Justin Bieber pelo Rock in Rio e o cancelamento dos outros shows que faria no Brasil, Chile e Argentina expuseram um fato incontestável: é urgente falar sobre saúde mental e depressão.
Sem
condições de continuar a turnê Justice World Tour, o astro pop interrompeu a
agenda por tempo indeterminado para cuidar de si. Ainda assim, em pleno
Setembro Amarelo, mês dedicado à prevenção do suicídio, a condição de saúde do
astro pop virou meme nas redes sociais.
Em
2020, o artista revelou que teve depressão e enfrentou pensamentos suicidas
durante a adolescência, expondo sua história no documentário “Justin Bieber: Next
Chapter”. Ao longo da carreira, teve outros problemas de saúde e agora, aos 28
anos, sai de cena mais uma vez para cuidar da saúde mental.
De
acordo com a Organização Mundial da Saúde, o suicídio é a segunda principal
causa de morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos, um período de grande
turbulência e mudanças. “As dificuldades de transição para a vida adulta podem
levar a um sofrimento psíquico e ao isolamento do jovem da família e dos seus
pares”, alerta a psicóloga Daniela Jungles, supervisora do Serviço-Escola de
Psicologia do UniCuritiba – instituição da Ânima Educação, uma das principais
organizações de ensino superior do país.
Para reverter as estatísticas, a
professora garante: falar sobre suicídio é uma oportunidade para quebrar tabus
e permitir que as pessoas se sintam encorajadas a pedir ajuda. “Precisamos,
sim, falar sobre depressão e suicídio, mas não de qualquer jeito. Essa questão
deve ser tratada com responsabilidade e conhecimento, sem banalização.”
Grupos de risco
A
imaturidade do sistema nervoso, explica Daniela Jungles, torna os jovens
extremamente impulsivos e vulneráveis. Em muitos casos, os adolescentes
enxergam o suicídio com uma solução permanente para problemas que, na verdade,
são apenas temporários. “Sem contar a pressão da modernidade que gera falta de
autoconfiança, confusão de ideias e pressão para ter sucesso sempre. Para os
jovens, toda essa pressão pode comprometer a sua saúde mental.”
Mestre
em Ciências da Educação pela Université de Sherbrooke (Canadá), ela afirma que
perguntar diretamente se uma pessoa está pensando em suicídio não vai sugerir
ou reforçar a ideia, mas abrir a porta para a expressão do sofrimento.
“Pessoas
com ideação suicida ficam aliviadas com a possibilidade de compartilhar o fardo
de tais pensamentos. Todos podem, um dia, se deparar com a grande angústia de
uma pessoa com pensamentos suicidas. Para ajudá-la, nós precisamos ouvi-la sem
julgamentos e orientar a busca de um suporte profissional.”
Ao
contrário do que a maioria imagina, o primeiro passo para vencer os mitos e
tabus que cercam o assunto é entender que a depressão não é uma escolha. “O
suicídio é, na verdade, uma não escolha. A pessoa não consegue enxergar outra
saída para acabar com o sofrimento”, comenta a psicóloga.
Causas
do suicídio e fatores de proteção
Pesquisas
em suicidologia mostram que mais de 90% das pessoas que cometeram suicídio
sofriam de um ou mais problemas de saúde mental, como depressão, ansiedade,
vícios, esquizofrenia etc., mas o evento suicida, segundo a professora Daniela
Jungles, é um fenômeno muito mais complexo.
“O
suicídio envolve fatores psicológicos, sociais, biológicos, culturais e
ambientais. A existência de um problema de saúde mental pode ser um dos fatores
de risco, mas não um determinante”, afirma.
Uma
das formas de proteção apontadas pelo Fórum Brasileiro de Suicidologia está,
justamente, na conexão com familiares, comunidade, amigos e instituições
sociais. Os cuidados com a saúde comportamental, autoestima e um senso de propósito
ou significado de vida se somam à lista.
Outros fatores de prevenção são o
desenvolvimento de habilidades para o enfrentamento dos problemas e a
capacidade de se adaptar às mudanças e circunstâncias da vida, assim como
crenças culturais, religiosas ou pessoais que desencorajam o suicídio.
Ajuda especializada
Diante
de uma pessoa em crise suicida ou com pensamentos suicidas, falar sobre o
assunto é o primeiro passo. O segundo é indicar o auxílio de profissionais
habilitados. O importante é saber que uma pessoa em crise suicida pode ser
ajudada. “Na maioria dos casos, com os devidos cuidados, os pensamentos
suicidas cessam”, diz a supervisora do Serviço-Escola de Psicologia do
UniCuritiba.
A
especialista revela que pensamentos suicidas são, muitas vezes, um estado
mental temporário e, mesmo que uma pessoa esteja mal por bastante tempo, a
crise suicida geralmente tem duração limitada. “Oferecer uma escuta atenta e
apoio emocional a uma pessoa vulnerável pode, portanto, reduzir o risco de
suicídio.”
Pedido
de socorro
Segundo
Daniela, é um erro pensar que alguém com ideação suicida não dá indícios. “A
ameaça de suicídio deve ser levada a sério e não pode ser vista como
manipulação ou necessidade de chamar a atenção. A pessoa que faz isso está
realmente sofrendo e precisa de ajuda. Ameaças de suicídio são pedidos de
socorro.”
Outro
ponto de atenção são as ameaças repetidas ou que se estendem por um longo
período. “A repetição da mensagem pode dessensibilizar as pessoas ao redor para
a importância e a gravidade da situação, o que é outro equívoco. ”
Como
falar com as crianças
Dizer
a verdade às crianças é importante, o segredo está na escolha das palavras.
Como a compreensão da morte e do suicídio varia de acordo com a idade, a
conversa deve ser conduzida de forma simples, verdadeira e clara. “Evite
explicações vagas, mas também evite detalhes mórbidos. A dica é respeitar a
curiosidade da criança e deixar que ela traga suas perguntas”, finaliza a
professora do UniCuritiba.
UniCuritiba
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