Estudo desenvolvido por pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz pode ser útil tanto para a vigilância epidemiológica quanto para o tratamento dos doentes. Resultados foram publicados na revista PLOS ONE (pneumococo observado por microscopia; imagem: Ivana Campos)
Estudo publicado na
revista PLOS ONE pode, no futuro, ajudar os profissionais
de saúde a determinar se bactérias da espécie Streptococcus pneumoniae que
causam meningite – inflamação nas membranas que envolvem o cérebro e a medula
espinhal – são resistentes a algum tipo de antibiótico.
Até então,
essa não era uma tarefa fácil. Requeria isolar o microrganismo na amostra do
paciente e analisá-lo ainda vivo – algo difícil, já que a bactéria é sensível
e, na maior parte das vezes, não suporta a viagem até o laboratório.
Para
contornar o problema, pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz – Laboratório
Regional de Santo André (SP) – elaboraram uma nova forma de fazer essa análise.
Entre 2014 e 2020, o grupo recebeu 873 amostras de líquido cefalorraquidiano
(líquor) de pessoas com suspeita da doença em centros de saúde de seis
municípios paulistas (Diadema, Mauá, Santo André, São Bernardo do Campo, São
Caetano do Sul e Ribeirão Pires) para o diagnóstico de meningite bacteriana.
Essa substância é um fluido estéril presente nas cavidades do cérebro e da
medula espinhal que atua como amortecedor, protegendo essas estruturas de
traumas.
Como parte da rotina do laboratório,
os cientistas submeteram as amostras a um ensaio de PCR em tempo real (muito
usado no diagnóstico de doenças infecciosas, entre elas a COVID-19), que
amplifica um gene específico do microrganismo-alvo in vitro, caso ele esteja presente na amostra, permitindo
identificá-lo mais facilmente. Foi possível identificar a presença do Streptococcus pneumoniae, ou pneumococo, em 149
amostras.
Com essas
amostras positivas, foi realizado outro ensaio de PCR em tempo real, desta vez
utilizando um corante chamado SYBR Green. A substância se liga ao DNA e emite
um sinal de fluorescência que é captado pelo equipamento para detecção de um
dos três genes estudados, simultaneamente, que estão relacionados com a
resistência a antibióticos.
Para que
fosse possível determinar a quais classes de antibióticos a bactéria era
resistente – penicilina, lincosamidas ou macrolídeos –, o grupo usou uma
técnica conhecida como curva de dissociação.
“Nesse método, vamos aumentando a
temperatura das amostras grau por grau, o que faz com que o corante vá se
desprendendo do DNA, pois a dupla hélice que forma o material genético
amplificado na PCR vai se separando gradualmente. Então, analisamos a chamada
temperatura de melting [Tm], que é quando
metade da estrutura está unida e metade está separada, o que varia de acordo
com o gene amplificado. Dependendo de quantos graus isso aconteceu, conseguimos
diferenciar qual gene foi amplificado, logo, a qual antibiótico essa bactéria é
resistente”, explica a bióloga Ivana Campos,
responsável pelo estudo.
Validação
Depois de
realizados todos esses processos, os pesquisadores compararam seus resultados
com os obtidos pelo método tradicionalmente usado para avaliar resistência a
antibióticos – que consiste em colocar os microrganismos vivos em contato com
cada um dos fármacos e observar se são capazes de se proliferar na presença da
substância. Esse teste convencional só foi realizado com 25 amostras, já que somente
elas apresentaram pneumococos viáveis para o processo. Os resultados foram
similares, o que confirmou o potencial da nova técnica desenvolvida.
“Pudemos
averiguar que 51% das amostras avaliadas, recebidas entre 2014 e 2020, eram
sensíveis a antibióticos, o que é um bom sinal, já que esses pacientes devem
ter tido um bom prognóstico”, diz Campos. “Por outro lado, 17% se mostraram
resistentes a diversas drogas, o que é muito perigoso, pois nesses casos é mais
difícil realizar o tratamento e precisamos adotar antibióticos de outras
classes”, explica.
A pesquisadora ressalta ainda que
a S. pneumoniae tem grande capacidade de trocar
material genético, ou seja, facilidade em passar esses genes que conferem
resistência antimicrobiana para outras bactérias, tornando-as resistentes
também.
“Portanto,
concluímos que com o ensaio que desenvolvemos é possível estudar o perfil de
resistência do pneumococo mesmo na ausência das cepas isoladas, como
evidenciado para nossa região.”
O trabalho teve apoio da FAPESP por
meio de dois projetos (17/03022-6 e 18/22718-4) e
os resultados obtidos pelos especialistas podem ser úteis tanto para ações de
vigilância epidemiológica quanto para aprimorar o tratamento dos pacientes no
futuro.
O artigo Multiplex real-time PCR using SYBR Green: Unspecific intercalating
dye to detect antimicrobial resistance genes of Streptococcus pneumoniae in
cerebrospinal fluid pode ser lido em: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0269895.
Thais Szego
Agência
FAPESP
https://agencia.fapesp.br/nova-tecnica-ajuda-a-descobrir-se-bacteria-que-causa-meningite-e-resistente-a-antibioticos/39495/
Nenhum comentário:
Postar um comentário